Fonte: Texto de João Vergílio*

Creio que existe uma questão de fundo nessa história toda sobre a qual valeria a pena refletir. Durante muito tempo, a esquerda esteve engajada numa luta contra o que poderíamos chamar de “micropoderes”: relações de dominação no interior do casamento, do escritório, da escola, etc.. Há bandeiras interessantíssimas que tiveram sua origem aí. Mas há também verdadeiros entulhos que se colocam no caminho da esquerda quando esta chega ao poder. As políticas educacionais são um bom exemplo. Sob mil e uma roupagens, a esquerda foi se comprometendo com teses que giram em torno da dissolução das relações de poder no interior do sistema escolar. Havia (e ainda há) uma valorização positiva de qualquer ruptura de vínculos subordinantes: da escola à secretaria da educação, do professor em relação à direção da escola, do aluno em relação ao professor. Havia (e ainda há) uma crítica generalizada à idéia de avaliação de professores e alunos.

As editoras didáticas fizeram fortuna (e ainda fazem) na esteira dessa ideologia “libertária”. Ao invés de o Governo oferecer um material unificado nas escolas, criou o negócio milionário do livro didático. Lucro certo, com público cativo para as editoras. Tiragens de centenas de milhares de exemplares sem nenhum risco. Sai da gráfica para a mão do freguês. E vira, é claro, moeda política de troca. Publique tal coisa na sua revista, que nós adotaremos tal livro da sua editora.

É preciso cortar este mal PELA RAIZ.

Por que o Ministério da Educação não contrata professores de altíssimo nível e grandes redatores para montar uma coleção didática para CONCORRER com o material das editoras privadas? Por que não elabora uma coleção de DVDs para acompanhar esse material didático, com orientações minuciosas, aula a aula, para os PROFESSORES da rede pública? Em um ano, com uma boa equipe, esse material estaria na praça. A economia seria enorme. E os ganhos educacionais maiores ainda.

Façam isso, e estarão pondo o dedo bem no meio da ferida e dando duas voltas. Aí vocês veriam o pessoal do lado de lá berrando de verdade. Porque iria doer. No bolso.

P.S.: Confio no ministro Fernando Haddad. Grande intelectual e grande pessoa. Mas um plano desse tipo dependeria, antes de mais nada, de se conseguir isolar (ou cooptar, mantendo sob estrito controle) a “turminha da Pedagogia”. Não sei se ele teria força para tanto.