Resgatando a história do Fórum Brasileiro de Economia Solidária
O Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) está organizado em todo o país em mais de 160 fóruns municipais, microrregionais e estaduais, envolvendo diretamente mais de 3.000 empreendimentos de economia solidária, 500 entidades de assessoria, 12 governos estaduais e 200 municípios pela Rede de Gestores de Políticas Públicas de Economia Solidária.
O FBES é fruto do processo histórico impulsionado no I Fórum Social Mundial (I FSM), que contou com a participação de 16 mil pessoas vindas de 117 países, entre os dias 25 e 30 de janeiro de 2001. Dentre as diversas oficinas, que promoviam debates e reflexões, 1.500 participantes acotovelaram-se na oficina denominada “Economia Popular Solidária e Autogestão” onde se discutiu auto-organização dos/as trabalhadores/as, políticas públicas e perspectivas econômicas e sociais de trabalho e renda.
A manifestação de interesses e a necessidade de articular a participação nacional e internacional do I FSM propiciaram a constituição do Grupo de Trabalho Brasileiro de Economia Solidária (GT Brasileiro), composto de redes e organizações de diversas práticas associativas do segmento popular solidário: rural, urbano, estudantes, igrejas, bases sindicais, universidades, práticas governamentais de políticas sociais, práticas de apoio ao crédito, redes de informação e vínculo às redes internacionais. As doze entidades e redes nacionais que em momentos e níveis diferentes participavam do GT-Brasileiro eram: Rede Brasileira de Socioeconomia Solidária (RBSES); Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS); Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (FASE); Associação Nacional dos Trabalhadores de Empresas em Autogestão (ANTEAG); Instituto Brasileiro de Análises Socioeconômicas (IBASE); Cáritas Brasileira; Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST/CONCRAB); Rede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (Rede ITCPs); Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS/CUT); UNITRABALHO; Associação Brasileira de Instituições de Micro-Crédito (ABICRED); e alguns gestores públicos que futuramente constituíram a Rede de Gestores de Políticas Públicas de Economia Solidária.
O GT Brasileiro buscou a unidade na diversidade, favorecendo a construção da identidade do campo da denominada “Economia Solidária”, graças à prática de respeitar as contribuições diversas de cada região e especificidades de suas organizações. E sabia que era necessário também investir na divulgação, caracterizar suas atividades e se constituir como uma articulação de dimensão nacional. Foi a partir deste grupo que se propôs a constituição de um fórum em dimensão nacional. Dessa forma, tanto a realização das plenárias quanto a elaboração dos Princípios da Economia Solidária foram decisivas para ampliar e caracterizar seu campo de ação. O movimento que vinha sendo articulado pelo GT Brasileiro era constituído principalmente por entidades de assessoria/ fomento e por um segmento de gestores públicos e apontava para a necessidade de combinar a ampliação regional com o investimento em empresas e empreendimentos de economia solidária. Faltava uma política pública nacional de Economia Solidária e um processo de enraizamento, constituído principalmente através de empreendimentos de economia solidária e empresas de autogestão nas diversas regiões do país.
No final de 2002, decorrente do processo eleitoral que culminou com a vitória do Governo Lula, o GT Brasileiro elaborou a Carta ao Governo Lula intitulada “Economia Solidária como Estratégia Política de Desenvolvimento”. Aquele documento de interlocução com o futuro governo apresentava as diretrizes gerais da Economia Solidária e reivindicava a criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES). A elaboração e aprovação da carta ocorreram durante a I Plenária Brasileira de Economia Solidária, realizada em São Paulo, nos dia 9 e 10 de dezembro de 2002, contando com mais de 200 pessoas.
A II Plenária, realizada durante o FSM de janeiro de 2003, em Porto Alegre, foi aberta pelo GT Brasileiro e presidida pelo professor Paul Singer. Neste evento, foi publicado e distribuído o livro: “Do Fórum Social Mundial ao Fórum Brasileiro de Economia Solidária” para as/os 800 participantes, constituídos principalmente por representantes de empreendimentos, entidades de fomento e redes internacionais. A Plenária definiu agenda de mobilização de debates e sensibilização pelas regiões do país e legitimou o GT-Brasileiro como promotor do processo.
