Fonte: Depoimentos colhidos em Nairóbi, pelas jornalistas AnaCris Bittencourt, Iracema Dantas e Jamile Chequer.
Rosemary Gomes, Fase e Fórum Brasileiro de Economia Solidária
A cidade me surpreendeu muito. Na África só conhecia Dakar, capital do Senegal. Nairóbi tem uma logística e uma infra-estrutura urbana muito melhores que lá. Achava que iria encontrar uma cidade mais pobre, até pelas informações que tínhamos. Mesmo no centro, mesmo na pobreza, há uma lógica própria, há uma cadeia de economia informal que funciona bem, igual no Brasil. Muito da informalidade da economia brasileira é parecido com a da África. Uma coisa que pensava e que estava errada tem a ver com a questão da Aids. Vi campanhas, mas não vi tanto quanto esperava.
Cândido Grzybowski, Ibase
Fala-se muito de violência no Quênia, coisa que não tenho visto. Tenho visto mais carinho. Nós, brasileiros, que temos o racismo marcado, em geral associamos racismo à cor da pele. O Quênia tem seres humanos maravilhosos, iguais ou melhores que nós, que estão mostrando sua vitalidade, seu carisma. Estamos hospedados em casas particulares, em vez de hotéis, e a atenção que estão nos dando é de um afeto, de uma delicadeza impressionante. Não se trata de uma relação submissa, de colonizador para colonizado, pelo contrário, é afirmação dos seus valores. O Fórum, em si mesmo, é uma expressão da vitalidade política africana, são povos que há pouco tempo fizeram enormes lutas pela libertação, de rompimento com a estrutura colonial, e venceram. No Brasil, nunca tivemos uma luta desse tipo, aqui foram outras conquistas. O interessante é que a nova geração que está aqui no Fórum traz também essa memória do passado. Precisamos aprender com isso. Agradeço pelas oportunidades que o Fórum abriu de estabelecer contatos, abrir janelas de diálogo.
Francisco das Chagas Fernandes, secretário de educação básica do Ministério de Educação
Nós, que conhecemos pouco sobre a África, achamos que tudo é miséria. Na realidade, existe muita desigualdade sim, mas existe também um povo ativo, participativo. Sabemos que a maior parte das pessoas que estão participando desse Fórum é da região. Para mim, isso é o mais positivo aqui, a vontade dessa população de participar. O Fórum Social Mundial, por onde passa, tem um poder muito forte de mobilização, contribui para que as populações locais possam se organizar melhor e entender melhor o mundo. Acho fundamental o FSM se deslocar e acontecer em regiões como o Quênia.
Athayde Motta, coordenador do Ibase
A hospitalidade do povo queniano é algo espantoso, é fora do comum em relação ao que conhecemos, principalmente se comparamos com os países da América Latina e da Europa. A hospitalidade do povo queniano é um exemplo de dignidade humana e um exemplo de solidariedade que deveria ser reproduzido em todo o mundo. O mundo deveria aspirar a ser tão hospitaleiro como os quenianos. Também a cultura do país, a beleza do povo transcendem em muito as limitações relacionadas à pobreza que todos os países da África têm. Não é possível que uma pessoa do Brasil não se sinta bem-vinda ou estimulada a descobrir o Quênia, a descobrir o que as pessoas fazem, a descobrir mais sobre o país. É um país que trata de maneira muito especial seus visitantes.
Jamile Chequer, jornalista do Ibase
O Quênia foi uma grande descoberta. As pessoas são extremamente solícitas, simpáticas, eu me senti abraçada aqui de uma forma como nunca me senti na vida. É como se eu estivesse aqui desde sempre, é algo meio simbiótico, de repente a gente se sente queniano. Agora, metade de mim é brasileira, metade é queniana e é emocionante estar aqui. Vim tentando descobrir minhas raízes e sei que recebi muito mais que isso, neste país eu ganhei irmãos de verdade.
Antes de vir para cá, achava que a África era povoada por pessoas que não tinham futuro, a imagem que a mídia passa normalmente da África é a de que nada funciona e que é um continente perdido, onde não há o que fazer. No entanto, quando chegamos, descobrimos que as pessoas têm, obviamente, futuro, que elas têm força para construir esse futuro e elas estão buscando suas oportunidades para construí-lo. Daqui a algum tempo, vamos continuar ouvindo falar muito da África, mas de outra forma.
