Fonte: http://www.unrisd.org/ (tradução: Juliana Braz)

Ao agradecer a recente iniciativa de 14 agências das Nações Unidas que estabeleceram um Grupo de Trabalho Inter-Agências em Economia Social e Solidária, os participantes do 5º Encontro Internacional de Economia Social e Solidária da RIPESS solicitaram ao novo grupo que continue o trabalho iniciado este ano pela UNRISD e OIT ao organizar uma conferência anual sobre Economia Social e Solidária. Eles recomendaram fortemente que o espaço do Grupo de Trabalho esteja aberto à participação da sociedade civil. Os delegados reforçaram que o Secretário Geral da ONU Ban Ki-moon e o alto comuissariado associados à agenda pós–2015 atendam às recomendações feitas na recente consulta à sociedade civil, organizado pela UN- NGLS, permitindo que as vozes da Economia Social e Solidária sejam ouvidas no processo de concepção dos futuros Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

A reunião da RIPESS (15-18 outubro 2013, em Manila), realizada conjuntamente com o Fórum de Lideranças ASEAN organizado pela Estratégia Ásia e Instituto de Lideranças localizada em Kuala Lumpur, reuniu 653 participantes de 31 países. Foi uma oportunidade para os militantes da Economia Social e Solidária e organizações de fomento avaliarem o progresso e o envolvimento dos políticos de vários países do Sudeste Asiático. Embora tivessem diferentes interpretações em relação ao que é a Economia Social e Solidária, houve um amplo consenso sobre a importância do crescimento inclusivo, a solidariedade, a cooperação e o desenvolvimento comunitário como uma alternativa aos ideais neoliberais e modelos econômicos centrados no auto-interesse, na maximixação dos lucros e no consumismo. Autoridades políticas de alto nível das Filipinas estiveram presentes incluindo a Secretária de Estado para o Desenvolvimento Social Corazon Soliman, o Líder do Senado Alan Peter Cayetano e o Prefeito da Cidade de Quezon Herbert Bautista, que prestigiaram as reuniões da RIPESS e do Fórum de Lideranças ASEAN, reconhecendo a necessidade de alternativas de desenvolvimento e o papel crucial da Economia Social e Solidária na elaboração de uma sociedade mais justa e igualitária.

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Avaliação do progresso da Economia Social e Solidária

Neste encontro da RIPESS, o quinto do gênero realizado desde 1997, foi feito um balanço do progresso notável que tem ocorrido nos últimos anos na construção de práticas e redes de Economia Social e Solidária nas seis regiões onde a RIPESS (Rede Intercontinental de Promoção da Economia Social e Solidária) está organizada. Apesar de não termos disponíveis muitos dados sistematizados, há diversos esforços para mapear a Economia Social e Solidária e compreender o papel que os governos podem desempenhar no apoio a estas iniciativas. No encontro deu-se especial atenção a questões críticas tais como políticas públicas, legislação, governança da economia social e solidária, bem como o fortalecimento não apenas de iniciativas e empreendimentos econômicos separadamente, mas também a abordagem territorial da Economia Social e Solidária. Como reflexo da forte participação dos estudantes na conferência, inclusive com uma delegação animada da Indonésia, foi dada grande atenção a importância que pode ter a Economia Social e Solidária para engajar, beneficiar e produzir autonomia para os jovens. A importância de ver a Economia Social e Solidária da perspectiva do gênero e a visibilidade da dimensão de gênero nas práticas de Economia Social e Solidária com formação, políticas e advocacy foi reconhecida pela conferência.

