Fonte: Notícia publicada no site da Cáritas Brasileira

Há um provérbio africano que diz: “muita gente pequena, em muitos lugares pequenos, fazendo coisas pequenas, mudarão a face da Terra”. A partir dessa idéia, a Diocese de Santa Maria (RS), por meio do projeto Esperança/Cooesperança”, há 15 anos organizou a 1ª Feira de Cooperativismo Alternativo. Quatro mil pessoas visitaram os 27 empreendimentos na época, quando os balcões de exposição dos produtos eram improvisados com tábuas doadas pela população local. Em 2004, passados dez anos, o público chegou a 66 mil visitantes, com a participação de 321 empreendimentos.

Em 2008, a Feira de Santa Maria bateu recorde de público. Segundo a Brigada Militar, 145 mil participantes passaram pelos estandes de 750 empreendimentos de todas as regiões do Brasil, entre os dias 11 e 13 de julho.

Irmã Lourdes Dill, uma das organizadoras do evento e do projeto Esperança/Cooesperança, retomou o provérbio africano na abertura da Feira, comemorando a história de sucesso construída a muitas mãos. “O que nós estamos provando aqui, ano após ano, é que outra economia acontece. Não é apenas um espaço de comercialização direta dos empreendimentos solidários, mas uma experiência aprendente e ensinante em busca de um mundo justo e sustentável”, afirmou Irmã Lourdes, sob aplausos de mil pessoas que acompanharam a abertura.

A solenidade começou com a Caminhada Internacional e Ecumênica pela Paz, que saiu da praça Saldanha Marinho, no centro de Santa Maria, em direção ao Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter – local da Feira, reunindo duas mil pessoas.

O evento faz parte do Programa Nacional de Feiras do governo federal que, em 2007, promoveu 30 feiras em todo o Brasil. A Feira de Santa Maria é a mais antiga do país e da América Latina no setor de Economia Solidária. A promoção é da Diocese de Santa Maria/RS, Mitra Diocesana, Projeto Esperança/Cooesperança e Prefeitura de Santa Maria/RS, além de vários apoiadores.

Diversidade produtiva e cultural

Empreendimentos de 400 municípios expuseram uma diversidade de produtos, trazendo na bagagem as tradições culturais de cada região: artesanato, roupas, acessórios, alimentos agroecológicos, bebidas caseiras, etc. Segundo a coordenação da Feira, o critério para que os empreendimentos possam comercializar no evento é a forma de organização coletiva, como associação, cooperativa e grupos produtivos. Dentre eles, participaram empreendimentos acompanhados pela Rede Cáritas no Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Sergipe e Bahia.

Antônio Cláudio de Oliveira, 31, agricultor e presidente da Associação de Jovens de São Luís, no Maranhão, cruzou o país para conhecer as diversas experiências de economia solidária. “Estou aqui para aprender, pesquisar formas de ajudar o povo da minha região, meu objetivo é incentivar os jovens a ter trabalho no próprio lugar e não cair nas mãos do trabalho escravo, que é o nosso grande problema no Maranhão”, contou Oliveira. Segundo ele, no ano passado, 26 associados foram trabalhar no corte de cana-de-açúcar em São Paulo. Neste ano, o número diminuiu para 9. Antônio também faz parte da Associação dos Pequenos Trabalhadores de Vila Ribeira, grupo acompanhado pela Cáritas Regional Maranhão, envolvendo 66 famílias produtoras de farinha de mandioca.

Seminários contribuem para carta final do encontro

A programação da Feira contou com 12 seminários temáticos: comercialização, comércio justo, catadores, exclusão, desenvolvimento sustentável, lutas do campo, Fórum Social Mundial, consumo consciente, reforma urbana, etc. A pluralidade de enfoques possibilitou que a carta final do encontro tivesse uma abordagem ampla. Todos os seminários definiram proposições para o documento final de Santa Maria.

No Seminário Internacional da Rede Cáritas Latino-americana, por exemplo, que contou com as delegações do Brasil, Argentina, Uruguai, um representante da Bolívia e uma do Secours Catholique (Cáritas França), os/as participantes sugeriram que haja um momento específico de formação com os empreendimentos, porque muitas vezes acabam ficando mais centrados na comercialização. Outro indicativo foi a necessidade de se construir um marco legal que atenda os pequenos empreendimentos, entre outras propostas.