Mariana Santarelli, pesquisadora do Ibase
Quando se fala na África, às vezes as pessoas passam uma imagem com a qual não consigo concordar, que por serem pessoas vivendo na pobreza, elas vão querer sempre se dar bem, tirando algum dinheiro da gente. Eu não tive esse sentimento, quando você começa a conversar com as pessoas, olha nos olhos delas, elas tratam você como um igual, independente de você ser de outra cor, de outro país. Acho que o fato de sermos brasileiros faz com que as pessoas nos recebam ainda com mais carinho. Uma coisa que achei que ia acontecer aqui, um problema causado mesmo pela pobreza, eu não senti. Achei as pessoas muito generosas, comunicativas, inteligentes e solícitas, isso foi o que mais me surpreendeu.
Nunca tive muito preconceito em relação à Àfrica, sempre tive mais curiosidades do que preconceitos. Em relação às minhas curiosidades, eu me surpreendi pouco, tem essa coisa de você olhar para o lado e ver só negros, isso dá uma impressão positiva, não é muito diferente de estar no Brasil. Acho que somos povos muito parecidos.
Maya Menezes, jornal O Globo
A experiência positiva que tive aqui no Quênia foi em relação às pessoas. A primeira impressão que a gente tem é que o lugar é opressor porque não tem transporte público, não tem sinalização, não tem nada. Mas aí se dá conta de que a pessoa que se oferece para te ajudar é absolutamente honesta, ganhamos amigos em cada esquina, as pessoas sorriem para você, é uma descoberta fantástica. A primeira sensação que tive foi de que iria me perder, como se estivesse chegando em São Paulo ou no Rio, que são cidades muito mais inóspitas do que Nairóbi, nesse aspecto da acolhida. E acaba que agora eu fiz amigos, não são amigos de infância, são pessoas que me ligam, preocupadas, querendo saber como estou. Tem um rapaz que está trabalhando como motorista para mim que virou uma espécie de âncora, ele pergunta se estou bem, se preciso de remédios, as pessoas estão cuidando de mim, esse foi um preconceito que eu quebrei. O preconceito que eu quebrei foi em relação a esse medo que temos no Brasil de visitar a África, já tinham me dito isso, que é um país extremamente caloroso, as pessoas são muito afáveis.
Ana Flor, jornalista free-lancer da Folha de São Paulo
Um dos aspectos mais positivos no Quênia é o fato de que as pessoas são muito abertas, são muito interessadas em outras pessoas, querem saber do seu país, de você. Apesar de ser um povo com pouca educação formal, percebe-se que o queniano é poliglota, fala no mínimo três línguas, o que também é impressionante. O que quebrou um pouco a minha idéia de África, desse lado da África que eu não conhecia até vir morar aqui, foi o fato de que Nairóbi é uma cidade cosmopolita, existem pessoas do mundo inteiro aqui. É uma cidade em que temos todas as condições de viver e que a pobreza não é muito diferente da pobreza que temos no Brasil. Você vai nas favelas e encontra a mesma pobreza, as mesmas necessidades. Eles não estão tão longe assim da gente.
Manoela Roland, Ibase
Foi muito importante o Fórum ter sido realizado aqui no Quênia, por não ser a África do Sul, que não precisa do tipo de investimento, do tipo de olhar que o Quênia e outros países da África precisam. É um país que tem todos os problemas com os quais precisamos entrar em contato para romper com nossos preconceitos. Na verdade, aqui a gente tem um alcance maior do que é a desigualdade social, do que é a pobreza no mundo. A cidade tem cerca de 2 milhões de habitantes e quase 1 milhão vivem em condições sub-humanas, em Quibera, uma das maiores favelas do mundo. Ainda assim, eles conseguem criar suas relações de solidariedade, de sobrevivência. Eles nos trataram muito bem, foi uma recepção muito calorosa, sempre querendo mostrar que essa é a hospitalidade africana. O fato de estarmos aqui, além de ser importante para cada um em particular, é uma oportunidade de ter contato com a desigualdade e quebrar os nossos prenconceitos, enxergar de outra forma a situação do mundo, da qual a África é representativa. Para eles foi fundamental, para a África foi fundamental, devemos continuar nesse movimento.
