Fonte: Por Blog Acesso (www.blogacesso.com.br)  

“A economia solidária, mais do que um conceito, é um movimento social, econômico e cultural; é uma iniciativa que, na verdade, é muito ampla”, explicou a educadora e socióloga Luana Vilutis. Difundidas em diversos países, as práticas de economia solidária são pautadas pelos princípios da autogestão, da solidariedade e da cooperação. “A economia solidária reúne, em sua prática, diversos atores, desde empreendimentos econômicos solidários até instituições de fomento e assessoria como ONGs e universidades – a partir das Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares – ITCP –, além dos gestores públicos. Hoje, existe uma rede ampla de gestores públicos no Brasil que atua com economia solidária”, contou.

Além do conjunto diverso de atores, também as práticas da economia solidária são bastante variadas. “Quando a gente fala nos princípios da cooperação e da autogestão, eles não se dão somente no universo produtivo, também envolvem práticas de consumo responsável, a própria comercialização, o fomento, o crédito; são iniciativas diversas na área da economia solidária”, disse a pesquisadora.

Vilutis participa da Produtora Cultural Colaborativa. “Resumidamente, a produtora é um encontro, um arranjo produtivo de sete Pontos de Cultura de Pernambuco que se articulou para prestar serviços na área de produção cultural colaborativa”, explicou a socióloga, que chamou a atenção para a utilização de softwares livres cuja filosofia tem muito em comum com os princípios da economia solidária. “A produtora é um exemplo, assim como o Fora do Eixo e a Agência Popular Solano Trindade, outros exemplos muito felizes de economia solidária na área da cultura”, contou.

Na Produtora Cultural Colaborativa é estimulada a troca direta. Entre outros casos, o artista que quer realizar um show ou gravar um CD pode trocar o serviço de produção por uma oficina, uma intervenção, ou outra forma de colaborar. Além disso, a produtora também promove a formação de jovens. “Montamos o palco livre, no qual vai ter um show e vamos gravar esses artistas. Isso acontece com uma equipe de jovens, que selecionamos nas comunidades em que atuamos, e que participam de oficinas de áudio, de vídeo, de jornalismo colaborativo, de foto. Muitas vezes, os jovens fazem a cobertura do evento com um professor que os orienta, eles aprendem na prática, funciona como um grande laboratório”, contou a socióloga.

De acordo com a pesquisadora, a economia solidária aproxima os processos produtivos e a distribuição dos bens e serviços. “Não só por meio da implantação de redes como pela própria prática: muitas vezes quem está produzindo também é consumidor de produtos da economia solidária”, observou Vilutis. Por outro lado, é inevitável também consumir produtos que estão fora dessa rede. “A economia solidária não abarca a totalidade, mas a tendência é essa: que ela consiga alimentar os empreendimentos nos seus insumos e, ao mesmo tempo, gerar produtos que sejam de necessidade de outros empreendimentos, outros grupos”, explicou.

Segundo Vilutis, da mesma forma como a cultura é pensada a partir de uma perspectiva de direito e cidadania, de “sujeitos culturais atuantes”, a economia solidária trabalha com uma dimensão da economia além do consumo. “É difícil tratar uma pessoa apenas como produtora ou consumidora – existe, inclusive, o termo prosumidores –, uma vez que todo mundo que produz está, ao mesmo tempo, consumindo. O mesmo acontece quando pensamos cultura como um direito de cidadania, a gente não pode reduzir alguém a apenas produtor, empreendedor ou espectador. A dimensão é mais ampla e mobiliza muitos setores, muitas áreas artísticas, acho que é algo que pode permitir uma interface entre a cultura e a economia, pensando nessa práticas colaborativas, no trabalho associado, no trabalho autogestionário”, avaliou a especialista.

Políticas públicas para a economia solidária

A Secretaria Nacional de Economia Solidária – Senaes do Ministério do Trabalho e do Emprego – MTE é a principal responsável pelas políticas públicas para a economia solidária, embora o tema seja transversal e conte com ações desenvolvidas por outros ministérios e secretarias. Segundo Vilutis, que pesquisa iniciativas de economia solidária na área da cultura para sua tese de doutorado na UFBA, o Ministério da Cultura – MinC ainda é frágil nessa questão. “O Agente Cultura Viva foi uma formação de jovens em que o MinC tinha expectativa de que esses jovens atuassem na economia solidária, mas, de fato, não foi feita nenhuma ação pública dirigida a isso, não foi implementada nenhuma política”, contou.

Já o Economia Viva, segundo a especialista, foi além da intenção. “O MinC selecionou 12 pontos de cultura que trabalham com economia solidária. O ministério se aproximou um pouco mais de uma ação efetiva, mas ela também foi pontual, teve começo, meio e fim, não perdurou, não se transformou em uma política de fato. Lamentavelmente, porque muitos pontos de cultura trabalham com economia solidária. A ação teve muitos acertos, o problema foi a sua descontinuidade”, avaliou a socióloga.