Em junho de 2003 realizou-se a III Plenária Brasileira de Economia Solidária, que contou com um processo preparatório de mobilização em 17 estados, e teve a participação de 900 pessoas de diversas partes do país. Foi neste evento que foi criada, de forma definitiva, a denominação Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES). A SENAES foi constituída pouco antes deste evento. O FBES saiu desta III Plenária com a incumbência de articular e mobilizar as bases da Economia Solidária pelo país em torno da Carta de Princípios e da Plataforma de Lutas aprovadas naquela oportunidade. Além de se definir a composição e funcionamento do FBES, foi iniciado um processo de interlocução do FBES com a SENAES com o compromisso de promover um intercâmbio qualificado de interesses econômicos, sociais e políticos, numa perspectiva de superar práticas tradicionais de dependência, que tanto têm comprometido a autonomia necessária ao desenvolvimento das organizações sociais. O evento também desencadeou a criação dos fóruns estaduais e regionais que puderam garantir, por sua vez, a realização do I Encontro Nacional de Empreendimentos de Economia Solidária com trabalhadoras/es de todos os estados. Este encontro teve um total de 2500 pessoas e aconteceu entre os dias 13 e 15 de agosto de 2004.
Neste processo, a Economia Solidária foi desafiada a gerir abastecimento, comercialização, trabalhar com moeda social, promover rodadas de negócio, realizar feiras em todos os estados, fazer campanha de consumo consciente, comércio justo e solidário, constituir redes, cadeias produtivas, finanças solidárias, trabalhar no campo do marco legal (especialmente: lei geral do cooperativismo e cooperativa de trabalho).
Durante o III FSM, em Porto Alegre, realizou-se uma reunião de dezenas de representantes da América Latina, que promoveu a ampliação das perspectivas de integração regional do movimento de Economia Solidária e, com isso, o trabalho de articulação com a América Latina entrou definitivamente na agenda do FBES.
Em 2006, após a realização das conferências estaduais, quando foram escolhidos as/os delegadas/os e definidas as reivindicações e propostas, realizou-se a I Conferência Nacional de Economia Solidária, em Brasília, no período de 26 a 29 de junho. Na Conferência foram discutidas as resoluções voltadas à participação no Conselho Nacional de Economia Solidária e propostas para políticas públicas para a Economia Solidária.
Até a IV Plenária do FBES, em março de 2008, a representação nacional era composta por 16 entidades nacionais, de diferentes naturezas: de representação de empreendimentos (Abcred, Anteag, Concrab, Ecosol, Unicafes, Unisol Brasil); entidades e redes nacionais de assessoria, pesquisa e fomento (ADS/CUT, Cáritas Brasileira, FASE Nacional, Ibase, IMS, PACS, Rede ITCPs, Rede Unitrabalho); redes mistas (Rede Brasileira de Socioeconomia Solidária); e a Rede de Gestores de Políticas Públicas de Economia Solidária.
A Rede Nacional de Gestores de Políticas Públicas de Economia Solidária é uma articulação de gestores e gestoras de políticas de economia solidária de Prefeituras, Governos Estaduais e do Governo Federal que surgiu por iniciativa de gestores e gestoras de políticas públicas que participaram do processo de criação do FBES desde 2001, com a missão de ampliar cada vez mais o debate e a proposição de ferramentas adequadas dentro do Estado brasileiro para o fomento ao desenvolvimento da economia solidária, bem como estimular e fortalecer a organização e participação social deste segmento nas decisões sobre as políticas públicas.
A articulação e representação nacional se dava então através da Coordenação Nacional, com as 16 entidades e redes nacionais, além de 3 representantes de cada Fórum Estadual de Economia Solidária (FEES), sendo que 2 são trabalhadoras/es de empreendimentos (buscando contemplar o setor rural e o urbano) e 1 de entidade ou de rede de gestores.
Dessa forma, integram o FBES desde então os três segmentos do campo da Economia Solidária: empreendimentos da economia solidária, entidades de assessoria e/ou de fomento e gestores públicos.