Carmen Ferreira, Comissão Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Contag e CUT Nacional
Os aspectos positivos da minha vinda ao Quênia se articulam aos aspectos pessoais e emocionais, sou um ser inteiro. Nessa perspectiva, a vinda e o fato de o próprio Fórum ter sido realizado aqui reforça muito a idéia de solidariedade, da necessidade de mais solidariedade, de somarmos esforços entre as organizações para exercer essa verdadeira solidariedade com nossos irmãos africanos. Isso é fundamental, em todos os eventos que participei isso foi sinalizado, que é preciso somar essa solidariedade. É um aprendizado enorme tudo o que estou vivendo aqui, sinto-me voltando às minhas raízes, sinto como se estivesse fazendo uma viagem de regressão das minhas vidas passadas ao chegar aqui na África.
Analba Brazão, Coletivo Leila Diniz e Articulação de Mulheres Brasileiras
O que acho mais positivo aqui no Quênia é a possibilidade de estar trocando, de conhecer a realidade das pessoas que moram aqui, principalmente a situação das mulheres. Tive uma ótima impressão, desde a minha chegada no aeroporto, de como as pessoas são agradáveis, de como elas tentam nos informar, mesmo sem entender a nossa língua. Elas são muito sociáveis, isso tem me encantado muito.
Luciano Cerqueira, pesquisador do Ibase
Foi muito bom conhecer o Quênia, pois pudemos perceber de onde vem a hospitalidade do povo brasileiro, vem da África, com certeza. O povo é muito hospitaleiro e alegre, apesar das adversidades que enfrenta. Na casa onde estou instalado, me sinto em casa, eles me tratam como a um filho e os sinto como minha própria família. As pessoas nas ruas também são muito educadas e solícitas, faz lembrar realmente o Brasil, a gente vive numa dificuldade muito grande, mas não perde a alegria nem a esperança. Como qualquer grande capital do mundo, Nairóbi tem lugares perigosos, mas, no geral, é uma cidade segura. Não é aquela violência generalizada que muitos passam, é um lugar muito agradável de se estar.
Fernanda Carvalho, coordenadora do Ibase
A melhor coisa que encontrei foi o povo queniano. São pessoas muito simpáticas, com imensa vontade de ajudar, sempre sorrindo. Apesar de viver na pobreza extrema, que é a realidade deles, são sempre alegres, estão sempre querendo fazer amizades, especialmente com brasileiros. Uma coisa que pensei que haveria aqui, e não há, é uma elite branca, a elite também é negra, ao contrário dos outros países, isso foi uma surpresa.
Edinaldo Severiano de Oliveira Filho, TerrAzul e integrante do Fórum Brasileiro de ONGs para o Meio Ambiente e Sustentabilidade
O clima aqui é muito bom, as pessoas que conheci são fantásticas. O país tem um patrimônio natural fantástico bastante preservado. Vim com uma expectativa de sentir muito calor e não é assim, isso me impressionou muito.
Monica Santos, Agenda Social Rio
Pensei que fosse chegar aqui e encontrar muita gente faminta andando pelas ruas e vi que é diferente. Vi pessoas indo para o trabalho, vi também pessoas pedindo, como no Rio de Janeiro, mas achei que fosse encontrar muito mais miséria. Wallace da Conceição, Quilombo do Retiro do Espírito Santo
Um aspecto muito positivo foi poder entrar em contato com as pessoas que vivem em países dos meus ancestrais, onde nasceram meus bisavós, isso para mim foi gratificante, estou podendo conversar de igual para igual com eles, conhecendo o que eles passam e falando um pouco das minhas experiências. Não imaginava que era assim, ouvia falar do continente africano, mas não imaginava que um dia poderia vir aqui, é algo que só via pela TV, essa troca está sendo maravilhosa.
Tinha algumas informações erradas sobre o Quênia, de que tinha que andar aqui com medo. E depois de três dias, vi que não é assim. Avaliei isso como uma questão negativa, se fosse agir da forma como me passaram as informações, iria andar com medo, essas informações erradas poderiam nos fazer discriminar um companheiro nosso, um irmão. Estou me sentindo a vontade, em casa.
Jane Coutinho, Comunidade Quilombola de Aracatiba, ES
O que mais gostei foi o povo, tinha uma curiosidade muito grande de conhecer a África, conhecia apenas através dos livros e ouvia falar muitas histórias. Fiquei muito feliz. É claro que há uma visão muito negativa sobre a África, mas quando a gente chega, vê com outros olhos, percebe valores que transpõem em muito a parte negativa. Aqui tem um aspecto interessante em relação às mulheres, elas parecem submissas, só vestem roupas bem fechadas, mas se você perceber, o comércio está dominado por mulheres. Isso para mim, que lido com organização de mulheres, chama a atenção, é um avanço. Elas produzem, vendem, negociam. As informações que chegam sobre a África são aquelas de pobres, miseráveis. Não é assim como pintaram.
