Fonte: Por Venicio A. de Lima
Foram recentemente divulgados os resultados da pesquisa Latinobarómetro 2007 que é realizada há 12 anos pela Corporación Latinobarómetro, uma ONG chilena com sede em Santiago que pretende medir “as percepções dos latino-americanos a partir de sua realidade econômica e social”. Este ano foram feitas 20.212 entrevistas, entre 7 de setembro e 9 de outubro, cobrindo uma amostra representativa da população de cada um dos 18 países da região (exceto Cuba), cerca de 527 milhões de habitantes.
Dos relatórios anuais, em geral a grande mídia divulga os resultados da avaliação comparada dos presidentes da região, os índices de apoio à democracia, à iniciativa privada e à intervenção do Estado na economia. Por exemplo: o índice de apoio à democracia caiu de 58% em 2006 para 54%, em 2007.
O Latinobarómetro 2007 incluiu também uma alentada avaliação sobre o inédito ciclo eleitoral que está acontecendo no continente: onze eleições presidenciais realizadas entre novembro de 2005 e dezembro de 2006, seguidas em 2007 pelas eleições da Guatemala e da Argentina e, em 2008, pelas eleições no Paraguai (abril) e na República Dominicana (maio). O que chama atenção, no entanto, é a estranha ausência de qualquer referência sobre o papel da mídia nas características identificadas como centrais em todos esses processos eleitorais.
Quem exerce o poder?
Já comentei neste Observatório(1) o livro lançado em agosto passado pela Fundação Friedrich Ebert (FES), na Colômbia [Se nos rompió el amor – Elecciones y medios de comunicación, América Latina 2006, disponível na íntegra aqui], exatamente sobre o papel da mídia nessas mesmas onze eleições presidenciais realizadas entre 2005 e 2006 (ver “Mídia e eleições na América Latina”). A principal conclusão dos estudos apresentados no livro é que, em seis dessas eleições, saíram vencedores os candidatos a presidente que enfrentaram a cobertura jornalística adversa majoritária da mídia em seus respectivos países – Bolívia, Chile, Brasil, Nicarágua, Equador e Venezuela.
Se o tema mereceu a organização de um livro financiado pela FES, reunindo o trabalho de quinze pesquisadores, é de se supor que seja relevante. Afinal, a mídia ocupa uma posição de centralidade nos processos políticos das democracias contemporâneas. Ou não ocupa?
O longo relatório “A Democracia na América Latina – Rumo a uma democracia de cidadãs e cidadãos”, preparado sob a coordenação do ex-chanceler argentino Dante Caputo para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e publicado no final de 2004 (ver aqui), traz os resultados de uma preciosa pesquisa, realizada entre julho de 2002 e junho de 2003, com 231 líderes latino-americanos. Esse relatório não teve, pelo menos no Brasil, a divulgação que merecia.
Foram ouvidos “líderes políticos que detêm ou detiveram o poder em seu máximo nível institucional, em chefias partidárias, parlamentares, funcionários de alto escalão ou prefeitos; protagonistas sociais em um amplo espectro que inclui líderes sindicais, empresários, acadêmicos, jornalistas, religiosos e dirigentes de movimentos ou organizações sociais; e membros das Forças Armadas”, entre eles 41 presidentes e vice-presidentes, no exercício do cargo ou anteriores. Em outras palavras, foi ouvida a elite econômica, política e intelectual da região.
Entre os obstáculos à consolidação democrática existentes na América Latina, a pesquisa do PNUD revela uma tensão entre os poderes institucionais e os poderes de fato. Os líderes consultados apontam, então, três poderes de facto que representam os riscos principais à consolidação democrática na região:
1. limitações internas decorrentes da proliferação de controles institucionais inadequados e da multiplicação de grupos de interesse que funcionam como poderosos lobbies, e externas oriundas do comportamento dos mercados internacionais, das avaliadoras de risco (de investimento) e dos organismos internacionais de crédito;
2. a ameaça do narcotráfico; e
3. os meios de comunicação.
Além disso, a primeira resposta à pergunta “quem exerce o poder na América Latina?” dada por 79,8% dos entrevistados foi “os grupos econômicos/empresários/o setor financeiro”; e a segunda resposta, oferecida por 64,9% dos entrevistados foi “os meios de comunicação”.