Fonte ONG Vida Brasil

Foi realizado no último dia 25 de novembro, em Salvador, a Audiência Pública promovida pela Abong, CESE e Cáritas, que discutiu “As Organizações da Sociedade Civil (OSC) e a Democracia: por novas relações com o Estado”. Em pauta, a necessidade de um Marco Regulatório para as OSCs e os projetos de lei em tramitação no Congresso. O evento foi realizado no auditório do Ministério Público do Trabalho da 5ª Região e contou com a participação de cerca de 200 pessoas, de diversos segmentos do movimento social da capital e interior, além de parlamentares baianos.

Na mesa de abertura, participaram José Carlos (Cáritas/Conselho de Segurança Alimentar-BA) e o promotor de Justiça Luiz Eugênio Miranda, representando o Procurador Geral do Ministério Público do Estado. Quem deu início à audiência foi Renato Cunha (Gambá/Abong-BA). José Carlos destacou a importância do evento, como forma de debater a necessidade de um arcabouço legal para a segurança jurídica das OSCs, enquanto que o promotor Luiz Eugênio afirmou que não é do interesse do Ministério Público criminalizar os movimentos sociais, ainda que a grande mídia só dê visibilidade para casos de escândalos e crimes.

Damien Hazard (Vida Brasil/Abong), Eliana Rolemberg (CESE/CLAI), e Daniel Rech (UNICAFES/Plataforma das Organizações da Sociedade Civil), mediados por Isadora Salomão (ELO/Abong) e José Carlos Zanetti (CESE), deram continuidade à mesa principal da Audiência.

Damien iniciou as apresentações trazendo um histórico dos movimentos sociais no Brasil, o cenário atual e a relevância do setor para a democratização do país. Ele chamou a atenção para o processo de criminalização sofrida pelas organizações – “há um risco de consolidação de um ambiente hostil e desfavorável para a atuação das OSCs”.

Eliana deu seguimento, introduzindo as dificuldades e insegurança jurídica que afetam as organizações, devido a falta de um Marco Regulatório. Ela apresentou o processo de construção da Plataforma das OSCs e lamentou a falta de diálogo e cumprimento dos acordos por parte do governo federal da presidenta Dilma. Já Daniel Rech trouxe o panorama atual dos projetos de lei que circulam no Legislativo federal, em especial o substitutivo ao PL 649/2011, apresentado pelo senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e que se encontra em um estágio de tramitação mais avançado, podendo ser votado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado a qualquer momento.

Daniel também criticou algumas propostas do Congresso, que acaba beneficiando as grandes organizações, em detrimento das de pequeno porte. Elementos como obrigatoriedade da contrapartida; prestações de contas complexas; exigência do patrimônio do gestor como garantia para a captação de recursos; e obrigatoriedade no cumprimento de metas e prazos independente do atraso na liberação dos recursos, foram alguns dos pontos apontados por Daniel que, segundo ele, não respeitam a realidade das organizações e prejudica as de pequeno e médio porte.

Após as apresentações da mesa, a fala foi aberta ao público, que contou com a participação dos parlamentares presentes e dos representantes do movimento social.

Todos os deputados baianos da Assembléia Legislativa do Estado e da Câmara Federal, além dos dois Senadores e a Câmara de Vereadores de Salvador foram convidados para a Audiência, já que um dos objetivos era sensibilizar e mobilizar os parlamentares para a discussão sobre o Marco. Compareceram os deputados federais Zezéu Ribeiro (PT), Luiz Alberto (PT), Nelson Pelegrino (PT), além da assessoria de Afonso Florence (PT); os deputados estaduais Marcelino Galo (PT), Neusa Cadore (PT) e Carlos Brasileiro (PT); a senadora Lídice da Matta (PSB); e a Secretária de Políticas Públicas para as Mulheres, Vera Lúcia Barbosa (Lucinha).

