Autora: Marcela Lagarde (*)

Contribuição de Leide Manuela

Pedem-me para falar de educação não-sexista e o que primeiro me salta à vista é o não. O que é que eu poderia dizer a respeito de não-sexista e, especialmente, sobre a educação não-sexista?

Não sei. Para mim é difícil abraçar uma causa e empreender uma jornada em negativo. Prefiro viver a favor.

Estou convencida de que toda indagação, toda busca de resposta a dúvidas, a problemas apresentados, é mais rica e propicia melhores alternativas quando é colocada a favor de.

Uma campanha de educação humana abrange os dois gêneros, masculino e feminino, mas é importante que nela se destaquem as mulheres porque, geralmente, de maneira sexista, somos absorvidas pelo humano. Além disso, quero me referir às mulheres, porque nós estamos empenhadas há muito tempo em desconstruir a ordem patriarcal do mundo e em construir formas libertárias de ser para as mulheres e para os homens.

Um novo mundo construído sobre a diferença paritária e no qual sejamos humanas e humanos. Por isso, se é preciso dizer não a algo, prefiro evocar aqui os nãos decisivos das mulheres. O não histórico ao mundo patriarcal que de forma isolada e quase inaudível disseram sempre as primeiras.

E os nãos que em coro dizemos com força, cada vez que somos cúmplices duas ou mais.

Quero evocar também a infinidade de nãos como os que dizemos todas a esta cultura opressiva e à nossa identidade, ainda patriarcal.

O não de que eu mais gosto é o de Franca Basaglia: ela diz que o primeiro não das mulheres aos outros é o primeiro sim a si mesma.

Esse não é imprescindível e me encanta como núcleo de uma nova identidade para as mulheres.

Não à sexualidade para os outros; não à maternidade a qualquer preço; não às gravidezes infantís e adolescentes; não aos abortos clandestinos; não ao próximo filho; não ao corpo feito coisa; não ao desejo alienado de receber o olhar sexista que nos concede a razão de ser.

Não ao corpo partido em pedacinhos para que outros o repartam, naco de nádega, de cintura ou de seios fragmentados, coisas alheias sentidas por centímetros; não a ser a imagem desalmada ou o ser ocupado em coitos desabitados.

Não a ser a pele e as suas profundezas de cada instante; não a ser o corpo para o prazer de outros; não à servidão voluntária de todas nós, denominada amor pelos outros; não à impotência como signo de feminilidade.

Não e muitos nãos, suficientes para todas as dependências que inutilizam, que cerceiam, que bloqueiam, que impedem.

Não à mulher maravilha.

Não a parir sem dor e sem consciência; não à multiplicidade de orgasmos idílicos.

Não à opressão das mulheres adoçada com a exaltação de feminilidades cativas.

Não à invisibilização das mulheres, de nossas obras, de nossos trabalhos, de nossos esforços vitais.

Proponho que iniciemos uma nova pedagogia de gênero com um sim às mulheres, com uma aprovação da sociedade às mulheres.

Uma pedagogia social e coletiva, pessoal e privada, de afirmação do eu mesma desde o princípio. Todas ganharíamos e a cultura se enriqueceria com a língua inédita da fala feminina que começa por algo mais ou menos assim:

Sim a mim mesma.

Sim a todas nós.

Sim com os outros.

Desde o nascimento e durante toda a vida.

Sim a indagar o mundo e a construir meu mundo, limitado, íntimo, contido e secreto, sim à minha privacidade, ao meu corpo, sim à minha integridade diante do dano e da fragmentação.

Sim às opções, à descoberta de Eros no canto, na chuva, na carícia da flauta doce e na dança.

Sim à suavidade do tato e às umidades; sim ao gozo e sim à consciência da morte; sim aos outros e às outras, às companhias escolhidas; sim à diversidade e à complexidade de seres sem certezas, em encontro e desencontro, em renovação.

Sim a dizer não quero, não posso. Sim ao desejo.

E a imaginar não ser mais território, silêncio e tabu.

Sim a dar nome ao mundo com novas vozes, sim a desejar em primeira pessoa, sim a criar.

Vim para somar-me a um sim que soe forte, que chegue a todas e todos, que nos comova.

Sim a uma educação por uma sexualidade livre.

Sim, porque nossa liberdade é, em essência, uma afirmação.

(*) Mexicana. Doutora em antropologia, professora e pesquisadora da condição da mulher. Coordenadora do “Taller Casandra de Antropologia de la Mujer”.

Tradução : Beatriz Cannabrava