Fonte: www.iesb.br

Na economia solidária, a responsabilidade socioambiental não se limita ao produto pronto para consumo. Práticas e valores éticos estão presentes em toda cadeia produtiva (produção, distribuição e comércio). Cada produto possui uma história e o consumidor pode escolher investir em empresas que respeitam o meio ambiente e direitos humanos, explica Daniel Tygel, secretário executivo do Fórum Brasileiro de Economia Solidária. Segundo levantamento recente, 28,6% dos empreendimentos solidários oferecem produtos orgânicos ou livres de agrotóxicos e 31,8% reaproveitam resíduos (Atlas da Economia Solidária – 2005).

Existem diversas formas de economia solidária: mercado justo, cooperativismo, feiras de troca, e empresas falidas recuperadas por trabalhadores. Para a Secretaria Nacional de Economia Solidária, são consideradas atividades econômicas organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob forma coletiva e por meio da autogestão. Segundo Cláudia Andreoli Galvão, pesquisadora do Núcleo de Estudos Agrários da UnB, não existe relação direta entre este setor e o meio ambiente. Porém, é natural o cidadão procurar estes produtos quando interessado no consumo sustentável. “Existe toda uma cadeia de pensamentos solidários envolvidos nesta rede”, explica a pesquisadora. Tygel, por sua vez, enfatiza a relação dos trabalhadores com a comunidade e o local onde vivem. Há interesse maior na preservação do ambiente para gerações futuras. Estas práticas surgem como forma de resistência ao capitalismo. “No capitalismo, tem a geração da riqueza por um lado, mas também tem a geração da pobreza”, Galvão exemplifica o chamado duplo movimento de Karl Polanyi.

Alternativa ao capitalismo, as atividades se fundamentam em outros valores éticos, voltados para autogestão, desenvolvimento local, inclusão, sustentabilidade e distribuição de renda. “Tem uma outra economia em curso no país”, exclama Antônio Haroldo Mendonça, coordenador geral do Comércio Justo e Crédito da Secretaria Nacional de Economia Solidária. De acordo com o Atlas da Economia Solidária, existem 1 milhão e 250 mil trabalhadores envolvidos em quase 15 mil empreendimentos no Brasil. Os produtos de mais destaque das atividades são: agropecuária, extrativismo, pesca, serviços de alimento e bebida, finanças e créditos. Este setor movimenta 8 bilhões de reais por ano, informa Mendonça. O número não é exato e corresponde à projeção nacional do levantamento realizado até o momento.

Certificação da economia solidária

Selos internacionais certificam produtos para o mercado justo. A pesquisadora Cláudia Galvão cita a FLO (Organização Internacional de Rótulos para o Mercado Justo) e a EFTA (Associação Européia para o Mercado Justo). Nestas práticas, pessoas desenvolvem o consumo seletivo de produtos de acordo com normas éticas. “Esses consumidores normalmente estão dispostos a pagar um pouco a mais pelo produto, sabendo que não está prejudicando o meio ambiente, explorando crianças ou trabalhadores, e utiliza melhor as matérias-primas, sem desperdício”, declara Galvão. No Brasil, o documento normativo que prevê a certificação do comércio justo e solidário está em fase de apreciação no Ministério do Trabalho. Para Mendonça, a expectativa é o Ministro do Trabalho Carlos Lupi assinar o documento nos próximos meses. A assinatura cria portaria para definir a colaboração de organismos de avaliação de conformidade. A certificação pode ocorrer por meio de auditorias externas aos empreendimentos ou comissões de avaliação formadas pelas organizações envolvidas. Segundo Mendonça, “a idéia é alavancar um ambiente favorável a essa relação da economia solidária”. O selo informa o cidadão sobre a maneira como a mercadoria foi produzida e viabiliza o consumo consciente. “O consumidor vai fazer muito pouco se ele não tiver as instituições do setor público dando suporte”, pondera Galvão. Para a pesquisadora do Núcleo de Estudos Agrários da UnB, Violeta de Faria Pereira, a regulamentação governamental é essencial: “o Estado agindo preserva o capitalismo, porque senão o capitalismo entra em colapso”. Para o Fórum Brasileiro de Economia Solidário, não interessa um selo de abrangência nacional. A certificação nacional pode gerar burocracia, se distanciar da realidade dos empreendedores e aumentar a exclusão da distribuição. “De que adianta ter o selo da economia solidária para vender no Wal-Mart?”, adverte Tygel. Para o secretário executivo do Fórum, o ideal é a certificação de todo o processo: produção, distribuição e consumo.

Consumo solidário

Existem três maneiras do cidadão participar na economia solidária. Primeiro, como consumidor. “Pensar, quando vai consumir, o que está consumindo”, explica Tygel. Evitar comprar produtos de multinacional e preferir mercadorias locais e agroecológicas. No site do Fórum, o “farejador” indica empreendimentos em todo o país. Como militante, a pessoa pode se aprofundar sobre os temas de capacitação, finanças e legislação para o setor. O interessado também pode se organizar de maneira solidária, formar com amigos uma associação de compradores ou grupo de troca. No Distrito Federal, existe a Feira de Troca Escambau. A iniciativa é da Cooperativa Trilha Mundos, organização de cultura, turismo e educação ambiental. A feira de troca surgiu em 2006. Foram quatro edições no CONIC e duas em faculdades. “A gente não deixa ninguém vender, nem comprar nada”, enfatiza Cláudia Sachetto, coordenadora da feira. A próxima Escambau deve ocorrer no final de abril no CONIC.