Glória Cristina dos Santos, Associação de Catadores do Aterro Metropolitano do Jardim Gramacho, RJ
O que gostei mais no Quênia foi o povo, esta é a minha primeira viagem ao exterior, mas vim para um país que é negro, foi a primeira vez que me senti fazendo parte do todo, e não sendo exceção. Estou aqui, entro em todos os lugares e não tenho aquela sensação do Rio de Janeiro de ser observada pelas outras pessoas, isso foi muito bom. Se eu soubesse falar inglês, acho que moraria aqui. Antes de chegar, toda vez que se falava em África, a primeira coisa que vinha na minha cabeça eram crianças trocando tiros, todo mundo armado, e não é nada disso.
Itamar Silva, coordenador do Ibase
A gente tem um certo mito em relação à Àfrica, são muitas expectativas, mas, na verdade, a gente não conhece nada da Àfrica. A gente acha que é tudo igual, que veio recuperar as nossas origens, mas estamos muito distantes da Àfrica real. Vir ao Quênia é botar o pé em um continente que precisa desse diálogo com o mundo, que precisa dessa aproximação, dessa força. E a gente também pode aprender com a resistência que eles estão tendo ao longo dos tempos. Para mim, foi fundamental ter essa dose de realidade, quebrar uma série de preconceitos e de idealizações, ver um pouco tanto a força como o drama, os limites desse continente. Para eles também está sendo importante, tem uma energia que sentimos, uma alegria em estar recebendo, de estar sendo o espaço de realização de uma atividade tão importante como o Fórum Social Mundial.
Leonardo Mello, coordenador do Ibase
Meu sentimento com relação ao Quênia é muito positivo, sempre fui bem tratado aqui. Antes que as pessoas pensem que viemos a um país só de negros e sofremos racismo, digo que não senti nada de ruim, só senti muita cortesia. Em todos os lugares onde estive, me aproximando de outras pessoas para pedir informações, a atenção foi perfeita. É quase uma vergonha, sei que se eles visitassem o Brasil, sentiriam esse preconceito. Fui muito mais bem-tratado do que sei que eles seriam se no Brasil estivessem.
Como estou fazendo a pesquisa do FSM, estou lidando com cerca de 60 jovens todos os dias, e eles são absolutamente educados, não estava esperando que fossem mal-educados, mas eles são muito corteses, prestativos, todos perceberam a importância política de ajudar na pesquisa e se sentiram parte do esforço de mostrar para o mundo um outro Quênia.
É a primeira vez que venho a um país de negros, já fui à Àfrica do Sul, mas lá existem muitas pessoas brancas. É um país de negros, onde a regra é ser negro, as propagandas todas são com pessoas negras. Adorei estar em um lugar em que não sou tratado especialmente diferente, positivamente, por ser como sou. Aqui, posso até ser especialmente bem-tratado por ser estrangeiro, mas em hipótese nenhuma por ser um homem branco.
Cleonice Dias, Comitê Comunitário da Cidade de Deus, RJ
A primeira vista, é um país onde a maioria é negra e, como sou branca, passo a ser minoria absoluta, isso traz uma sensação muito interessante. Tem também a alegria de ver negros nas mais diversas posições de direção, de coordenação, de mando. Isso causa um impacto. A outra coisa é a hospitalidade com relação ao povo brasileiro, como eles acolhem, como eles celebram, embora a visão ainda seja muito vinculada ao futebol e ao samba. Mas eles tratam muito bem o povo brasileiro. Depois, tem a beleza das pessoas, são todos muito lindos, e a grandeza do país, as casas são imensas no espaço onde estamos, e há também a questão do acolhimento, somos irmãos, com certeza.
Tinha informações erradas sobre o Quênia, ainda vislumbrava um Quênia muito tribal e, chegando aqui, observo que é um país que ainda não está com todos os vícios do capitalismo. Acho que a gente pode refletir muito e contribuir para que a África não passe pelo que nós passamos no Brasil, onde temos muitos excluídos.
Taciana Gouveia, Abong e SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia
Vir ao Quênia é muito positivo e o mais legal aqui é perceber o que é diferente e o que é parecido, mas acho que vi mais coisas parecidas do que coisas diferentes. Andar em um táxi que não tem taxímetro é muito parecido com pegar um táxi em Sobral ou Ouricuri. Claro que é uma cidade pobre, é um país pobre, mas não é uma pobreza exótica, é meio Titãs (miséria, miséria, em qualquer canto). Vi mais similaridades do que uma grande distância, esse foi o aspecto mais positivo.
