Por Josep Maria Antentas e Esther Vivas
Um ano e meio após o crack de Wall Stret em plena presidencia espanhola da União Européia(UE), a situação das resistências e dos movimentos sociais no Estado Espanhol está marcada por uma tíbia resposta frente a crise. Assim o mostram, até agora débeis mobilizações durante este semestre europeu. Ficou para trás o otimismo que invadiu grande parte dos movimentos no momento da derrocada financeira, marcada por um visivel desconcerto das classes dominantes.
A situação é bastante contraditória. O neoliberalismo está completamente desacreditado e a crise abriu espaço para um discurso e para um “senso comum”, na acepção gramsciana do termo, anticapitalista, mas as políticas dominantes aprofundam os cortes sociais. Ao mesmo tempo, a deslegitimação do neoliberalismo e o aumento da credibilidade do anticapitalismo co-existe com uma forte cultura social do individualismo, do consumismo, da privatização da vida social e da despolitização.
Há uma distancia muito grande entre o descrédito do atual modelo econômico e sua tradução em ação coletiva. As respostas a crise, sobretudo, nos centros de trabalho, são limitadas, defensivas, de pouco alcance e, na maioria, têm acabado em derrotas. Esta dinâmica, é necessário dizer, se vê favorecida pela política de conciliação dos grandes sindicatos, que fomentam a passividiade e a resignação. A convocatória de mobilizações após o ajuste anunciado pro Zapatero indicam uma certa mudança de atitude, mas faz falta empurrar por baixo para ir em direção a uma greve geral e uma confrontação sustentável.
As reações dos trabalhadores, em cenários como o atual, podem estar dominadas pelo medo e o egoísmo ou pela solidariedade e a raiva frente a injustiça. Podem orientar-se no sentido de opções progressistas ou voltar-se para alternativas reacionárias. Não há nenhum automatismo entre mal estar e mobilização social, y todavia menos, mobilização em um sentido solidário.
A resposta social à crise não tem sido, até agora, proporcional ao descrédito do atual modelo econômico. Há conflitos e resistências, e alguns até relevantes, mas têm tido uma base social limitada e dificuldades para trancender os setores militantes organizados e mais ativos. As tendências a fragmentação predominam sobre as tendências a unificação das lutas, sem que nenhuma delas atua como elemento centralizador e catalizador que permita arrancar um novo ciclo de mobilizações. Faltam vitórias que sejam emplemáticas e permitam iniciar um período ascendente de acumulação de forças, demonstrar a utilidade da ação coletiva, aumentar as expectativas daquilo que é possível, vencer o ceticismo e o medo e, contribuir, como assinala o sociólogo Luc Boltanski, a “socializar a rebeldia e a socializar a idéia de que a realizada é inaceitável”.
Em que pese a retórica entoada com força, em começos do semestre, por parte do governo Zapatero e a maioria de seus homólogos que o pior da crise já passou e a luz no fim do túnel já começa a ser vista, a verdade é muito diferente. A crise econômica se transformou em crise social. Estamos no final do princípio, não no princípio do final. As turbulencias na zona do euro e o estouro da Grécia assim o demonstram. O ajuste anunciado significa a entrada em uma nova fase de endurecimento das intenções de transferir o custo da crise aos assalariados.
As dinâmicas dos movimentos sociais são sempre imprevisíveis. Não se pode ser fatalista, nem chegar a conclusões prematuras a respeito da debilidade da reação social e menos agora que o anuncio dos cortes podem fazer que se modifique a situação. Estamos, todavia, em uma primeira etapa de uma crise longa e é necessário fugir de leituras demasiado impressionistas da realidade. Sem querer estabelecer comparações históricas, não é demais recordar, por exemplo, que após o crack de 1929 o movimento operário norte-americano demorou mais de quatro anos para responder, passar a ofensiva e sacudir a vida política e social do país.
Convém evitar tanto os otimismos exagerados como os pessimismos paralizantes. Igual que o “Said o pessotimista”, o personagem da novela do escritor palestino Emile Habibi, nem otimistas, nem pessimistas, os ativistas sociais devem permanecer simplesmente “pessotimistas”.
Josep Maria Antentas y Esther Vivas são autores de Resistencias Globales. De Seattle a la crisis de Wall Street (Editorial Popular).
Artígo publicado no jornal Público (edición de Catalunya), 18/05/2010.