Artigo de Marcelo Dino Fraccaro

Durante a Teia e Fórum Paulista dos Pontos de Cultura, que acontece em Guarulhos entre os dias 26 de fevereiro e 2 de março, encontro organizado pela Comissão Paulista de Pontos de Cultura – CPPC, com o apoio do Ministério da Cultura, Prefeitura de Guarulhos e Fundação Nacional de Artes – FUNARTE e preparatório para a Teia Nacional 2010 a ser realizada no final de março em Fortaleza / CE, teremos uma grande oportunidade de viver a rica experiência do convívio entre Cultura e Economia.

Dois conceitos que estão intimamente ligados à nossa vida pessoal e coletiva tanto quanto comer, respirar e nos comunicar.

E tratando-se desse convívio, quando falamos da inovadora proposta de gestão compartilhada e construção coletiva proporcionada pela Rede de Pontos de Cultura, através da rede que os fortalece e lhes dá sentido, e o seu vínculo com a economia, não poderíamos tratar de outro conceito senão o da Economia Solidária.

Como exercício para reconhecermos melhor o sentido e o significado da Economia Solidária, tanto para o cotidiano como para o processo histórico de lutas e conquistas dos trabalhadores em geral, e o das relações de produção, difusão e fruição da cultura em particular, em primeiro lugar precisamos reconhecer o lema “uma outra economia acontece” como um fato que nos serve de incentivo e inspiração.

Como incentivo por entendermos que a melhor maneira de conhecer a Economia Solidária é praticando-a. Tomando contato e participando de inúmeras atividades associativas que já existem e que neste momento estão se iniciando. Não apenas atividades de geração de trabalho e renda, mas também de compras e trocas solidárias, comércio justo, cidadania ativa, diversidade cultural, promoção humana e desenvolvimento local e sustentável.

Esse fato nos leva a lutar pelo desenvolvimento da Economia Solidária, porque nos sentimos incentivados com ela em reforçar a luta histórica dos trabalhadores pela superação da exploração pelo trabalho e da lógica perversa de acumulação do capital que leva à desigualdade social e ao desemprego. Aliás, a Economia Solidária nasce com esse propósito. Ela é uma construção histórica que se origina no processo de organização dos trabalhadores. É um modo de produção e distribuição alternativo ao capitalismo que tem como lógica a apropriação privada destes meios transformando-os em mercadorias.1

Como inspiração, por perceber que esta luta histórica e o desenvolvimento da Economia Solidária se constituem em não apenas uma possível, mas viável proposta de superação de um modelo econômico exclusivo e opressor, por meio de um compromisso com um novo projeto de sociedade, que tem como lógica o desenvolvimento integral dos seres humanos e como elementos fundamentais:

SOLIDARIEDADE como compromisso ético-político com a igualdade entre todos os seres humanos e como prática de partilha na defesa da vida e das conquistas e direitos dos trabalhadores.

SUSTENTABILIDADE dos processos de desenvolvimento, articulando as dimensões sociais, ambientais, culturais e econômicas; e considerando as diversidades regionais e locais.

DIGNIDADE HUMANA E QUALIDADE DE VIDA como exigências fundamentais para o desenvolvimento.

CONSTRUÇÃO COLETIVA e democrática enquanto processo e método de tomada de decisão sobre os rumos nacional, regionais, territoriais e locais.2

Assim, a Economia Solidária surge e evolui a partir das contradições da própria economia capitalista, que com sua lógica de exploração pela apropriação privada dos meios de produção e distribuição, gera as desigualdades sociais que levam à pobreza e exclusão milhões de trabalhadores, que encontram na necessidade de enfrentar estas dificuldades, as bases materiais para sua organização, enquanto classe, na luta pela superação da sua condição de explorados.

