“Estávamos rezando, de repente chegaram dois caminhões cheios de homens, chegaram atirando, ordenaram parar queimar barracas e roupas e amarrar todos índios. Saímos correndo, em direção diferente. A 300 metros do local vimos as barracas queimando e muito choro. Faroletes e lanternas estão focando pra lá e cá, as crianças e idosos não conseguiram correr. Os meus olhos enlagrimando (sic) escrevi este fato. Quase não temos mais chance de sobreviver neste Brasil”. Relato de uma vítima do atentado contra a comunidade de Pyelito Kue.
Nota Pública do Conselho Indigenista Missionário
O Conselho Indigenista Missionário – Cimi vem a público denunciar e repudiar os ataques terroristas e genocidas desferidos contra os Guarani-Kaiowá, da comunidade Pyelito Kue, em Iguatemi, no estado do Mato Grosso do Sul, ocorridos nos dias 23 de agosto e 05 de setembro. Além de terem seus pertences destruídos, vários indígenas foram covardemente agredidos por homens fortemente armados.
Para o Cimi, o fato de terem sido encontrados, no local dos ataques, cartuchos de munição calibre 12 anti-tumulto, as chamadas “balas de borracha”, constitui-se em mais um forte indício de formação de milícia armada, no Mato Grosso do Sul, com a finalidade de cometer crimes contra os indígenas daquele estado.
O Cimi manifesta extrema preocupação pelo fato de que, dada a total inércia das autoridades, especialmente do Governo Federal, há possibilidades de que ocorram novos, iminentes e ainda mais graves atentados à comunidade Pyelito Kue. De acordo com informações de uma liderança da comunidade atacada, repassadas na manhã desta sexta-feira, 09, a agentes do Cimi, não tendo para onde ir, os indígenas continuam acampados próximos ao local onde sofreram os ataques, estão cercados e têm sido alvo de constantes ameaças de fazendeiros e seus “seguranças”, que disparam tiros a todo o momento sobre os mesmos. Segundo essa mesma liderança, os indígenas estão isolados numa margem do rio que atravessaram para fugir dos ataques. Estão sem roupas, sem cobertas e sem alimentos. A liderança informa ainda que depois do último atentado, ocorrido na madrugada de segunda-feira, 05, nenhum representante da Funai, Polícia Federal ou de outros órgãos públicos foi ao local.
O ataque a Pyelito Kue soma-se a outras situações análogas ocorridas, nos últimos anos, com as comunidades Apykai, Kurusu Ambá, Passo Piraju, Mbaracay, Ypoi, Guaiviry, Cachoeirinha, Buriti, Nhanderú Marangatu, Taquara, Carumbé, Itayka’aguyrusu, Yvykatu, Jaguapiré, GuiráKambi’y, entre outras. Nos últimos oito anos, mais de 250 indígenas foram assassinados no Mato Grosso do Sul.
Para o Cimi, a morosidade do Governo Federal em demarcar as terras tradicionais dos povos indígenas e a não identificação e punição dos seus agressores e assassinos constituem-se em verdadeira anuência e incentivo ao processo de terror e genocídio imposto aos Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul.
O Cimi conclama a sociedade nacional e internacional a se manifestar junto às autoridades brasileiras a fim de que assumam suas responsabilidades e tomem, de uma vez por todas, as medidas necessárias e urgentes para que se interrompa imediatamente esse processo de extrema violência contra os Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul.