Por Arroyo João Cláudio

Acho que de fato estamos diante de uma grande oportunidade de fazermos avançar a Economia Solidárias em todas as suas dimensões, mas para isto é preciso que tenhamos disposição para aprender. Ao que tenho me dedicado, e por isto não tenho me manifestado mais frequentemente.

Mas, diante de sua provocação positiva, apesar da enorme dificuldade de entender “tudo isso” que está acontecendo, vou aqui telegrafar(ou twittar para os mais jovens) algumas coisas que tenho refletido, sem qualquer pretensão de verdade ou ponto final, mas apenas a partilha de inquietações.

Como recurso de método, proponho que organizemos este diálogo em torno das principais dimensões, dentre outras, que a construção da Economia Solidária está a nos exigir cuidados, em sinergia e ao mesmo tempo.

Como Movimento Sócio-Político

Como Política Pública / Estado

Como Economia e Cultura / Ideologia

Mas antes de prosseguir, ressalvo que minha abordagem considera uma leitura não-estanque, ou seja, integrada, destas dimensões. Na realidade, estas desenvolvem-se absolutamente juntas e indissoluvelmente interligadas e interdependentes. A separação aqui é apenas para efeito da exposição das idéias.

Como exemplo deste raciocínio, retomo agora um brevíssimo resgate histórico do Movimento da Agricultura Familiar, que apresento aqui como um dos parâmetros que talvez mereça nossa atenção pedagógica, sem propô-lo como modelo a ser seguido mecanicamente.

Lembraças pedagógicas

Participei diretamente como educador, na década de 80 no Pará, do movimento que se deu em torno da Agricultura Familiar e teve como ponto central a edição dos Gritos da Terra que marcou definitivamente a presença política, econômica e institucional deste setor da agricultura na pauta da Sociedade.

Entendo que isto só se tornou possível porque: a) O movimento tinha profunda compreensão estratégica de seus objetivos e a meta era “ganhar a Sociedade” para a causa; b) O movimento possuia grande unidade política interna tanto pela identidade e tradição da luta das Ligas Camponesas, que reivindicava, quanto pela conjuntura de derrota da Ditadura Militar brasileira que nos dava plena clareza de quem era aliado e quem era adversário; c) O movimento trabalhava com afinco o fortalecimento dos agricultores, sua base econômica, para ganhar expressão no PIB do país, mas; d) sabia que não avançaria se isolando de segmentos urbanos, principalmente os da academia, setores médios(consumidores) e os de outros movimentos sociais, para que ganhasse presença política capaz de influenciar políticas públicas o que incluía estratégias de ocupação de posições no parlamento e no executivo.

Dentre outras estratégias, por exemplo, o movimento da Agricultura Familiar se aliou ao movimento da Reforma Agrária, embora fosse um movimento de quem já tinha sua porção de terra e produzia, e ao, então novo movimento da Preservação do Meio Ambiente aliando-se aos extrativistas, mesmo sendo os agricultores parte do problema por reproduzirem a cultura do corte-queima, embora com muito menor impacto que o agrobusiness.

Neste contexto, lembro bem, tanto se envidava esforços para instituir novas organizações mais representativas do então novo movimento camponês, quanto se envidava esforços para conquistar os sindicatos tradicionais arrancando-os das mãos dos pelegos, tal como também fazia o movimento operário no cenário urbano, o que lhes rendeu ocupar as federações estaduais e, mais de 10 anos depois, a própria Contag(Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) que fora criada como alternativa conservadora às ligas camponesas e tinha sido controlada legal e politicamente pela Ditadura Militar.

Esta inteligência social-política-econômica, no conjunto, fez com que o movimento crescesse na Sociedade e, por decorrência direta, sobre o Estado.

É óbvio que o exemplo positivo que o Movimento da Agricultura Familiar nos oferece para reflexão, não o exime de suas limitações, incorreções e, até vícios, como de resto toda experiência humana. As lideranças que se entronizaram se eternizam, há pouca renovação política, as dezenas de agricultores-parlamentares do setor muitas vezes repetem os vícios da política tradicional, não avançam na democracia direta nem no Controle Social sobre o Estado, deixando suas bases apenas como curral de reprodução política e, o lado econômico vem sendo preterido no movimento, por isso assistimos investimentos vultosos, a partir do Governo Lula, não serem aproveitados como base propulsora da construção de uma nova qualidade de vida dos camponeses, pelo menos não na velocidade que entendemos ser já possível.