- Empreendimentos Econômicos Solidários são organizações com as seguintes características: 1) Coletivas (organizações suprafamiliares, singulares e complexas, tais como associações, cooperativas, empresas autogestionárias, clubes de trocas, redes, grupos produtivos, etc.); 2) Seus participantes ou sócias/os são trabalhadoras/es dos meios urbano e/ou rural que exercem coletivamente a gestão das atividades, assim como a alocação dos resultados; 3) São organizações permanentes, incluindo os empreendimentos que estão em funcionamento e os que estão em processo de implantação, com grupo de participantes constituído e atividades econômicas definidas; 4) Podem ter ou não registro legal, prevalecendo a existência real; 5) Realizam atividades econômicas que podem ser de produção de bens, prestação de serviços, de crédito (ou seja, de finanças solidárias), de comercialização e de consumo solidário;
- Entidades de assessoria e/ou fomento são organizações que desenvolvem ações nas várias modalidades de apoio direto junto aos empreendimentos solidários, tais como: capacitação, assessoria, incubação, pesquisa, acompanhamento, fomento a crédito, assistência técnica e organizativa;
- Gestores públicos são aqueles que elaboram, executam, implementam e/ou coordenam políticas de economia solidária de prefeituras e governos estaduais.
Neste período de apenas alguns anos de vida do FBES, vimos um expressivo crescimento da Economia Solidária e de sua organização. Se em 2002 a organicidade da Economia Solidária se manifestava em apenas cinco estados, em 2003 as plenárias estaduais foram realizadas em 17 estados. A partir de 2006, os Fóruns Estaduais estavam presentes nos 27 estados do Brasil. O crescimento também tem promovido articulações e intercâmbios internacionais, especialmente com América Latina na Rede Intercontinental para a Promoção da Economia Solidária (RIPESS). Contudo, os avanços e a institucionalização, especialmente, através da criação da SENAES e do Conselho Nacional, requereram uma definição cada vez maior do papel político e estratégico do FBES na luta e construção de um projeto de sociedade.
Caracterizar e identificar o FBES foram ações prioritárias no sentido de demarcar e qualificar o campo da denominada Economia Solidária, através do Mapeamento da Economia Solidária e da elaboração do Atlas da Economia Solidária no Brasil, frutos de uma política de integração do movimento da ES com o governo (Ministério do Trabalho e Emprego, através da SENAES). Numa breve avaliação deste processo de constituição, pode-se dizer que o movimento de Economia Solidária alcançou, em parte, o reconhecimento, a visibilidade e a legitimidade necessária.
A partir de 2006, iniciou-se o processo de mobilização rumo à IV Plenária Nacional de Economia Solidária, objetivando a reestruturação do FBES, partindo de encontros estaduais, depois com encontros regionais cujo tema era “Por um novo modelo de organização da Economia Solidária”. A sistematização dos resultados obtidos desta primeira fase foi feita por uma Comissão de Reestruturação, e na sequência foram realizadas “Caravanas Rumo a IV Plenária”, com 5 Seminários Regionais, onde foram aprofundadas as questões prioritárias. A última fase consistiu nas plenárias estaduais, de dezembro/2007 a fevereiro/2008, subsidiadas por um documento de aprofundamento dos debates que continha os eixos e questões para o FBES. As discussões estaduais deram origem ao documento-base para a IV Plenária.
Como resultado de todo este processo de construção coletiva, o FBES se define como um instrumento do movimento da Economia Solidária, um espaço de articulação e diálogo entre diversos atores e movimentos sociais pela construção da economia solidária como base fundamental de outro desenvolvimento sócio econômico do país que queremos. Para isso, duas são as atividades principais: 1. Representação, articulação e incidência na elaboração e acompanhamento de políticas públicas de Economia Solidária e no diálogo com atores de outros movimentos sociais se inserindo nas lutas e reivindicações sociais. 2. Apoio ao fortalecimento do movimento de Economia Solidária, a partir das bases.
Na construção do desenvolvimento que queremos, foram definidas as bandeiras e estratégias de ação para cada um dos eixos de Produção, Comercialização e Consumo Solidários; Formação; Sistema Nacional de Finanças Solidárias e Marco Legal.
Com relação à estrutura e forma de funcionamento, mantiveram-se os segmentos de representação: Empreendimentos de Economia Solidária, Entidades de Assessoria e Gestores Públicos. Definiram-se as instâncias constituintes: os fóruns locais (estaduais, microrregionais e municipais) com critérios obrigatórios para seu reconhecimento e de avaliação; e também as instâncias deliberativas, de gestão e apoio.
