Fonte: Agência Carta Maior, por Antonio Biondi
Debate na noite de quinta, com o secretário de Economia Solidária do ministério do Trabalho e com o secretário-executivo do ministério do Meio Ambiente, terá como tema “O modelo de desenvolvimento do PAC e as questões ambientais”.
Na quinta-feira (22), Paul Singer e Cláudio Langone participam de debate em São Paulo sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo Lula. O debate reunindo os dois integrantes do governo federal, respectivamente secretários de Economia Solidária do ministério do Trabalho e executivo do ministério do Meio Ambiente, terá como tema “O modelo de desenvolvimento do PAC e as questões ambientais” e acontece na Casa da Cidade (Rua Rodésia, 398, Vila Madalena, tel: 3814-3372). A entrada é gratuita.
Além do debate desta quinta-feira, a entidade, voltada a discutir políticas públicas em geral, especialmente as ligadas às questões urbanas, já realizou outros dois encontros tendo como foco o PAC. Segundo o diretor da Casa da Cidade, Nabil Bonduki, o cicloo de debates foi iniciado com um encontro enfatizando os aspectos econômicos do programa, e contou com o ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo, Amir Khair, e com a professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Leda Paulani.
No dia 12 de março, o tema em debate foi “O PAC e a questão urbana”, que contou com a participação de Ermínia Maricato, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP) e ex-secretária executiva do ministério das Cidades, e Marcos Montenegro, diretor da secretaria nacional de Saneamento do ministério das Cidades.
Carta Maior entrevistou Ermínia e Montenegro, a fim de resgatar os principais pontos abordados por ambos no debate. A perspectiva de que o PAC possa gerar uma pressão por realização de gastos acima de tudo, ignorando a qualidade desses gastos e o meio ambiente foi problematizada por ambos. Para o diretor da secretaria nacional de Saneamento, “há esse risco, uma vez que estamos passando de uma fase grande contenção de gastos para uma de grandes investimentos. É um risco que temos que enfrentar”. Montenegro registra que, desde 1998, havia um grande monitoramento dos gastos em saneamento e habitação por parte do FMI (Fundo Monetário Internacional), com os respectivos impedimentos deliberados pelo Conselho Nacional Monetário para que não se ampliassem os investimentos no setor de saneamento.
O diretor da secretaria de Saneamento aponta outra grande característica dessa nova fase, que é “uma visão de planejamento de médio prazo, em que todos – sociedade organizada, empresários, poder público – sabemos os recursos disponíveis para os próximos quatro anos. Mas fica claro, diante da magnitude dos recursos, o desafio de se gastar bem”. Montenegro cita um número que dá idéia dos montantes envolvidos: “temos em mãos a possibilidade de gastar mais de R$ 10 bilhões em quatro anos na urbanização e saneamento em locais de urbanização precária”.
A professora da FAU-USP aponta que, apesar do montante de recursos que o PAC organiza numa perspectiva de investimentos no médio prazo, o “primeiro risco é não gastar”. Ermínia explica que, para que esses recursos sejam investidos, é necessária uma capacidade operacional que não depende só do governo federal, mas também dos estaduais e municipais – as obras de saneamento, por exemplo, são feitas pelas companhias estaduais ou municipais. Nesse sentido, ela analisa que “existe realmente uma falta de capacidade operacional, até porque o país passou um longo tempo sem recursos nessas áreas”. “Precisamos e temos investido em um esforço permanente de capacitação para informar melhor as prefeituras sobre os pré-requisitos para ter acesso aos recursos”, conta Montenegro.
Outro problema sério a ser enfrentado, na visão da professora da USP, é a falta de regularização fundiária no país, com a conseqüente escassez de terras para construção de conjuntos de habitação ou iniciativas afins. “Hoje, é muito difícil de as prefeituras possuírem terrenos regularizados para investir em habitação e urbanização, por toda uma série de fatores históricos”. Ela apresenta uma situação na qual será necessário superar primeiro o desafio de se gastar, seguido pelo de se gastar bem: “a construção de conjuntos habitacionais na periferia sem urbanização dessas áreas equivale a gastar mal”, diz ela.
Ermínia e Montenegro apresentam avaliação semelhante de que as dificuldades não dizem respeito somente à defasagem técnica de prefeituras e companhias de saneamento, mas também ao setor privado, como no caso das empresas de consultoria e dos escritórios de engenharia, arquitetura e urbanismo. O ministério das Cidades tem buscado também ampliar suas ações junto à Secretaria do Tesouro Nacional, um dos órgãos do governo federal de maior responsabilidade no contingenciamento de recursos para investimentos. Segundo o diretor de saneamento da pasta, as conversas têm sido no sentido de alterar as exigências burocráticas para que as prefeituras e Estados possam tomar os recursos e realizar as obras. “E estamos sentindo uma mudança de qualidade na relação”, avalia.
Reforma e qualidade de vida Perguntado sobre se as propostas trazidas pelo PAC e seu alcance transformador possuem relação com a reforma ministerial e composição do ministério, Montenegro afirma que, “como militante do PT, estou trabalhando para que o partido continue como avalista de uma política de desenvolvimento urbano democrática e inclusiva”, citando como exemplos dessa política a própria criação do ministério das Cidades, a realização das conferências municipais, estaduais e nacionais do setor, a aprovação da nova lei do saneamento e o estímulo aos Planos Diretores municipais. “Estamos trabalhando e apostando nessa continuidade. Mais do que isso já não diz respeito à nossa alçada”.
Montenegro apresenta, por fim, sua avaliação sobre se as propostas do PAC referentes às políticas urbanas irão alterar o quadro das cidades e melhorar a vida das pessoas, especialmente de quem mais precisa. “Vivemos em uma sociedade excludente, em cidades altamente excludentes. Para conseguir fazer com que os recursos sejam destinados a quem mais precisa, vai depender de mobilização no plano local”. Para ele, “os movimentos, os conselhos municipais e estaduais das cidades, o Fórum Nacional de Reforma Urbana, a Frente Nacional de Saneamento Ambiental, entre outros setores e entidades, devem se colocar extremamente atentos e vigilantes nesse sentido”.
Também nesse sentido, a professora Ermínia Maricato faz a ressalva de que “nossas cidades apresentam problemas tão graves, e as prefeituras estão com tamanhas restrições nos seus gastos e na sua capacidade de investimentos, que um impacto visível não pode se dar em quatro anos”. Ermínia entende que o PAC representa um bom começo, inclusive por focar também os investimentos privados. “O programa e a política habitacional do governo prevêem que o setor privado deve mudar seu perfil de investimentos, passando a atender não só as classes mais abastadas – que geram maior lucro por unidade construída”. A professora da FAU-USP finaliza com uma crítica, registrando que o PAC dá pouca atenção, na análise dela, à questão da mobilidade urbana, que é “central na qualidade de vida das cidades”. Segundo Ermínia, os próprios governos municipais abandonaram a questão dos transportes metropolitanos, como se isso não lhes dissesse respeito, e o tema da mobilidade urbana se coloca hoje como “uma terra de ninguém, ninguém quer saber disso”.