Ou seja, se é promissor analisar uma experiência viva para aprendermos com seus acertos, também o é para aprendermos com seus erros e descaminhos.

A Economia Solidária como Movimento Sócio-Político

Depois do Movimento da Agricultura Familiar, não conheço outro movimento tão potente para a transformação efetiva da Sociedade, no seu conjunto, quanto o da Economia Solidária que vem se estruturando há mais de 10 anos no Brasil.

Também não vejo outro movimento que tenha crescido tanto em tão pouco tempo. Talvez por isso, tenhamos que nos dedicar a refletir um pouco mais. Como se diz, “a pressa é inimiga da perfeição”.

A conjuntura em que o Movimento da Ecosol começa a se estruturar é marcado por dois processos resultantes de conquistaras anteriores que favoreceram a Ecosol e a colocaram em um patamar novo em relação aos demais movimentos, o Fórum Social Mundial e a eleição do Governo Lula, na esteira da conquista de governos populares em capitais e estados onde já experimentávamos a ecosol como política pública, principalmente como crédito popular.

Portanto, o nosso Movimento por uma Economia Solidária, se origina da amálgama de uma profusão plural de experiências concretas e visões de mundo que se encontraram em um momento de euforia política e franco avanço da articulação dos movimentos populares que talvez tenha passado para alguns setores uma percepção de que as conquistas se dão apenas por negociação/pressão nos espaços institucionais sem que uma construção social e econômica na Sociedade fosse erigida, pelo menos, na mesma proporção. Ora, lembro bem que mal o movimento se nacionalizava, já estávamos no FSM de 2003, fazendo os acertos finais para a criação da Senaes, não por acaso mas dado o espaço historicamente construído que se projetava no interior do novo governo federal.

Base social?

A imaturidade do movimento era flagrante. Um dos debates que mais polarizava e apaixonava era se nossa identidade era a economia “Popular e Solidária” ou se apenas “Solidária”, se Economia Solidária se referia apenas à “economia das cooperativas” ou à “economia da cooperação” onde cabia outras formas associativas, inclusive a de empreendedores individuais porém associados para fins de consumo e/ou comercialização, e ainda, se cooperativa era sinônimo obrigatório de cooperação, até que ponto, etc – debate este que permanece inconcluso. Ou seja, a construção de nossa identidade, enquanto movimento, ainda está em formação, como aliás, entendo ser absolutamente normal, tal como as incompletudes de nossas definições estratégicas com que temos que conviver.

Debate inconcluso porque, apesar do que está apontado nos nossos documentos oficiais, no fazer concreto do cotidiano dos atores e atrizes que fazem a Ecosol acontecer, quem não está convencido de que nosso movimento deve incluir a Economia Popular, só trabalha com cooperativas e o inverso também é verdadeiro, só para se ter um exemplo.

No entanto, o que é mais urgente, política e economicamente, é a definição estratégica de nossa base social. Que segmentos sociais vivos temos a pretensão de representar politicamente? Em que ponto estamos na legitimidade desta representação? Estes segmentos já se enxergam majoritariamente como de Economia Solidária? Qual parcela desta base social tem clareza do projeto político do Movimento da Ecosol? Qual parcela desta base social se expressa política e eleitoralmente como Movimento de Economia Solidária? Quem são nossos aliados sociais e políticos? Com que grau de autonomia política e estrutural nós agimos enquanto movimento?

Ao lado de todas estas interrogações estratégicas, nosso movimento assiste respostas de duas perspectivas básicas, que me lembra muito o Movimento da Agricultura Familiar tal como vivi. Descrevendo os extremos, apenas para dar visibilidade às diferenças, diríamos que uns, de experiência mais empírica, procuram alternativas viáveis para os problemas do cotidiano e tendem a buscar soluções mais pragmáticas e, outros, de experiência mais reflexiva, ou acadêmica, tendem a propor para o mundo prático perspectivas mais ideológicas. Sendo que a convivência madura destas duas matrizes tem sido a única forma dos movimentos avançarem em seus objetivos, já que se o pragmatismo cega a visão necessária para uma construção de longo prazo, o ideologismo tenta impor à realidade uma pureza e coerência só encontradas entre o papel e a ponta da caneta.

