Fonte: Cáritas Notícias

Ação agrava situação de exclusão social dessas famílias

Centenas de crianças chorando, algumas pedindo de volta brinquedos que ficaram nos barracos demolidos por tratores. Moradoras, com voz embargada e com filhos no colo – sem oferecer resistência –, mostram fichas de cadastro do governo do DF com promessas de habitação popular. “Eu guardo esses papéis há muitos anos, era a minha única esperança de vida digna, mas nem sei se vale mais alguma coisa”, lamentou Maria Cecília, 45, sem obter atenção por parte da PM. Essas foram algumas das cenas durante a derrubada de mais de 300 barracos na Via Estrutural, promovida na manhã de 31/01 pelo Governo do Distrito Federal (GDF) – administrado pelo governador José Arruda (PFL), eleito em outubro de 2006.

Cerca de 280 moradores fazem parte cooperativa de materiais recicláveis Coopativa – Cooperativa Ativa. A entidade funciona desde 2002 em um terreno de 400 metros quadrados, cedido pelo Governo Federal, ao lado da área pública onde foram construídos os barracos. “Não faz sentido. Agora que começamos a trabalhar com reciclagem eles vêem e destroem nossas casas. Moramos aqui porque é perto do nosso serviço. Vão levar a gente pra longe – e quem vai pagar nossa condução todo o dia? Ficaremos, de novo, sem renda. O governo, além de não respeitar os nossos direitos, atrapalha, não deixa a gente trabalhar. Fomos enganados e esquecidos – só a polícia é quem lembra da gente. Nem tenho como dizer a tristeza que estou sentindo”, reclama Maria.

Acesse o Manifesto Governo Arruda começa derrubando barracos – Manifesto contra a Política arbitrária de desocupações em http://www.fbes.org.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=437 Para aderir ao Manifesto envie e-mail para teixeira@caritasbrasileira.org com o nome da sua instituição.

A Polícia Militar chegou sorrateiramente, sem avisar, às 7h45, e começou a operação. Muitos moradores ainda dormiam e foram acordados pela PM. A ação estava prevista para esta terça-feira (30), mas foi adiada pelo governo, que se comprometeu a negociar a desocupação. No dia seguinte, porém, os moradores foram pegos de surpresa. Mais de 500 policiais militares e agentes do governo não enfrentaram resistência por parte da população.

Segundo representantes do GDF, a retirada aconteceu porque as pessoas viviam em condições insalubres, em meio ao lixo, expostas a doenças e riscos de contaminação. Mas ONGs denunciam a ausência de planejamento social para a ação repressiva. “O mais absurdo é que o governo primeiro despeja as pessoas e depois faz o cadastro das famílias para decidir o que fazer. As ‘alternativas’ impostas são paliativas e não resolvem a situação”, denuncia o Conselheiro Tutelar Rafael Madeira. O GDF oferece às famílias três opções: auxílio moradia de R$ 216,00 para custear um mês de aluguel (recusado pela maioria dos moradores – porque não conseguem locar imóveis por motivos burocráticos como, por exemplo, comprovação de renda); ficar em um abrigo; ou passagem de volta pra suas cidades de origem.

Para fiscalizar a ação da polícia, a derrubada foi acompanhada pelo promotor de Justiça Militar, Mauro Faria, entre outras autoridades do governo local. Várias organizações sociais também estiveram presentes para garantir o respeito aos direitos humanos da população e, principalmente, para cobrar do governo soluções efetivas e dignas aos moradores. Acompanharam toda ação entidades como a Cáritas Brasileira, o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), o Centro de Defesa dos Direitos da Criança e dos Adolescentes (Cedeca-DF), entre outras organizações.

Os catadores de papel foram levados para casa de parentes no Distrito Federal. Mulheres e crianças serão encaminhadas para abrigos. Como é o caso de Claudia da Silva*, 24 anos. No ano passado ela, o marido e os três filhos foram removidos de uma outra invasão e colocados no Centro de Albergamento Conviver. Ela resiste em voltar ao local. “Uma vez eu fiquei lá três dias, levei uma facada na perna e roubaram minhas coisas”, conta. “Lá tem todo tipo de gente. Prefiro viver nas ruas do que voltar pra lá”.

Organizações sociais do Distrito Federal estão solicitando assinaturas para o “Manifesto contra a Política arbitrária de desocupações” promovida pelo governador José Arruda (PFL). Para acessar do documento acesse: www.caritasbrasileira.org/manifesto.doc

*O nome da moradora citado na matéria é fictício para preservar a fonte.