Portanto, a Economia Solidária insere-se nesse processo como mais uma forma de luta da classe trabalhadora na superação da divisão da sociedade entre exploradores e explorados, entre patrões e empregados, uma vez que com relações de cooperação se contrapõe à competição agressiva característica da economia de mercado. Sua proposta está centrada em relações sociais marcadas pela autogestão cooperativa, onde os meios de produção e distribuição são de propriedade coletiva. Assim, nos empreendimentos solidários as decisões são tomadas sempre em conjunto, de forma democrática e participativa, além de serem também socializadas as responsabilidades, conquistas e desafios. Embora o desafio seja imenso, muito já se avançou na construção de novas relações de trabalho e alternativas ao desenvolvimento.

Hoje o movimento da Economia Solidária vai rapidamente se fortalecendo. Organizados em fóruns por todo o país, grandes conquistas já se alcançaram, como a Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES, vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego e o Conselho Nacional de Economia Solidária – CNES.

Aqui, não podemos deixar de reconhecer a aproximação entre a proposta que nos é trazida pela Economia Solidária e a da gestão compartilhada em rede dos Pontos de Cultura. Também não podemos esquecer a possibilidade real de fortalecimento desta rede proporcionada pelo Programa Cultura Viva, coordenado pela Secretaria de Cidadania Cultural – SCC do Ministério da Cultura – MinC.

Aquilo que se constitui hoje como programa governamental, quando transformado em política pública para o fomento e incentivo à cultura, como se pretende brevemente, possibilitará que a nova forma de relação entre Estado e sociedade civil, proposta hoje pelo Cultura Viva, se constitua como um caminho possível, uma contribuição para a transformação das relações sociais a partir da cultura. “O Cultura Viva deseja contribuir para essa aproximação, em busca de um Estado ampliado”.3 Este é um dos grandes desafios que se apresentam hoje. A consolidação de políticas que de fato coloquem o Estado a servi o da sociedade.

Queremos contribuir na superação deste desafio. Estamos propondo, durante a programação da Teia Paulista, um espaço apropriado para que esse convívio venha a se constituir de forma rica e verdadeira. A idéia é que tenhamos no final de semana da Teia uma feira de economia solidária compartilhada tanto por Pontos de Cultura como por grupos e empreendimento solidários.

Também uma oficina, organizada em parceria pela rede de Pontos, Representação Regional de São Paulo do MinC e Cáritas Brasileira – Regional São Paulo, pretende servir de espaço para que experiências já consolidadas possam ser apreciadas e melhor conhecidas pelos participantes do encontro.

Queremos também juntar nossos esforços com as inúmeras experiências de Pontos de Cultura que já “vivem” a Economia Solidária e grupos solidários que já podem ser considerados Pontos de Cultura. Experiências essas espalhadas por todo o Brasil.

Esperamos assim, que essa pequena contribuição possibilite o fortalecimento dessa relação entre Pontos e empreendimentos solidários, cultura e economia popular, para que juntos se reconheçam protagonistas desta nova realidade em transformação.

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Refs.

1. CÁRITAS BRASILEIRA – Cartilha 25 anos de Economia Popular Solidária, 2006

2. SINGER, Paul. “Economia Solidária: um modo de produção e distribuição” In: SINGER, P; SOUZA, A. R. A economia solidária no Brasil. São Paulo: Contexto, 2000.

3.TURINO,Célio. Apresentação do Programa Cultura Viva. Página do Programa. (www.cultura.gov.br/cultura_viva).

Para mais informações sobre Pontos de Cultura e Economia Solidária acesse:

Ministério da Cultura – Programa Cultura Viva – www.cultura.gov.br/cultura_viva

Fórum Brasileiro de Economia Solidária – www.fbes.org.br e www.cirandas.net

Também vale a pena conhecer a cartilha popular sobre a Economia Solidária lançada recentemente pela Cáritas Brasileira, Fórum Brasileiro de Economia Solidária, Instituto Marista de Solidariedade, entre outros parceiros. A cartilha inspira-se nas experiências já existentes e no tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano (CF 2010) “Economia e Vida” organizada pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs no Brasil – CONIC e pode ser baixada no sítio do Fórum – www.fbes.org.br.