Enquanto esta maturidade vai sendo gestada, temos que ter paciência para conviver com diagnósticos apressados e acusações infundadas – o que também é normal e humano em função da insegurança que acaba acometendo todos nós. No entanto, e aí mora um perigo fatal, neste ambiente, também prosperam alianças por conveniência material, o sectarismo oportunista, a concentração de poder, a eternização no poder, o uso particular da representação coletiva e outras práticas sociais nefastas que apesar de antigas são recorrentes, e que só a falta de caráter explica – o que só pode ser tratado no plano e no tempo da reeducação.

Problemas de ordem ética e moral que se não cuidados podem fazer com que todas as conquistas e construções institucionais sejam corroídas por dentro e, de repente, podemos nos ver como aquele pintor que quando se deu conta estava com a brocha na mão sem nenhum andaime ou apoio embaixo dos pés. Filme este que já passou diversas vezes e que ainda estamos assistindo e, por isso mesmo temos a obrigação de cuidar para não reincidir no mesmo final, a morte da transformação social, motivo maior que fez tudo começar. Neste sentido, proponho que, para iniciar este processo, nosso movimento elabore um Código de Ética da Economia Solidária.

Mas, em paralelo, a vida segue e vai se consumando em cultura. Por isso, se tomarmos os Fóruns de Economia Solidária, com centralidade o FBES, como a principal expressão de nosso movimento, precisamos nos perguntar, como militantes, se temos contribuído para o avanço da cultura da solidariedade na Sociedade e a consolidação de práticas democráticas diretas, se temos privilegiado a pluralidade, se temos exercido o Controle Social – sobre o Estado e sobre nós mesmos, em nossas entidades. Portanto, se o nosso movimento, partindo de uma causa evidente, a Economia Solidária, consegue se consolidar na prática, como valor e hábito, em um novo modo de vida, para daí consolidarmos um novo modo de produção.

Por exemplo, na minha perspectiva – e o digo também como autocrítica –, gostaria de ver nosso movimento mais proativo, do que no discurso, com relação à difusão da solidariedade econômica, com relação à coleta das assinaturas para a Lei Nacional, mais envolvido no Controle Social sobre os Projetos de Economia Solidária, particularmente sobre os resultados que ficarão para além dos projetos em si, gostaria de ver nosso movimento com maior visibilidade na sociedade. Por isso acho desproporcional a atenção que o movimento está dando à definição sobre o lugar institucional no governo federal.

Ora, é claro que esta pauta é importante, mas não deveria ser a única nem a que mais mobiliza as “paixões” – porque daí fico desconfiado dos reais interesses que levam a isso – sabe como é, cachorro mordido por cobra tem medo de lingüiça, não é mesmo. Desconfiança que cresce quando vejo pontualmente argumentos “ideológicos” para defender posições absolutamente táticas. Posicionamento que nos leva ao gueto de escolher um ou outro espaço, excludentemente.

Como Movimento, preferiria ver nossos esforços em alargar nossos espaços políticos – mais que os espaços institucionais –, no MTE, no MDS, no MDA, no MIDIC, no SEBRAE, no BNDES, no Banco do Brasil, na CEF e até no virtual novo ministério das micro e pequenas empresas. Espaços que devem ser medidos nos centímetros a mais que nos render no orçamento federal e não apenas em número de cargos que passaremos a influenciar.

Por outro lado, na grande maioria das manifestações, mesmo as de cunho “ideológico”, vejo sinceridade e muita boa vontade. Mas vejo também a volta das indefinições estratégicas que ainda temos como a identidade(que abordarei na dimensão econômica), o projeto do movimento e a leitura sobre se a centralidade estratégica da disputa está no governo ou na Sociedade.

Portanto, como Movimento, estamos nos construindo mas precisamos cuidar daquilo que limitou outros movimentos com os quais temos muito a aprender. Só boa vontade e fé não são suficientes.

