Fonte: Brasil de Fato, por Sally Burch, de Nairóbi (Quênia)
Muitas pessoas consideram que tais políticas, adotadas pelo comitê organizador local, – não obstante dissidências internas -, apontam para a conveniência de definir critérios mais claros para que a realização dos fóruns seja conseqüente com os princípios de participação popular, manejo ecológico e economia solidária, que são parte das propostas identificadas com este processo; sem que implique numa carga financeira insuportável para quem o organizam.
O 7º Fórum Social Mundial fechou seu terceiro dia de atividades terça-feira (dia 23), no estádio de Kasarani, nos arredores de Nairóbi, Quênia, onde cerca de 50 mil participantes estão reunidos. O ambiente do lugar vibra com as festivas manifestações – africanas e internacionais -, que marcham em círculo ao redor do estádio, ao ritmo de música, danças e lemas.
Ainda é cedo para poder fazer um balanço, mas os intercâmbios de impressões permitem desenhar um esboço de algumas das facetas mais destacadas do Fórum. Entre os principais acertos desta sétima edição, se destaca a presença africana, em número muito maior que em fóruns anteriores, e a evidente expectativa das organizações africanas de poder socializar suas lutas e, ao mesmo tempo, conhecer as de outros continentes. O fato de as organizações populares do país sede lutarem para entrar sem pagar evidencia que o FSM tem gerado expectativa e esperanças.
Ainda assim, muitos participantes lamentam que a presença de organizações quenianas tem sido menos numerosas do que tinham esperado. Para Geraldo Fontes, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Brasil (MST), o custo da entrada não tem sido o único fator. “Faltou um maior trabalho de mobilização e preparação prévia com as organizações do país”, afirma.
Por outro lado, chama a atenção a forte presença das igrejas africanas (católica e protestantes), que têm mobilizado grandes delegações, muitas delas com sua própria agenda de temas e atividades, mas pouca participação e intercâmbio em outros espaços.
Debate e reflexão
Em determinados momentos, os encontros têm-se dado em termos mais confrontantes, incluise entre africanos, como certas expressões de homofobia ou anti-aborto, nos eventos sobre os direitos sexuais. Para Phumi Mtetwa, do Diálogo Sul-Sul Gays Lésbicas Bissexuais e Transexuais (GLBT), isso não é necessariamente negativo, pois obriga o debate e a reflexão sobre as respectivas interpretações da própria cultura.
De fato, em numerosos eventos, nota-se que o intercâmbio esperado com a África não se produz, com exceção, entre outros, dos espaços de movimentos mundiais, como a Vía Campesina ou a Marcha Mundial de Mulheres, que têm mobilizado suas bases principalmente desde o continente, com uma temática centrada na realidade africana.
“Talvez pode ser que o formato fórum seja uma idéia muito ocidentalizada -no sentido europeu-latino-americano-, que não coincide com a cultura política e social da África”, reconheceu Gonzalo Berrón, da Aliança Social Continental. Não obstante, ele saúda o fato de que fórum está permitindo fortalecer alianças Sul-Sul, em torno de temas concretos, como a luta contra o livre comércio e a Organização Mundial do Comércio (OMC), as transnacionais e a militarização.
A tenda do Fórum Social das Américas tem sido outro espaço que tem suscitado intercâmbios positivos, muitos deles espontâneamente. Nota-se o especial interesse desde os outros continentes do Sul, por conhecer mais sobre o processo de mudanças políticos na região e suas perspectivas.
Alto custo
Como nos últimos fóruns muito grandes, há frustrações pelos erros de programação, eventos cancelados ou alterados sem aviso, ou que se realizam em condições difíceis. Mas o que tem gerado protestos é o alto custo das entradas e das refeições, inacessível para a população pobre do Quênia. O preço de entrada de 500 shillings para os quenianos – mais de US$7, equivalente a um salário mínimo semanal-, tem desatado cada dia protestos e incluive entradas massivas, sem pagar, desde os bairros pobres da cidade, que contam com a simpatia dos demais participantes. O mesmo ocorre com as refeições, que, a 300 shillings, estão fora do alcance de muitas pessoas. A estas críticas se somam a terciarização da maioria dos serviços a empresas comerciais, sem levar em conta o comércio justo, ou imponndo um preço de piso fora do alcance dos pequenos vendedores.
Muitas pessoas consideram que tais políticas, adotadas pelo comitê organizador local, – não obstante dissidências internas -, apontam para a conveniência de definir critérios mais claros para que a realização dos fóruns seja conseqüente com os princípios de participação popular, manejo ecológico e economia solidária, que são parte das propostas identificadas com este processo; sem que implique numa carga financeira insuportável para quem o organizam.