Os deputados Zezéu, Luiz Alberto e Pelegrino foram unânimes em suas falas ao criticar a atitude do governo federal de suspender todos os convênios com OSCs, por conta de escândalos de irregularidades cometidos por algumas entidades. Zezéu lamentou o critério adotado e ainda provocou “então, vamos suspender os contratos com todas as empreiteiras”. O deputado ainda salientou que o Governo precisa pôr em prática o diálogo com os movimentos sociais e não apenas criar documentos e pactos conceituais.

Já Luiz Alberto trouxe a necessidade de discutir uma Reforma Política urgente – “podemos até reeleger a presidenta Dilma, mas ela continuará refém do Congresso conservador”, destacando as dificuldades que as pautas ligadas ao movimento social encontram ao se esbarrarem em um Legislativo sem compromisso com essa questão. Ele também destacou o intencional processo de criminalização dos movimentos sociais, com a conivência do Congresso: “CPI das ONGs pode, mas CPI para investigar os órgãos de controle do Estado não pode”.

Pelegrino alertou o movimento social sobre a importância de “ir para dentro do Congresso”, pois, segundo ele, o parlamento só funciona sob pressão. O deputado também criticou os técnicos do Ministério Público e do Tribunal de Contas que muitas vocês trabalham desconhecendo a realidade do terceiro setor e sem dialogar com as organizações. Ele ainda se comprometeu em sugerir uma emenda no orçamento específica para o setor e a propor uma Comissão Especial para centralizar as discussões sobre o Marco Regulatório. A deputada estadual Neusa Cadore, que ficou do início ao fim da Audiência, destacou a importância do movimento social, afirmando que o Poder Público não tem competência, nem capacidade para substituir os trabalhos desenvolvidos pelas OSCs. Já a assessoria do deputado Afonso Florence, representado por Matheus Cotrim, destacou que os governos continuam reféns do poder econômico, que têm o interesse de estigmatizar os movimentos sociais. Ele ainda propôs a criação de um GT baiano de parlamentares, para debater o Marco Regulatório.

Já a senadora Lídice da Matta sugeriu não deixar que o Marco seja votado agora, “às pressas, para não resultar em um projeto que piore a situação”. Ela apresentou algumas experiências internacionais, onde a relação das organizações da sociedade civil com os órgãos do Estado se dá de forma direta e conjunta, com pouca burocracia e muita eficiência.

Os representantes das organizações presentes também se posicionaram. Beto, do Movimento Popular de Rua, pontuou que diversos segmentos da sociedade estão em busca de seus respectivos marcos legais. Tânia Palma, oriunda de movimentos por moradia e atualmente Ouvidora da Defensoria Pública do Estado, afirmou que as pequenas organizações, sobretudo entidades-bairro, estão sendo perseguidas pela Prefeitura de Salvador, que as tratam como se fossem empresas.

Célia Regina, do Grupo de Jovens Liberdade Já, cobrou um maior poder de fala para os movimentos sociais na Audiência. Edmundo Kroeger, do CECUP, lembrou que o país precisa realizar não só uma Reforma Política, mas também travar o debate pela democratização da comunicação.

Representando o Fórum Baiano de Economia Solidária, Débora Rodrigues, coordenadora da Vida Brasil, fez uma análise sobre a legislação atual, afirmando que as cooperativas são as que mais sofrem o processo de exclusão, devido à incompreensão sobre o papel social delas. De acordo com Débora, as leis atuais para as cooperativas atrapalham a formalização e o acesso a recursos. Ela ainda condenou a criminalização dos movimentos sociais: “somos tratados como bandidos até que se prove o contrário, e quando se prova a mídia não divulga”.

A Audiência Pública terminou com a leitura de uma Carta Compromisso assinada por diversas entidades do movimento social, se posicionando sobre o Marco Regulatório das OSCs e cobrando uma resposta do governo federal e do Estado.

Para ler a íntegra da Carta Compromisso: http://blogdavidabrasil.blogspot.com.br/2013/11/carta-compromisso-audiencia-publica.html