A Economia Solidária como Política Pública no contexto do Estado

No contexto de tudo que expressei até aqui, considero que nossa estratégia com relação às Políticas Públicas de Estado apresentam duas incompletudes fundamentais:

1) As Políticas Públicas já conquistadas, particularmente os projetos desenvolvidos por edital público que contemplou majoritariamente entidades populares que fazem parte do nosso movimento, não conseguem se conectar gerando uma sinergia capaz de produzir resultados que permaneçam para além dos projetos, revelando uma concepção tecnicista e feudal no exercício efetivo da gestão dos projetos per si. Tenho percebido que os gestores estão muito mais consumidos em dar respostas ao Siconv do que em responder os desafios para fazer a Economia Solidária alavancar um novo modo de vida. Adianto que não defendo que se ignore, nem se burle o Siconv, mas que não se confunda o secundário com aquilo é principal. A razão de ser do projeto, e das demais políticas públicas, não é atender ao Siconv e sim os públicos a que cada uma destas ações se destina, se isto não for possível, temos que elevar esta pauta à sua dimensão política e apresentá-la como pauta junto às esferas decisórias de governo, mas não se acomodar na técnica pela técnica.

2) Não há exercício pleno de Controle Social sobre o Estado, que analise o orçamento público como um todo, que identifique as áreas onde temos interesses estratégicos, para sobre estas estabelecer mecanismos de visibilidade política, transparência pública, participação direta, monitoramento de resultados e avaliação dos mesmos para reelaborar as políticas. Ora, por exemplo no MDS, só o Projeto de Inclusão Produtiva, elaborado absolutamente em sintonia com o que temos como Economia Solidária, envolve mais agentes e recursos do que todos os projetos da Senaes juntos, o que revela uma visão ainda tímida do lugar da Economia Solidária no governo, reduzindo-a à Senaes, embora esta mereça nosso total apoio até porque foi conquista nossa e sintetiza um simbolismo muito importante para todos nós. Mas esta nossa limitação nos diminui para aquém do que já somos.

No entanto, há outra componente importante que tem sido um tabu em nosso movimento: o debate sobre a ocupação de postos no legislativo e no executivo. Este é um debate que em 2010 correu à boca pequena, meio como se fosse um contrabando o que contribui para que dentro do nosso movimento também se reproduzam as práticas mais perniciosas da política partidária, tipo usar estruturas e recursos públicos como máquina eleitoral. Sendo que na grande maioria dos caso, até onde observei, isto ocorreu em favor de candidatos que nada tem a ver com nosso movimento. Para o bem e para o mal.

Ora, se temos críticas às práticas partidárias e eleitorais, precisamos debater isso abertamente entre nós. Um movimento, para ser legítimo, tem que se construir de dentro para fora, de baixo para cima. E esta é uma pauta incontornável, cuja tentativa de não enfrentá-la revela uma concepção de que a política partidária é mesmo para ser tratada sob véus escuros.

Na minha opinião, precisamos avançar sobre as ferramentas partidárias como instrumentos de conquistas de mais políticas públicas que fortaleçam a Economia Solidária como prática social. Mais uma vez a novidade não é o caminho, mas “o jeito de caminhar”, como diria o poeta amazonense Tiago de Melo. Ora, este foi o caminho que levou o movimento sindical brasileiro a se estabelecer como inquestionável força social e política, no entanto, mais uma vez, um exemplo para se aprender com os acertos e os erros.

Se queremos uma política partidária diferente, em um contexto de democracia direta, com a possibilidade de candidaturas avulso, com mandatos controlados socialmente, com o direito de desvotar etc, deveríamos estar com a mesma mobilização com que debatemos “onde ficará a secretaria”, debatendo também a Reforma Política, que na minha opinião possui uma envergadura estratégica muito mais profunda sobre a sociedade.