Antes de chegar aqui, esperava ver uma religiosidade mais na matriz africana e me espantou muito a força das igrejas cristãs, especialmente as protestantes. Isso não é para o bem nem para o mal, apenas foi uma surpresa, algo que não imaginava. Essa África tão cristã realmente me surpreendeu.
Luzmere Demoner, coordenadora do Ibase
Fiquei muito surpresa com a recepção do povo daqui, desde as pessoas mais humildes até as em melhores situações, todas elas recebem muito bem. Em termos de infra-estrutura da cidade, não é bom, mas isso faz parte das dificuldades do país, não foi surpresa. O que lembro muito do Quênia tem a ver com os corredores, os maratonistas, fiquei muito entusiasmada de chegar aqui e encontrar um espaço muito grande para corrida, e isso eu não vi.
Moema Miranda, Ibase
Aqui há uma lógica de articulação muito vinculada a tribos, isso para a gente é muito diferente. Ao mesmo tempo, há uma luta forte por liberdade que dá para sentir nas pessoas, uma luta por resistência, é uma história de luta anticolonial recente, o que deixa marcada essa estrutura. Eles conectaram a tradição com a luta pela libertação, isso é muito legal e na América Latina só começamos a fazer isso agora, com os movimentos indígenas. Tive muitas surpresas aqui, a própria questão tribal, as diferenças internas, há a África de língua francesa, de língua inglesa, de língua portuguesa. Outro ponto surpreendente aqui é o movimento feminista e as bandeiras das mulheres que são muito mais no chão, muito mais terra.
Adhemar Mineiro, Dieese
Conhecia outros países da África, África do Sul e Moçambique. Percebo que o Quênia está em uma situação intermediária entre os dois, não é tão rico e organizado quanto a África do Sul nem é tão pobre e sem infra-estrutura como Moçambique. A recepção foi boa, é um país que funciona e foi possível fazer o Fórum aqui. Uma coisa que me surpreendeu foi o clima. Esperava que fosse mais quente e, na verdade, a maior parte do tempo tivemos um clima bem ameno, tipo de montanha, e fora do sol chega a fazer frio. O centro da cidade é muito organizado e não há muitos problemas para sair à noite, fora o custo, encontramos táxis com facilidade, é possível se deslocar a pé sem muitos problemas, o que é bem diferente da África do Sul, por exemplo, que tem um problema de segurança muito grave.
Dulce Pandolfi, Ibase
Não conhecia a África, para mim foi uma experiência muito interessante e rica poder conhecer a cultura de outro continente, estou muito feliz. Nairóbi é uma cidade que me surpreendeu muito, tinha notícias mais negativas, claro que é uma cidade pobre, que vive um contraste social grande, mas também temos isso no Brasil. Fomos muito bem-recebidos aqui, as poucas pessoas com as quais tive contato me receberam de braços abertos. Uma decisão muito boa foi termos optado pelo sistema de homestay, em vez de ficarmos em hotéis. Além do Fórum em si, esse foi o ponto alto da viagem, com a estadia em casas pudemos ter uma experiência excelente com as famílias locais, não teria como sair daqui com a visão que tenho hoje sobre o Quênia se tivesse ficado em um hotel.
Tive uma surpresa boa, não só do ponto de vista da estrutura, que é precária, mas melhor do que imaginava, como do ponto de vista da violência, da segurança. Não vi nada que tenha me impactado, me impressionado, nós moramos no Rio de Janeiro que é uma cidade muito violenta, não consegui perceber nada mais sério. Outros detalhes que as pessoas haviam falado, sobre insetos, pernilongos, as condições de sobrevivência, problemas com a água etc não se confirmaram. Sobrevivi muito bem aqui, essa experiência foi uma lição de vida para todo mundo que veio. Não deixa de ser interessante estar em um país em que a população é toda negra, onde pessoas brancas são minoria, e a gente percebe hábitos diferentes, desde a maneira de comer à maneira de se relacionar, de fato é uma outra cultura, foi uma experiência riquíssima, estou muito contente.