A Plenária Nacional é a instância máxima de deliberação do FBES, dando as diretrizes políticas para orientar a Coordenação Nacional e a Coordenação Executiva.
A Coordenação Nacional (re)orienta as ações da Coordenação Executiva, deliberando em última instância sobre decisões políticas, operacionais e administrativas do FBES. É composta pelas entidades nacionais (no limite de até 12 representantes, a partir da comprovação de atuar em, no mínimo, 7 fóruns estaduais), pela representação dos fóruns estaduais (3 por estado: 2 EES e 1 entidade de apoio local) e da indicação da rede de gestores (2 por região e 2 nacionais)
Para o trabalho de interlocução com movimentos sociais e instituições privadas e públicas além de gestão política do cotidiano, existe a Coordenação Executiva Nacional, composta por 13 representantes: 7 representantes de empreendimentos das regiões do país (2 do Norte, 2 do Nordeste, 1 do Sul, 1 do Sudeste e 1 do Centro-oeste); 5 representantes das Entidades e Redes nacionais e 1 representante da Rede de Gestores de Políticas Públicas de Economia Solidária. Além disso, a Coordenação Executiva tem a função de acompanhar os trabalhos da Secretaria Executiva Nacional, sediada em Brasília.
A partir de agosto de 2011, na estrutura atual das instâncias nacionais do FBES, as entidades nacionais são as seguintes: União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), Cáritas Brasileira, Instituto Marista de Solidariedade (IMS), Rede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (Rede ITCPs) e Rede Unitrabalho.
A V Plenária Nacional ocorreu entre 9 e 13 de dezembro de 2012, em Luziânia-GO, e teve a participação de cerca de 600 trabalhadores e trabalhadoras, entre representantes estaduais, escolhidos nas etapas locais e estaduais, e também de convidados definidos pela Comissão Organizadora Nacional.
Nesta Plenária, aprofundamos o debate acerca da economia solidária como estratégia de desenvolvimento territorial, sustentável, diverso e solidário, como opção de organização popular e luta emancipada das/os trabalhadoras/es associadas/os. A economia solidária é, assim, uma proposta transversal e articulada com diversos temas, sujeitos e iniciativas para superação do modelo capitalista.
A V Plenária Nacional de Economia Solidária definiu a orientação política do movimento de economia solidária para o triênio 2013-2015. O lançamento desta plenária ocorreu durante a X Reunião da Coordenação Nacional do FBES, em agosto de 2011, quando foram definidos tema, objetivos, agenda e os eixos prioritários.
Como parte desse processo, ocorreram mais de 200 plenárias em todo o país, entre plenárias locais, temáticas, de balanço e estaduais, envolvendo mais de 10.000 trabalhadoras e trabalhadores da economia solidária. Tais debates e confluência de ideias e proposições foram sistematizados em um Documento Síntese para debate, modificação e definição da V Plenária Nacional.
Os debates desta V Plenária se organizaram em três dimensões:
- Orientação política do movimento
- Orientação das ações do movimento
- Organicidade do movimento (estrutura e organização do FBES)
Acesse a Carta Política Final. (documento e vídeo)
Acesse o Relatório Final da V Plenária.
O GT de Mulheres do FBES
O Grupo de Trabalho de Mulheres do FBES constituiu-se como desdobramento do GT de Gênero, o qual foi criado após articulação ocorrida na IV Plenária Nacional e reuniu-se pela primeira vez durante a VIII Reunião da Coordenação Nacional do FBES, em novembro de 2008. Três anos depois, durante a X Reunião da Coordenação Nacional do FBES, realizada em agosto de 2011, houve uma proposta de alteração da denominação do GT, que foi levada à votação, sugerindo a mudança de GT de Gênero para GT de Mulheres, a qual causou grande discussão entre os presentes. O placar da votação definiu-se em: 20 gênero, 26 mulheres e 3 abstenções. Dessa forma, definiu-se pelo nome GT de Mulheres e que sua composição seria exclusivamente de mulheres, para que elas pudessem planejar sua representação, atuação e incidência nos espaços do FBES e articulações externas.
Diversas propostas do GT foram consolidadas no documento Mulheres Rumo à V Plenária Nacional de Economia Solidária.