Fonte: Secretaria Executiva do FBES
Nos dias 28 a 30 de novembro deste ano ocorreu o encontro “Lima+10”, que a princípio seria comemorativo dos 10 anos desde o encontro de globalização da solidariedade que ocorreu em 1997 em Lima e desencadeou a série de encontros (Québec 2001, Dakar 2005) nos quais foi criada a Ripess (Rede Intercontinental de Promoção da Economia Social e Solidária), e no qual o FBES entrou, desde Dakar2005, no Conselho de Administração, composto por 2 redes de cada continente.
No caso da América Latina, as 2 redes são FBES (Brasil) e GRESP (Perú). Pelo FBES estiveram presentes Rose, Ary e Daniel. Além disso, do Brasil estiveram Haroldo da SENAES, e uma pessoa da Visão Mundial que não me recordo o nome. Havia a presença de representações de entidades e redes de pelo menos 11 países, que eu me lembre: perú, bolívia, uruguay, cuba, venezuela, colômbia, méxico, argentina, brasil, equador, chile. O evento foi organizado pelo GRESP, que hoje é a secretaria operativa da RIPESS na América Latina, e teve um caráter de planejamento e regulamentação da Ripess na América Latina, o que eram objetivos amplos e por isso foram apenas parcialmente atingidos.
Podemos dizer que o encontro se dividiu em 3 grandes momentos: um de planejamento de ações em 5 temáticas (gênero; políticas públicas e incidência; finanças solidárias; comércio justo; formação), um segundo momento para buscar aprovar a carta de princípios e regimento de Ripess América Latina (havia propostas para o regimento e para a carta de princípios); e um terceiro momento que foi um seminário aberto ao público e foi de uma riqueza impressionante especialmente na temática de políticas públicas de ES e marco regulatório (falarei mais adiante disso).
A parte de planejamento das 5 temáticas se deu em 5 grupos que se reuniram durante um dia inteiro, e produziram um plano de ações: objetivos, atividades, data (prazo), responsabilidade, resultados esperados. Enfim, o famoso “o que, quem, quando, como” organizado por objetivos e metas, cada um dividido em atividades com prazos e responsabilidades. Deu bastante trabalho, mas foi interessante, pois explicitou as diversas perspectivas e concepções que ali estavam representadas, além de ter esboçado algumas prioridades de ação para o biênio 2008-2010.
Já a parte de regulamentação e carta de princípios foi em plenária, a partir de propostas entregues pelo GRESP aos participantes durante o evento.
Rose, Ary, eu e Haroldo nos reunimos antes do início do encontro (todos são do GT-RI) e discutimos quais seriam nossas contribuições em cada uma das temáticas, a partir dos acúmulos do Brasil, e assim nos dividimos para participarmos dos grupos temáticos e apresentar nossas propostas. Podemos dizer que elas foram em maior ou menor medida incorporadas em todos os grupos. Claro que futuramente virá o relatório oficial organizado pelo GRESP, mas é importante passar nossas impressões anteriormente, principalmente porque o FBES tem uma grande responsabilidade pela frente: participar nos comitês criados, e ajudar a organizar o evento Uruguay 2008, conforme apresentarei a seguir.
Além dos 2 grande blocos (planejamento e regulamentação), que deram bastante trabalho e geraram momentos tensos de debate acirrado, houve um rápido momento para se pensar no evento do Uruguay, previsto para outubro de 2008 e que será a continuação dos encontros latinoamericanos de Cochabamba (2005) e Havana (2007), e tem como objetivos:
a) definir as contribuições da América Latina para o IV encontro de globalização da solidariedade previsto para ocorrer em 2009 (é a continuidade de dakar2005);
b) consolidar os trabalhos iniciados em Lima+10 (especialmente das temáticas. Apesar de termos proposto das deliberações de regulamentação também serem submetidas para uruguay, acredito que acabou ficando decidido de ser resolvido por e-mail pelas redes participantes da Ripess A.L.);
c) definição dos delegados da América Latina para o IV encontro de globalização da solidariedade de 2009.
Partilho aqui algumas impressões e resultados do encontro:
1. A articulação dos movimentos de Comércio Justo e Economia Solidária em América Latina é algo realmente importante, mas ao mesmo tempo extremamente desafiador. Exige que avancemos em marcos conceituais minimamente consensuados, o que é difícil em muitos momentos. Apenas para citar um exemplo, há posições diferenciadas sobre responsabilidade social empresarial….
