Fonte: Vinícius Carvalho, jornalista do Portal da RTS.

Proposto pelo Grupo de Trabalho Amazônico no âmbito da Rede de Tecnologia Social (RTS), o Selo de Certificação Socioparticipativa vai atestar a origem ambientalmente sustentável, socialmente justa e culturalmente relevante de produtos resultantes da produção familiar agroextrativista na Amazônia Legal. O objetivo é a inclusão social das populações tradicionais da região no crescente mercado de produtos orgânicos.

Na Amazônia, quem resolve praticar sistemas produtivos orgânicos e associados ao aproveitamento da floresta em pé muitas vezes sofre diante da falta de reconhecimento no mercado. Proposto pelo Grupo de Trabalho Amazônico no âmbito da Rede de Tecnologia Social (RTS), o Selo de Certificação Socioparticipativa quer mudar esta história ao atestar a origem ambientalmente sustentável, socialmente justa e culturalmente relevante de produtos resultantes da produção familiar agroextrativista na Amazônia Legal. Por meio da identificação de produtos com o Selo, a idéia é agregar valor a este tipo de produção e disseminar a prática em maior escala, garantindo a inclusão social das populações tradicionais da região – os chamados povos da floresta – e adequando o agroextrativismo familiar ao crescente mercado de produtos orgânicos.

A proposta consiste na montagem de uma Rede de Certificação Socioambiental, inicialmente abrangendo oito dos 18 coletivos regionais da Rede GTA. Os coletivos regionais estão distribuídos nos estados do Amazonas, Acre, Rondônia, Pará, Amapá e Maranhão. O projeto prevê o beneficiamento de 40 famílias em cada regional envolvida, utilizando uma metodologia participativa de certificação que já funciona com sucesso em outros lugares do país, como a ACS, no Acre e Rondônia, e a Ecovida, no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. “Se não avançarmos na valorização destas práticas econômicas que sabem conviver com a floresta, não haverá saída sustentável para a Amazônia. E todos os nossos produtos serão oriundos de florestas preservadas”, argumenta o coordenador do projeto, Alberto Catanhede (Beto).

Na prática, explica, o projeto busca promover um nivelamento dos agroextrativistas capaz de melhorar a organização da produção e o aperfeiçoamento técnico das práticas de manejo, de modo a garantir a certificação. Um diferencial é que o sistema dispensa a contratação de técnicos para coordenar as etapas da produção, ocupação que ficará a cargo das próprias famílias – por isso socioparticipativa. “Não estamos qualificando ninguém que não more nestas comunidades. E são estas pessoas que serão capacitadas, até o final do ano, para o manuseio e a manutenção das máquinas”, diz.

As cadeias produtivas envolvidas são as do açaí, da castanha, do azeite de babaçu, do óleo de andiroba e do artesanato extrativista, com fibras e semente naturais. No momento, as famílias beneficiadas se preparam para encaminhar as solicitações de equipamento e maquinário necessários para padronizar e qualificar a produção, além de projetos de construção e reestruturação de galpões já existentes.

Duas máquinas que já estão na lista, explica Beto, são a Máquina Rotativa de Corte de Coco Babaçu e a Prensa Hidráulica para extração do óleo da amêndoa, com capacidade de 150 litros de óleo. Desenvolvida pela Fundação Mussambê, uma prensa hidráulica chega a extrair até 100 litros em oito horas de trabalho, ao passo que no processo convencional a produção atinge cerca de 20 litros de óleo em uma semana. Além de aumentar a produção, a máquina permite também o aproveitamento do resíduo do processo de prensagem, que vira uma torta rica em proteínas para ração animal, principalmente de ovinos, caprinos e suínos.

De acordo com o GTA, um dos principais benefícios do Selo será mobilizar os trabalhadores durante quase todo o ano. É que todas as culturas agroextrativistas são temporárias, como é o caso da castanha – a “colheita” geralmente não dura mais do que três meses. “Aí a tendência é realizar outra atividade que não necessariamente será sustentável. Com a certificação, os trabalhadores vão é se dedicar mais ao beneficiamento da própria produção”, diz.

Além de um site, a idéia é elaborar, até o final de 2009, um catálogo com todos os produtos. Isso sem falar nos quiosques que o GTA quer instalar em aeroportos de São Paulo, Brasília e do Rio de Janeiro com o apoio da Petrobras e da Fundação Banco do Brasil, que também trabalham na viabilização da certificação.

Entre os produtos, devem constar as castanhas beneficiadas por três comunidades da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes. Por lá, as castanhas ainda são quebradas manualmente, trabalho que deve ser substituído até o final do processo por maquinário específico. Atualmente, cada família chega a produzir de 20 a 40 latas de castanha pura por mês, cada uma com 10 quilos. “Hoje um quilo de castanha na região é vendido por cerca de R$ 3. Com o beneficiamento, o valor pelo menos dobra”, diz Joci, responsável pela cadeia da castanha no GTA.

BOX – O Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) foi fundado em 1992, está estruturado em nove estados da Amazônia Legal e é dividido em 18 coletivos regionais. Fazem parte da Rede GTA organizações não governamentais (ONGs) e movimentos sociais que representam seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco babaçu, pescadores artesanais, ribeirinhos, comunidades indígenas, agricultores familiares, quilombolas, mulheres, jovens, rádios comunitárias, organizações de assessoria técnica, de direitos humanos e de meio ambiente.