Fonte: Lívia Duarte, da FASE – Solidariedade e Educação*
A Caravana Agroecológica e Cultural de Santarém foi realizada nos dias 22 a 25 de outubro, com a participação de cerca de 100 pessoas e dois roteiros envolvendo sete comunidades: um passa pela Reserva Extrativista (Resex) Tapajós-Arapiuns e o outro pela Floresta Nacional do Tapajós (Flona), incluindo a BR-163 e o município de Belterra.
O evento foi uma das etapas preparatórias do III Encontro Nacional de Agroecologia que será realizado em maio de 2014 em Juazeiro, na Bahia. A interlocução entre agroextrativistas, agricultores, lideranças dos movimentos sociais do campo e organizações da sociedade civil de todas as regiões do Brasil faz parte da metodologia da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), que busca agir politicamente a partir das práticas e desafios dos agricultores e agricultoras nos territórios.
ATUALIDADE – A Caravana Agroecológica e Cultural de Santarém ocorreu, coincidentimente, na semana seguinte ao lançamento do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Brasil Agroecológico, que prevê, até o final do ano de 2015, um investimento de R$ 8,8 bilhões em 125 iniciativas. O objetivo é articular políticas e ações de incentivo ao cultivo de alimentos orgânicos e de base agroecológica e a conservação dos recursos naturais. A solenidade realizada durante a II Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário contou com a participação da presidenta Dilma Rousseff e diversos ministros, além de representantes da sociedade civil e parlamentares, no dia 17 de outubro.
“Vamos seguir trabalhando juntos por uma agricultura sustentável, uma vida mais saudável e um campo onde as pessoas gerem renda, emprego e possam criar seus filhos e os jovens possam se manter. O plano não é perfeito, temos que olhar para ele com muito carinho e aperfeiçoá-lo sistematicamente”, destacou a presidenta durante a cerimônia.
Para Fábio Pacheco, coordenador da Associação Agroecológica Tijupá, no Maranhão, o lançamento do Plano é um momento histórico para as organizações que lutam para ampliação das práticas agroecológicas no país. “Sem dúvida é um reconhecimento à agroecologia. Claro que estamos esperançosos em poder ampliar as possibilidades de ação a partir da estrutura do Plano. No entanto, vemos nele muitas limitações. A começar por não explicitar questões como a regularização fundiária e a reforma agrária, problemas muito sérios também no contexto amazônico”, comentou por telefone.
No lançamento, Pepe Vargas, ministro do Desenvolvimento Agrário (MDA), anunciou 100 decretos para desapropriações de terras destinadas à reforma agrária até o fim do ano, atendendo 5 mil famílias, e comentou que uma das faces mais importantes do Brasil Ecológico está na área do crédito, onde se concentra a maior parte do investimento (R$ 7 bilhões entre investimentos do MDA e do Ministério da Agricultura). O valor mal, se comparado ao crédito disponível para o agronegócio, é bastante baixo. No plano Safra 2013/2014 foi anunciado que o orçamento da agricultura empresarial será de R$ 136 bilhões.
Na avaliação de Pacheco, da Tijupá, uma questão a ser considerada quanto ao crédito para a agricultura familiar é a dificuldade de acesso pelo agricultures ao e adequações do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Aqui se impõe mais uma vez a questão da regularização fundiária. Sem registro, o acesso ao crédito é limitado. A dificuldade em responder à burocracia é outra barreira para os pequenos agricultores agroecológicos.
Ele comentou ainda que o edital de Assessoria Técnica e Extensão Rural que atenderá a 75 mil agricultores e agricultoras (50% mulheres) é um ponto positivo no Plano. No caso do agroextrativismo, no entando, há previsão para manejo de recursos não madeireiros para 345 famílias, apenas. Pacheco também elogiou o Programa de Fortalecimento e Ampliação das Redes de Agroecologia, Extrativismo e Produção Orgânica – Ecoforte, que prevê R$ 175 milhões para melhorias na produção e processamento, apoio para acesso aos mercados convencionais, alternativos e institucionais e para ampliação da renda dos agricultores familiares e extrativistas. “É importante partir da lógica de apoio às redes”, destacou, explicando que a venda de produtos e melhoria da renda é um grande desafio em comunidades da Amazônia, inclusive naquelas por onde vai passar a Caravana Agroecológica de Santarém.
CAMINHOS – A visita às comunidades da Reserva Extrativista (Resex) Tapajós-Arapiuns e da Floresta Nacional do Tapajós (Flona) permitiu conhecer a economia e a vida das comunidades e as experiências que já cumprem papel importante para melhorar as condições de vida na floresta. São exemplos as Oficinas Caboclas (produção de moveis e artefatos com aproveitamento de resíduos de madeira), os micro-sistemas de abastecimento de água, o beneficiamento de produtos da mandioca e do extrativismo, os viveiros de mudas para reposição florestal, entre outros. A oportunidade ampliou o debate sobre o novo plano lançado pelo governo federal e também outros programas federais, como o Bolsa Verde, que tem impacto sobre a vida dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas da região.
Na oportunidade, os participantes da caravana puderam conhecer novos e antigos conflitos territoriais que ameaçam os modos de vida das comunidades, impedindo o avanço da agroecologia. São exemplos, o projeto de construção de usinas hidrelétricas no Tapajós, o interesse os projetos das empresas de mineração na região, a expansão da fronteira agrícola na Amazônia, incluindo questões como o escoamento da produção de soja e a ação das madeireiras. Outro tema importante são as vitórias e desafios das comunidades para gestão de seus territórios.
De volta a sede do município de Santarém foi realizado um seminário de encerramento com debates sobre Os Desafios do Agroextrativismo na Amazônia e sobre Economia Verde e Serviços Ambientais (PSA).
As entidades responsáveis pela organização da Caravana são: Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária (CEAPAC), Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santatém, Terra de Direitos, Casa Familiar Rural de Santarém (CFR), FASE e Associação Agroecológica Tijupá.
*Com informações de Eduardo Sá, da Articulação Nacional de Agroecologia.