Outra questão-chave é a compreensão de que nosso avanço sobre as Políticas Públicas e sobre o Estado, depende de nossos avanços na Sociedade, tanto como economia quanto como organização social com autonomia política. Quanto mais a Economia Solidária é pensada como obra de governo, quanto mais os fóruns, entidades e empreendimentos ficam dependentes de recursos públicos, mais frágeis ficamos para conquistar recursos e apoio de governo. Parece uma contradição, mas não é. É complementariedade. O governo, como todo o espaço estatal, é uma arena em disputa, onde só sobrevive quem já entra forte para fortalecer lá dentro, mais ainda, quem o fortalece de fora. A história está recheada de exemplos daqueles que esquecem o que os levou à conquista, e caem.

A Economia Solidária como economia e cultura

Da perspectiva teórica com a qual trabalhamos, a economia é o cimento que consolida os valores culturais que sustentam as relações sociais e humanas em uma determinada Sociedade. A economia é a síntese de uma civilização.

Uma Sociedade não é feita só por “relações econômicas” mas jamais seria uma Sociedade sem elas, simplesmente porque estar em Sociedade, estar sócio é estar em relação, em troca permanente e economia é o sistema de trocas de uma Sociedade, é como o indivíduo, ou a parte, alimenta e se alimenta do todo. Uma ecologia complexa que se realiza no imperceptível cotidiano onde as coisas acontecem.

Ou seja, economia não é só a troca de mercadorias nem de moedas, porque cada mercadoria é a concretude de uma representação humana. Cada vez mais consumimos símbolos em vez de objetos. Símbolos que representam aquilo que nós, em Sociedade, damos valor. Cada vez mais o que se consome é a marca e não a roupa ou o sapato, cada vez mais o que consumimos é o significado e não a palavra.

Portanto, se o Movimento por uma Economia Solidária é, como proponho que seja, um projeto que vai além da economia, tal como entendido no marco capitalista, para construir uma nova civilização, precisamos entender que este processo só será, de fato transformador, se for se dando na prática, quase invisível, mas como novidade no modo de produzir, no modo de consumir, de um com o outro, no dia-a-dia, no bate-papo das esquinas, nas feiras, nas igrejas, nos clubes, nos centros comunitários e até nas cooperativas. Aí o cimento vai percolando as fissuras do sistema vigente, ganhando profundidade e capilaridade, transformando de baixo para cima a razão de ser das relações sociais e humanas.

Um processo aparentemente lento, mas sem o que, tudo o mais que se fizer, mesmo em nome da economia solidária, padecerá de sustentação.

Portanto, economia é cultura, é a identidade de um povo, é o que faz as pessoas levantarem todos os dias porque sonham. Imaginem quando este sonho for pela solidariedade, pela cooperação, pela capacidade de somar sempre.

Mas isso não acontecerá se não fizermos de cada empreendimento, de produção ou consumo, de cada entidade de apoio, de cada espaço público que conquistamos, portavozes do nosso projeto, tanto como economia quanto como ideologia. Se os empreendedores não forem capazes de conversar com seus clientes e conquistá-los para a Economia Solidária material, intelectual, espiritual e afetivamente, se da mesma forma não agir assessores e gestores, não estaremos fazendo a Economia Solidária acontecer.

E ela só acontecerá se formos capazes de nos oferecermos como exemplo vivo da viabilidade e necessidade de uma Economia Solidária. Mas como exemplo cotidiano e não apenas na reunião do fórum ou na feira que acontece uma vez por mês.

Nosso movimento precisa cuidar das pessoas, oferecer melhores soluções que o capitalismo – aqui não entendido apenas como modo de produção mas sobretudo como modo de vida. Precisa conquistar mais e mais pessoas onde quer que estejam, tanto mais aquelas que partilham conosco, mesmo que em parte, sentimentos e objetivos.

Proponho que nosso movimento tenha na Economia Popular um aliado importante, que nos aproximemos e que os conquistemos para nosso projeto. Isto me faz lembrar, mais uma vez, da história que narrei no começo deste texto. Quando o Movimento pelo fortalecimento da Agricultura Familiar se aproximou do movimento operário, não faltou quem dissesse, “os camponeses não são confiáveis porque são proprietários pequenos burgueses” – e a história foi abundante em mártires camponeses que tombaram em luta contra a estrutura capitalista mais atrasada, o latifúndio. Vejo um preconceito correlato a este, em algumas críticas “ideológicas” dirigidas aos micro e pequenos empresários, além de enorme miopia política.