O Seminário Internacional sobre Segurança Alimentar e Nutricional foi coordenado pelo assessor da Cáritas Regional Rio Grande do Sul, Altair Pozzebon. Segundo ele, a crise mundial dos alimentos está relacionada à falta de investimento na agricultura familiar. “Hoje, 80% dos alimentos consumidos vêm de pequenas propriedades. São fornecidos subsídios ao agronegócio, à exportação, mas muitos dos alimentos vendidos para fora do país acabam não alimentando pessoas, e sim animais”, declara. Outro fator que contribui para a crise de alimentos, de acordo com Pozzebon, é o desenvolvimento das monoculturas, como fumo e celulose, por exemplo.

Carta final reafirma protagonismo dos empreendimentos

O documento final da Feira, lido no encerramento (13) do evento, destaca 42 compromissos que visam ao fortalecimento dos empreendimentos. Desde controle de qualidade dos produtos à adequação na legislação de cooperativismo, as propostas perpassam as dimensões ambiental, política, econômica, cultural e social de desenvolvimento sustentável. Destaque para os compromissos de propor políticas públicas voltadas à economia popular solidária; educação para a garantia de direitos e transformação da realidade; priorização da produção, consumo e comercialização, de acordo com as diferentes culturas regionais.

Segundo a carta, vários elementos apresentam-se como diferenciais da Feira: a organização articulada e interativa – que neste ano aconteceu por meio de 60 equipes de trabalho –; a prática do mutirão permanente; a valorização da formação e da integração entre diferentes etnias, países e continentes. Sobretudo, a constatação de que a Feira foi realizada num clima de paz, alegria, diversidade cultural e solidariedade.

Na cerimônia final, Irmã Lourdes Dill, organizadora do evento, agradeceu aos que trabalharam nos bastidores e aos parceiros enfatizando que “a Feira caminha para o Fórum Social Mundial com a força da globalização, seriedade e justiça”.

Entre um discurso e outro, o músico nativista Antônio Gringo apresentou músicas que falavam da terra, água e cooperativismo, além de uma que homenageia o bispo Dom Ivo Lorscheiter, um dos idealizadores da Feira. Ao final da cerimônia todos os participantes foram convidados a dar o tradicional abraço coletivo, celebrando a união.

A 4ª Feira da Economia Solidária do Mercosul, 15ª Feira Estadual do Cooperativismo (Feicoop), 7ª Feira Nacional de Economia Solidária e 4º Seminário Latino-americano de Economia Solidária ocorreram de sexta-feira (11) a domingo (13), no Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, na Rua Heitor Campos, bairro Medianeira.

Confira os dados da 4ª Feira de Economia Solidária do Mercosul

Público total: 145 mil pessoas Empreendimentos expositores: 750 Empreendimentos visitantes: 150 Entidades apoiadoras: 250 Municípios participantes: 400 Estados brasileiros presentes: 27 Países participantes: 25 Seminários realizados: 12 Atividades culturais no palco: 25

Comunicação – De acordo com a organização do evento, mais de 40 veículos de comunicação cobriram as atividades por meio de jornais, canais de TV, assessorias de imprensa, revistas e rádios. Além de jornalistas brasileiros/as, estiveram presentes profissionais da Argentina, Bolívia, Peru, Uruguai, Canadá, Espanha, entre outros.

Seminários temáticos – Por iniciativa de várias organizações, foram realizados o Seminário Nacional da Comercialização Solidária e Políticas Públicas; Seminário Estadual da Unicafes do Rio Grande do Sul; Seminário Nacional do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa); Seminário Internacional de Economia Solidária e Comércio Justo; Seminário Internacional: Exclusão, Desenvolvimento Solidário e Sustentável; Seminário Internacional da Reforma Urbana, Economia Solidária e Políticas Públicas; Seminário Internacional Mobilizador e Preparatório ao Fórum Social Mundial (FSM); Seminário Internacional da Cáritas Latino-americana; Seminário Nacional dos Catadores/as; Seminário Nacional de Reconversão do Tabaco: “Por um mundo sem tabaco”; Seminário Internacional das Lutas do Campo; Seminário Nacional: Trocas Solidárias e Consumo Consciente.

*Texto de Renina Valejo, da assessoria nacional da Cáritas. Colaboração: Patrícia Lemos e Tiago Medeiros, da assessoria de imprensa da Feira.