Nahyda Franca, Ibase
Não sei se é o Quênia necessariamente, mas a África mexe com a gente. O povo africano, e o queniano, que está aqui pertinho, têm uma postura tão altiva, eu me emociono sempre que falo deles. A gente se vê nessa gente, as nossas danças, as nossas músicas, o jeito de eles sambarem. Uma coisa que me impressiona muito é a educação deles, fomos muito bem tratados, desde os diferentes motoristas com os quais lidamos, os garçons, atendentes, são pessoas com uma dignidade muito forte e uma energia de vida densa, isso transparece o tempo todo. A questão da alegria e do bom humor deles é algo que também temos muito no Brasil, essa identidade toda mexe muito com a gente. Percebi também nas manifestações culturais durante o Fórum uma espiritualidade muito forte, sentia o tempo todo uma energia muito presente de origem, de raíz, isso é o que mais impressiona.
Chegamos aqui muito assustados com a questão de roubo e violência sexual, mas não tenho me sentido insegura aqui, isso para mim foi uma surpresa. Sinto-me muito bem, em nenhum momento fui ameaçada ou discriminada. Estou, é obvio, numa situação que nunca vivi antes, sentindo-me como minoria absoluta por todos os lugares onde passo como pessoa branca. Mas isso não significou nenhuma situação constrangedora ou de discriminação.
Antônia Rodrigues, Ibase
Primeiro, eu destaco a boa disposição e a solidariedade do povo queniano em nos ajudar, em passar informações, em querer conversar conosco, em nos atender. Tínhamos uma idéia negativa de que aqui era muito violento e de que tudo seria difícil e não é assim. Também vale ressaltar o fato de o Comitê Social Africano ter conseguido uma infra-estrutura muito boa para a realização do VII FSM aqui no Estádio Casarani. Tinha uma idéia errada, que é até engraçada : associava o Quênia a animais, mais ou menos como os estrangeiros associam o Brasil aos índios, e não é assim. Outro ponto é que a imagem que a TV passa do povo queniano tem a ver com as corridas, e, chegando aqui, descobri que eles caminham muito.
Telia Negrão, Rede Feminista de Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos
É a segunda vez que venho no Quênia e fiquei bastante impactada pela realidade encontrada. Mas, por outro lado, a gente percebe um empenho muito grande de cada pessoa, o esforço coletivo para viabilizar este Fórum e para nos facilitar tudo no nosso dia-a-dia aqui. O sentimento de estar sendo acolhida, recebida por um país na Àfrica, é muito bom. A gente sabe a importância que Nairóbi tem para a África, trata-se da segunda ou terceira principal cidade africana e nessa cidade, com todas as dificuldades, nos receberam maravilhosamente bem. Trata-se de uma cidade com grande importância política. Mas tivemos que quebrar barreiras para estar aqui, tanto físicas como no campo dos mitos e de todas as coisas que imaginávamos. Passar pela África significa quebrar paradígmas, pensar diferente o mundo.
Salete Valesan, Instituto Paulo Freire, membro do Conselho Internacional do FSM e do Grupo Facilitador Brasileiro do FSM
Sempre tive muita vontade de estar na África, meu desejo primeiro era visitar os países de língua portuguesa e quando surgiu a oportunidade de vir ao Quênia, com a dificuldade da língua, os costumes diferentes dos nossos, me deu uma certa preocupação. Mas isso mudou quando cheguei aqui. Estou hospedada na casa de uma família queniana que mantém os costumes e a cultura tradicionais. Percebi que muito do que essa família vive, as famílias brasileiras que têm descendência africana no Brasil também conservam: a questão da religiosidade, da alimentação em família, do cuidado com as coisas da casa e com a família. O que achei mais interessante em um primeiro momento foi que pensei que encontraríamos muito preconceito em relação ao fato de que as pessoas aqui são negras e nós brancos, latino-americanos, alguns descendentes de europeus. Estamos vivendo aqui nesse espaço, nesse local e está sendo uma convivência muito boa, o cuidado que eles têm conosco é muito grande e a interação dos costumes está se dando de maneira muito natural. Gostei muito de estar aqui, quem vem aqui não volta da mesma forma, aqui derrubamos uma série de preconceitos raciais e de classe.
João Sucupira, Ibase
Todo Fórum é um momento marcante em termos de crescimento pessoal. Ficar na casa de uma família africana foi uma experiência incrível. Não sabia que na África as pessoas eram tão alegres, mesmo em Quibera, as pessoas passam uma noção de felicidade, de tranquilidade no olhar, elas são muito receptivas e isso me impressionou muito.Também não sabia que a questão religiosa aqui é tão forte, a religião cristã é muito forte. Fiquei hospedado em um lugar elitizado, pude ver uma diferença social tão grande como acontece no Brasil.