Fonte: Documento divulgado por Daniel Rech*

A pedido da coordenação do Conselho de Alimentação Escolar – CAE, que administra os recursos disponibilizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, estivemos assessorando debate sobre a Resolução CD/FNDE n° 38 de 16 de julho de 2009 que teria autorizado a compra de produtos para a merenda escolar de associações e, mesmo, grupos informais de agricultores familiares. Tal autorização foi contestada devido ao fato de que as associações e grupos informais estariam impossibilitados de apresentarem as respectivas notas fiscais, indispensáveis para a realização da transação.

Estiveram presentes na reunião representantes do Conselho, membros da comissão executiva do programa e Procurador do FNDE, além de integrantes da UNICAFES e da CONCRAB.

Debate

O problema principal é que, apesar da Resolução ter autorizado transações com grupos informais e associações, as prefeituras e governos dos Estados se recusam realizar as operações devido à necessidade de emissão de Nota Fiscal de comercialização, que é exclusividades das sociedades com fins econômicos, sejam empresas ou cooperativas.

O grupo executivo do programa de acesso a produtos para a merenda escolar deparou-se com a dificuldade já no fim de 2009 e com recursos que precisam ser empenhados ainda no decorrer do exercício fiscal, necessitando portanto de um encaminhamento.

Em nome da UNICAFES, informamos que desde há muito tempo estamos insistindo que não é possível realizar operações de comércio sem nota fiscal e que as associações não são aceitas como intermediárias nesta negociação. Na verdade, há inúmeros sinais legais e doutrinários ao longo das últimas décadas que deixam claro que as associações não são instrumento adequado para a intermediação de operações de comercialização.

A preocupação dos presentes foi no sentido de consolidar os canais de acesso aos produtos da agricultura familiar para a merenda escolar, conforme previsto na Lei n° 11.346 de 15 de setembro de 2006 que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

Apesar de terem sido incentivadas a estar presentes nas atividades de comercialização, tanto agrícola como de produtos industrializados por grupos urbanos, as associações tem finalidade de promoção e assistência social e, portanto, não são instrumento adequado para as operações de compra e venda de produtos e, por isso, devem ser excluídas como possibilidades de intermediação de alimentos produzidos pela agricultura familiar para a merenda escolar. Primeiro, porque não possuem esta finalidade e, segundo, porque não estão autorizadas a se inscrever no cadastro estadual e, portanto, não podem ter bloco de Nota Fiscal. Excluídas as possibilidades de aproveitamento das associações como intermediárias e, com maiores razões ainda, dos grupos informais não legalizados, estivemos debatendo as possibilidades imediatas de encaminhamento. Os critérios para estas proposições deveriam considerar a legalidade das operações e, ao mesmo tempo, o período muito curto para resolver o problema e possibilitar a liberação de recursos para o acesso de produtos da merenda escolar para os pequenos produtores da agricultura familiar.

Propostas

Em nome da UNICAFES, sugerimos três possibilidades concretas que poderiam ser alternativas de solução do problema apresentado:

1 – Formação de uma microempresa

A primeira possibilidade é que as associações e grupos informais não legalizados, que estejam envolvidas com a transferência da produção da agricultura familiar para a merenda escolar, formassem uma micro-empresa. A formação de microempresa é procedimento rápido e resolveria a questão da nota fiscal. No entanto, observamos os inconvenientes de tal proposta por causa da mistura entre uma sociedade de pessoas (associação) e uma sociedade de capital (empresa), o que ocasionaria a transferência de poder aos detentores de capital e, portanto, desvirtuaria o caráter social da iniciativa. No entanto, como solução imediata, poderia ser uma alternativa, mesmo porque formar uma empresa é mais rápido que uma cooperativa. E, posteriormente, as pessoas que compõem a microempresa poderiam, com calma, constituir uma cooperativa.

2 – Filiação da associação a uma cooperativa

De imediato, não querendo perder as vantagens que uma associação poderia oferecer como agente aglutinador de esforços coletivos, há a possibilidade de que as associações envolvidas na operação se filiem a uma cooperativa e procedam a comercialização através desta cooperativa. Concordamos que se trata de solução problemática porque a associação não teria como distribuir eventuais ganhos na operação da cooperativa. Mas, como alternativa emergencial, poderia ser um caminho, já que a filiação à cooperativa é procedimento simples e, de imediato, a mesma poderia realizar a comercialização dos produtos de seus associados, sendo que, neste caso, a emissão da nota fiscal caberia à cooperativa.

3 – Filiação dos associados da associação numa cooperativa

Como melhor caminho, sugerimos um mapeamento de cada estado e que sejam eleitas algumas cooperativas locais às quais os produtores que possuem produtos para a merenda se filiem e assim resolvam via uma cooperativa a questão. Dissemos que considerávamos ser essa a melhor solução, enquanto as pessoas não se organizam e constituem a sua própria cooperativa. A proposta não pressupõe nem a constituição de nova pessoa jurídica e nem o término das atividades da associação. Os associados da associação continuam a ela pertencendo e a mesma cumpre suas finalidades de promoção, formação e assistência social, excluindo—se, no entanto, a intermediação da comercialização. Por outro lado, os produtores se envolvem nas atividades cooperativadas e isso tanto é benéfico para eles mesmos como para as próprias cooperativas que os acolhem. Posteriormente, poderão constituir suas próprias cooperativas, no âmbito da abrangência da associação da qual fazem parte. Outra grande vantagem desta proposta é que a operação de comercialização é imediata à filiação, não havendo necessidade de outros procedimentos.

Encaminhamentos

Após a realização dos debates e estudos das propostas, houve consenso que a terceira alternativa é a mais adequada para solucionar o problema. Mesmo porque também incentiva que as pessoas, pequenos produtores, se vinculem a cooperativas e assim avançamos no processo organizativo.

Como providências imediatas, foram encaminhadas:

1 – Fazer um mapeamento nos estados sobre quais as cooperativas que poderiam ser indicadas aos pequenos produtores que estão em condições de fornecer produtos para a merenda escolar. Para esta atividade é essencial a participação da UNICAFES e outras organizações como a CONCRAB, UNISOL, ANTEAG, FBES etc, sendo que isso deverá estar disponível o mais breve possível.

2 – Promover um debate com as associações sobre as suas limitações quanto aos processos de comercialização, para que elas mesmas incentivem seus associados a se filiarem de imediato a uma cooperativa. No entanto, isso não exclui que as associações promovam, com brevidade, debates entre os seus associados, para que seja constituída cooperativa própria, no âmbito de sua atuação, possibilitando maior integração dos mesmos e maior autonomia nos negócios.

Brasília, aos 18 de dezembro de 2009.

*Daniel T. Rech – Assessoria Jurídica da UNICAFES