Por Serge Goulart – Membro do Conselho Unificado dos Trabalhadores da Cipla e Interfibra

A luta para salvar 1.070 empregos

Duas das maiores indústrias de Joinville (principal cidade do estado de Santa Catarina, Brasil), a Cipla S/A e a Interfibra S/A, estão hoje sob controle dos trabalhadores, que lutam para salvar os 1.000 postos de trabalho, receber os salários em dia e resgatar as dívidas trabalhistas e previdenciárias. Para isto, em uma Carta à Lula, que já tem mais de 50.000 assinaturas, propõem que o governo assuma as duas empresas. A luta pela estatização já foi reafirmada em várias assembléias dos trabalhadores. Numa época em que todos os governantes e muitos sindicalistas falam em “economia solidária”, a autogestão, ou a cooperativa, é apontada como a solução para salvar os empregos. O problema é que isto não salva emprego e ainda desagrega a luta e a organização dos trabalhadores. Somente a estatização dá uma verdadeira perspectiva para os trabalhadores.

Por que não aceitamos a cooperativa?

A cooperativa é um acordo entre os trabalhadores, que se apossam dos meios de produção (máquinas, planta da fábrica, ferramentas, etc) frente à ameaça de fechamento de uma empresa e passam a produzir. Assim, estarão regidos pela lei das cooperativas, que não estabelece vínculos trabalhistas, ou seja, não há encargos sociais e nenhum direito previstos. Ao criarem uma cooperativa, os trabalhadores assumem a responsabilidade pelos passivos da empresa, quaisquer que sejam: bancos, fornecedores, acionistas, etc. Ou seja, os trabalhadores passam a ser sócios-proprietários de uma nova empresa onde os explorados são eles próprios. As cooperativas mais organizadas, se conseguem sobreviver, chegam a separar parcela dos lucros para pagar bônus como se fossem 13º salário, férias, etc. Mas a questão central é a mesma que põe as empresas em crise no sistema capitalista. No capitalismo, empresas quebram e desaparecem todos os dias frente à concorrência ou à força dos monopólios das multinacionais. Para evitar a quebradeira, deve-se abaixar o custo da produção ou aumentar a produtividade. Os dois caminhos levam ao famoso “enxugamento”. A economia capitalista obriga as empresas a aumentar sempre o investimento em automação, em novas máquinas e ferramentas, a fazer “reengenharia da produção” buscando maior produtividade, etc. Isso provoca a “sobra” de operários e a necessidade de se “enxugar o quadro”, através de algum tipo de demissão incentivada. O resultado desta lógica infernal é que uma parte dos trabalhadores acaba tendo que escolher qual colega será demitido. Logo, formam-se os grupos, as “panelinhas” que se articulam para demitir os outros. Isto inclui a eleição dos dirigentes da cooperativa para preservar os membros do grupo, etc.

Cooperminas, um exemplo do desastre

Exemplo sempre apresentado pelos organizadores de cooperativas é a Cooperminas, mina de carvão de Criciúma que quando faliu, nos anos 80, tinha 1.400 mineiros. Na verdade a história é outra. O sindicato assumiu a massa falida e ela foi transformada em cooperativa. Somente 900 mineiros permaneceram no trabalho, ou seja, 500 foram “incentivados” a sair. Hoje, a Cooperminas ainda funciona, paga férias e 13º salário para, apenas, 500 mineiros. Seus membros agem como “sócios” ou “acionistas” de uma empresa, se revezando na constituição de grupos para disputarem o controle e assim garantirem os empregos e melhores salários. De fato, não restou muito da consciência de classe que tinham estes antigos mineiros, que nos anos 80 promoveram as primeiras greves gerais de Criciúma. Hoje suas preocupações são em relação às compras e vendas de carvão, aos contratos com outras empresas e ao lobby junto aos governantes. Nas eleições, apóiam os mais variados acordos com partidos burgueses. Desaparece a consciência da diferença entre patrão e movimento operário organizado.

Autogestão é um beco sem saída

A cooperativa é um dos tipos da chamada Autogestão. Existem outros. Os trabalhadores podem assumir as ações da empresa tornando-se acionistas, proprietários. Em geral, carregando junto o ativo e o passivo (dívidas) da empresa. O operário vira patrão. Pelo menos enquanto durar a luta da empresa por se manter no mercado capitalista, sem esquecer de que todo dia se agrava a situação das empresas na disputa por um mercado controlado e pressionado pelo capital financeiro especulativo.

Responsáveis pela crise são os governos e os capitalistas

Assim, frente à falência das empresas e à ameaça de desaparecimento dos postos de trabalho, a única perspectiva realista que sobra é o controle operário da produção, abertura dos livros (controle administrativo e financeiro) e a luta pela estatização das empresas. É a única alternativa que permite manter em primeiro plano a luta para salvar TODOS os empregos dos trabalhadores da fábrica, responsabilizando em última instância o capitalismo e seu Estado pela crise. Numa economia esmagada pelo capital financeiro especulativo não há saída para as empresas cooperativadas ou autogestionárias. A disputa pelo mercado, a pressão pela produtividade, pelas “vantagens comparativas”, empurram inexoravelmente toda a economia capitalista para o abismo. E a especulação financeira joga aí um papel de acelerador, conduzindo todas as empresas ao ataque maciço para rebaixar o “Custo do Trabalho”. Nenhuma Cooperativa ou Autogestão pode fugir disso. Estas tentativas terminam por transformar os operários em carrascos de si mesmos. E o pior, e mais grave, retiram deles a perspectiva de combate da classe trabalhadora contra a classe capitalista para terminar com toda opressão e exploração sobre a humanidade. As cooperativas ou empresas autogeridas são levadas pela lógica da economia a buscar mercados, a competir, a combater e destruir as outras fábricas concorrentes, ou seja, destruir postos de trabalho de seus próprios imãos. Afastar-se do eixo da luta pela estatização é inevitavelmente cair na vala reacionária da autogestão ou cooperativa. Acabar na paralisia mais absoluta. Em nenhum destes casos se pode vencer. A luta pela estatização é a única perspectiva, duríssima, dificil, mas que pode salvar os 1.000 postos de trabalho da Cipla e Interfibra.