2. Resumindo muito tudo o que ocorreu sobre as 5 temáticas, me parece que as prioridades (principais ansiedades) que saíram do encontro foram as seguintes:
a) avançar nas relações comerciais entre empreendimentos solidários da América Latina;
b) consensuar indicadores e procedimentos de garantia (certificação), incluindo a possibilidade de se pensar um selo latinoamericano de economia solidária e comércio justo;
c) construir um marco conceitual comum (ou minimamente consensuado) sobre economia solidária e comércio justo (identidade);
d) identificar as experiências de economia solidária (de produção, comercialização, finanças, formação e consumo) na América Latina, o que pode significar um “mapeamento latinoamericano de ES” (novamente, identidade);
e) consolidar uma “Escola latinoamericana de formação em Economia Solidária e Comércio Justo”, sustentada por uma rede de formadores;
f) consolidar um “Observatório latinoamericano de Economia Solidária e Comércio Justo”;
g) avançar nas contribuições da ES para eqüidade de gênero;
h) incidir em espaços latinoamericanos tais como mercosul, merco-andino, BancoSul, banco mundial, união européia, cumbres de los pueblos (cúpulas dos povos), FSM, entre outros;
i) promover um concurso de produção de material de sensibilização (multi-mídia) ao consumo consciente (identidade visual).
3. O movimento brasileiro de ES é referência para muitos debates, e de fato, quando estamos debatendo, percebemos que temos um acúmulo importante no campo. Entretanto, isso traz duas dificuldades: por um lado, o FBES acaba sendo chamado a participar de muitos espaços, a fica difícil se abster desta tarefa; por outro lado, há, algumas vezes, uma sensibilidade, especialmente dos companheiros do perú, quanto à força do FBES, o que exige paciência e muita maturidade de nossa parte nas nossas posições;
4. O evento do Uruguay 2008 depende muito da participação ativa do FBES, principalmente porque não há movimento forte no uruguay, e o brasil como vizinho foi “chamado” a dar consistência e peso ao processo.
5. Com relação ao regimento e carta de princípios da Ripess, percebeu-se que não houve apropriação suficiente pelas redes nacionais para que pudéssemos contribuir suficientemente. Assim que o pessoal do GRESP enviar estes dois documentos (regimento e carta de princípios), darão um prazo para cada rede se manifestar. Será importante se nós do FBES conseguirmos fazer nossas contribuições à luz de nossa carta de princípios e de nossa forma de funcionamento (tanto a partir de aspectos positivos quanto dos frágeis de nossa estrutura atual). Assim que forem enviados, repassarei aqui nesta lista para recolher nossas contribuições…
6. O seminário sobre políticas públicas foi muito rico, especialmente pelas contribuições do méxico (deputado federal mexicano que apresentou a proposta de Lei Geral da Economia Solidária do México, que deve ser votada esta semana!), da colômbia (a constituição colombiana reconhece a economia solidária e o trabalho associativo, e isso implica num espaço importante de avanços no marco regulatório!), e da venezuela (ações governamentais no campo da “economia popular” que agora se chama “economia comunal” e seus efeitos). Ressaltei estas 3 apresentações, apesar das outras também terem sido ótimas (Jesus Cruz de Cuba e Haroldo da SENAES), pois acredito que elas nos ajudam a pensarmos nas nossas lutas no campo do marco legal! Em especial no debate de possíveis proposições de nossa parte para emendas constitucionais (reconhecer a economia solidária como setor econômico; reconhecer o trabalho associativo, autogestionário, como uma forma de trabalho diferente do subordinado ou do autônomo; reconhecer a propriedade coletiva) e para o nosso “estatuto da economia solidária”. Espero em nova mensagem falar dos casos mexicano e colombiano e enviar para esta lista alguns documentos importantes para nos subsidiar nos nossos debates.
7. Foram criados 6 comitês, e para cada um temos que indicar quem do FBES fará parte. Estes comitês vão trabalhar por e-mail, aprofundando as propostas desenhadas durante o encontro Lima+10. Cada um destes comitês apresentará então uma proposta de plano de ações mais detalhada no evento do Uruguay 2008. Os comitês criados foram os seguintes:
7.1 Gênero e Economia Solidária/Comércio Justo;
7.2 Grupo provisório de Formação, com o objetivo de preparar um levantamento inicial de entidades de formação em ES e CJ e de preparar uma Oficina sobre Formação que ocorrerá durante o encontro do Uruguay2008 (poderia participar aqui alguém(ns) do GT de Formação);
7.3 Grupo provisório de Mapeamento, com o objetivo de preparar uma proposta inicial de metodologia para uma ação em nível latinoamericano de mapeamento da ES e CJ (poderia ser alguém(ns) da CGN do SIES – o Comitê Gestor Nacional do SIES);
7.4 Comércio Justo: campo da comercialização (poderia ser alguém(ns) do Grupo do Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário);
7.5 Finanças Solidárias;
7.6 Grupo provisório do Observatório de ES e CJ, com o objetivo de desenhar uma proposta inicial de plano de ação para se criar um Observatório de Economia Solidária e Comércio Justo;
Esta mensagem traz um relato resumido e não oficial do encontro ocorrido em Lima/Perú na semana passada. Apesar de ser longo, é importante a leitura por haver aí elementos importantes para o nosso movimento de ES no Brasil e participação do FBES no cenário internacional.
Relato feito por Daniel Tygel – Secretaria Executiva do FBES