Fonte: Correio UNICAFES, Nº 05

Uma proposta conjunta deve ser apresentada em janeiro para votação no Senado

Deputados e senadores devem voltar ao Congresso Nacional só em 16 de janeiro, mas nos bastidores de Brasília, o debate sobre a lei geral do cooperativismo não cessa. Parlamentares, governo federal e líderes das organizações ligadas às cooperativas dos vários segmentos têm avançado no debate sobre o parecer favorável do senador Demóstenes Torres (PFL-GO) ao Projeto de Lei 171/99 (PL 171), de autoria do Senador Osmar Dias (PDT-PR). No final de dezembro, ocorreram quatro reuniões para tratar do tema.

Durante a última sessão da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado, em 14 de dezembro, os senadores determinaram que o parecer fosse votado ou na convocação extraordinária da casa ou na primeira reunião da Comissão, em fevereiro. Contudo, criaram um grupo de trabalho para trabalhar na questão e propor alterações no PL 171, que contemplassem todos os segmentos do cooperativismo brasileiro. No grupo de trabalho, estão os membros da Comissão, além do senador Eduardo Suplicy – autor de outro projeto de lei para o cooperativismo -, representantes dos Ministérios do Trabalho, Agricultura e Desenvolvimento Agrário, da Unicafes e da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). Esse grupo deverá construir propostas de emendas consensuais ao projeto, considerado pelo presidente da Unicafes, José Paulo Crisóstomo, e diversas entidades correlatas como desconexo com a realidade atual e com o código civil. “Já em 1971, quando a lei das cooperativas foi criada, não havia a diversidade que existe hoje. Não havia política específica e nenhuma ação voltada para a agricultura familiar. Isso não pode ser ignorado”, destaca Crisóstomo.

Para discutir os pontos divergentes do projeto, sendo os principais deles a representação e o registro das cooperativas, uma equipe formada por diversas entidades representativas da área se reuniu em Brasília na segunda-feira, 19. Estavam presentes a Unicafes, Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab), Unisol – Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários, Confederação Nacional de Trabalhadores da Agricultura (Contag), Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) e a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP), da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Dessa reunião saiu uma proposta de entendimento com a OCB, que recebeu um grupo formado pelas mesmas organizações, na terça-feira, 20. No dia seguinte, outras duas reuniões fecharam a rodada de debates; uma com o núcleo agrário da Câmara e outra com o Governo Federal.

Polêmica

O tema que norteava as primeiras conversas – a unicidade – parece estar superado. A unicidade está ligada a idéia de que as cooperativas sejam representadas por apenas um órgão oficial, que no projeto de Osmar Dias, seria a OCB. Para o secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho, Paul Singer, a unicidade não deve ser imposta pela lei. Os cooperados devem ter o direito a livre filiação. “Todas as filiadas devem se sentir representadas pela organização e isso não ocorre atualmente, por conta da diversidade”, afirma Paul Singer. Após as argumentações contrárias, chegou-se a um entendimento e o ponto deverá ser alterado no texto da 171.

Outra polêmica diz respeito ao registro e controle das cooperativas. A divergência tem resistido até mesmo dentro do governo, onde o Ministério da Agricultura defende que a OCB fique responsável pelo registro, fiscalização e a certificação de cooperativas, enquanto que o Ministério do Trabalho pretende criar um conselho formado por diversos segmentos para executar as tarefas. Quanto a este ponto, a discussão ainda não está esgotada. Além das citadas, outras questões ainda estão pendentes e deverão ser ajustadas, trais como o fomento ao cooperativismo e a admissão de pessoas jurídicas.

Nas reuniões ficou decidido que os assessores jurídicos da Unicafes e da OCB elaborarão uma proposta de alteração ao PL 171 e apresentarão essa proposta às lideranças das entidades interessadas ainda na primeira quinzena de janeiro. O projeto será debatido e a redação final será levada para a comissão do Senado, antes da votação.

Lei ultrapassada

Segundo um dos assessores jurídicos da Unicafes, Arni Hall, “a estruturação de uma nova Lei para o Cooperativismo, decorre da necessidade de se trazer para um texto infraconstitucional (lei ordinária), por um lado, as garantias asseguradas na Constituição de 1988 (princípios de liberdade de organização e não interferência do Estado) e por outro, incorporar à lei as novas experiências cooperativas oriundas de uma sociedade múltipla, autônoma e emancipacionista, que emerge do contexto de empoderamento social vivido no Brasil nas últimas décadas”. Por conta da realidade, não se pode apenas reescrever a Lei 5764/71, para dar aos legalistas o argumento da posterioridade em relação à Constituição Federal, já que aquela lei não foi recepcionada por esta em vários aspectos. A Constituição de 1988 criou novos marcos que não podem ser revistos por simples texto lei ordinária, sob pena de manifesta inconstitucionalidade. Há de se observar ainda, os marcos regulatórios já inscritos no Código Civil, que em parte já regulam as sociedades cooperativas.