Fonte: www.globo.com

Justa Trama e Cooperativa de Psicólogos, de São Paulo, foram apresentadas em programa jornalístico na noite de 28 de julho. O programa abordou as alternativas frente ao crescente desemprego, tendo como tema “A vida sem patrão”. Um dos blocos do programa foi dedicado às cooperativas. Acompanhe o texto da reportagem e assista ao vídeo.

Era uma vez um casal: Cris e Egeu. Eles se conheceram ainda estudantes, na Universidade de São Paulo. Psicólogos, formaram, com os amigos, uma cooperativa. O meio mais fácil para dividir despesas e buscar clientes. Na mesma época, começava uma história de amor.

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“A grande vantagem de se trabalhar em cooperativa é poder contar com o coletivo”, fala Egeu, enquanto o filho deles, Ernesto, de 15 dias chora.

Cris está de licença maternidade. Em cooperativa, os trabalhadores também podem ter seus direitos.

“Desde que tenha isso tudo de maneira regular, situação fiscal e tal, administrativa da cooperativa, isso é possível. Outros benefícios são possíveis desde que o grupo se organize. Por exemplo, férias não é algo que se tem de antemão, mas se o grupo se organiza e faz um fundo coletivo é possível ter férias no fim do ano”, explica a psicóloga Cris Fernandez Andrada.

Pais cheios de orgulho! Com o filho no colo, Egeu fala sobre cooperativas com a experiência de quem fez uma longa pesquisa. Assunto de mestrado e doutorado.

“O cooperado ao mesmo tempo não é nem o empregado, nem é dono. É difícil um cooperado que fala: vou para a minha cooperativa. O cooperado fala: eu faço parte de uma cooperativa. Ele, sozinho, não consegue muita coisa”, diz Egeu Gomez Estevez.

Cris também é especialista no assunto. Ela estudou a cooperativa de costureiras Unidas Venceremos, a Univens, em Porto Alegre. Um exemplo de união que deu certo. Com a tese no colo, ela se recorda com muito carinho de tudo que viu e ouviu durante a pesquisa. Nas entrevistas, uma palavra sempre se repetia.

“Aparecia sonho toda hora: sonho, projeto. A faixa em cima do terreno anunciava: Cooperativa Univens, breve aqui a construção de um sonho”, conta Cris.

O sonho se transformou numa fábrica. Mulheres de fibra, que conseguiram moldar um futuro de estabilidade financeira e sucesso profissional.

“Foi na fábrica que nós conhecemos a Nelsa. Na cooperativa, ela descobriu uma satisfação que nunca teve enquanto foi operária de fábrica”, diz Cris.

“As decisões são tomadas de forma coletiva, a forma de produção também é discutida entre todos e melhor que tudo: a forma de receber é justa e solidária e refletida entre todos”, diz a costureira Nelsa Inês Fabian Nespolo.

Mas como funciona, na prática, uma cooperativa? Estas costureiras trabalhavam em casa, sozinhas, e não tinham muita chance. Juntas, descobriram que poderiam vender para hospitais, comerciantes e lojas. O investimento maior foi o trabalho. O dinheiro ganho é dividido por todas, conforme a produção de cada uma.

Controle? Basta anotar tudo numa caderneta. E acredite: o sistema funciona. Hoje elas ganham mais do que na época em que trabalhavam sozinhas. Há mês em que a renda chega a R$ 1 mil. E elas estão felizes da vida.

“Nos estudos que existem sobre felicidade e bem-estar, um dos grandes elementos de qualidade de vida é estar com outras pessoas. Ou seja, ser capaz de executar os seus planos, não sozinho, mas com a sua família, amigos, vizinhos. Unir forças é um passo importante para quem não tem o capital diz o professor de Economia da UFRGS Flávio Comim.

E a história destas mulheres foi mais longe. Elas descobriram que poderiam se juntar a outros brasileiros sem emprego. Estava formada uma cadeia de cooperativas que atravessa o Brasil. A união deu coragem a essas mulheres. Com criatividade, empenho e dedicação, elas conseguiram fazer a flor do algodão dar frutos.

O algodão vem de longe. É cultivado sem agrotóxicos e colhido por mãos calejadas dos agricultores familiares do interior do Ceará. E a partir daí, começa uma longa viagem, que nós acompanhamos.

Em Nova Odessa, interior de São Paulo as máquinas da cooperativa de fiação transformam a pluma em linha.

E é só seguir o fio da meada para chegar até Santo André, região metropolitana de São Paulo. Lá, a união dos trabalhadores ganha a forma dos primeiros tecidos.

Em Santa Catarina, mãos habilidosas trançam e entrelaçam as linhas. O puro algodão vira artesanato.

As sementes que enfeitam as roupas são cultivadas em Rondônia. Mais um trabalho de transformação e criatividade. Obra dos artesãos da Amazônia.

Essa imensa colcha de retalhos foi alinhavando a história de muitos brasileiros. As cooperativas ajudaram a tecer alternativas de trabalho para mais de 700 pessoas de norte a sul do país.

Em todos os elos dessa corrente, homens e mulheres aprenderam a trabalhar sem patrão, a dividir responsabilidades e vitórias, sem intermediários.

“Parece que a gente também está mudando um pouco do mundo”, orgulha-se Nelsa.

E também estão escrevendo a história de cada uma delas.

“Hoje me sinto muito mais valorizada”, diz Terezinha da Silva Maciel.

Para Terezinha, Nelsa e para todas as trabalhadoras a vida sem emprego está muito melhor!

“Não ser nem empregado, nem patrão. Tem liberdade com responsabilidade. Faz toda a diferença. Não gostaria de voltar a ser empregada. Tenho o maior orgulho de trabalhar na cooperativa, quero continuar. De repente, meus filhos podem querer trabalhar aqui um dia. É uma coisa que a gente constrói não só para nós, mas para o futuro”, conta a costureira Terezinha.