Resistir, construir e planejar

Em seu discurso, Mike Lewis, co- autor do livro “O Imperativo da Resiliência”, apontou que o poder da Economia Social e Solidária está no que tem sido sua dupla abordagem: “resistir e construir”. A esses, ele acrescentou um terceiro: a necessidade de criar estratégias. “Lembrem-se de que não podemos fazer tudo. Foco e estratégia são fundamentais para a expansão do espaço ocupado pelos valores e atores da economia solidária”. Como prioridades para a ação e alavanca para a mudança sistêmica, ele sugeriu concentrar-se em três necessidades humanas básicas

alimentação, habitação e energia – bem como em três transições fundamentais:

das finanças especulativas para um sistema financeiro que sirva a produção centrada nas pessoas e nas trocas;

da privatização para o controle dos bens comuns pela comunidade; e

do imperativo coorporativo de maximixar lucros para a maximização do benefício mútuo através da cooperação.

Falando via vídeo, Pierre Calame, Presidente da Fundação Charles Leopold Mayer, advertiu sobre a romantização da Economia Social e Solidária apontando para a necessidade de forjar alianças com múltiplos atores sociais e movimentos, ponto também enfatizado por Nancy Neamtan, Presidente da Chantier de l ‘Economie Sociale. Ela apontou avanços significativos, nas últimas décadas, tanto em relação a reflexão como em advocacy – a partir do momento em que os movimentos sociais passaram de desconsiderar as questões econômicas, para o reconhecimento de que “o desenvolvimento econômico é o nosso problema”. Avanços também incluem ir além da dicotomia simplista entre Estado e a propriedade privada e controle, aceitando a idéia, popularizada por Elinor Ostrom, que a melhor maneira de gerir os recursos naturais ou recursos coletivos comuns é através de instituições democráticas geridas pelos cidadãos. Ela também apontou um importante progresso no apoio e fomento a Economia Social e Solidária através de políticas públicas e de legislações, inclusive o Quebec, onde um termo de referência acaba de ser aprovado.

Reconhecendo o surgimento de um movimento global da Economia Social e Solidária, Paul Singer, Secretário Nacional de Economia Solidária, apontou que os valores e práticas da Economia Solidária já existem há séculos, principalmente entre as populações indígenas, e agora estão encontrando espaços para expressão em contextos contemporâneos de crise, alienação e nos movimentos sociais. ” Estes são tempos excitantes para repensar o significado de desenvolvimento e para trazer de volta para a equação valores que têm sido negligenciados nos tempos modernos tais como solidariedade e felicidade”, disse Paul Singer.

Diversas perspectivas em Economia Social e Solidária

A conferência organizada pela RIPESS também foi uma ocasião para pensar fora da caixa. Em sua apresentação sobre o desenvolvimento da Economia Social e Solidária nas Filipinas, Ben Quinones, Coordenador Executivo da RIPESS e Presidente do Conselho Asiático de Economia Solidária, falou sobre a criação e consolidação de “zonas de ecosistemas” da Economia Social e Solidária. Ele apresentou uma proposta de projeto de lei parlamentar, na qual sete milhões de hectares de terras públicas ociosas seriam alocados para 750 dessas zonas. “Se as corporações transnacionais e os investidores estrangeiros podem desfrutar dos benefícios de zonas de processamento de exportação que simplificam o seu ambiente regulatório e fornecem vários incentivos, por que a Economia Social e Solidária não pode desfrutar de vantagens semelhantes dessas zonas privilegiadas para atividades compatíveis?”, argumentou ele. O projeto de lei parlamentar proposto baseia-se na definição de Economia Social e Solidária utilizado pela UNRISD, a qual foi incluída no discurso que eu proferi ao Fórum de Liderança ASEAN: as organizações e empreendimentos econômicos com (i) objetivos sociais e ambientais explícitos, (ii) relações cooperativas e associativas entre membros e a comunidade, ( iii ) autogestão democrática, e (iv) valores de solidariedade e bem viver.

Diferenças significativas entre perspectivas e referências sobre o que é a Economia Social e Solidária ficaram evidentes durante todo o evento, incluindo o foco no Sudeste da Ásia em crescimento inclusivo através do desenvolvimento de micro e pequenas empresas, as perspectivas latino-americanas que enfatizam a importância da ação coletiva, a autogestão democrática e a necessidade de uma mudança sistêmica mais profunda. Houve divergências de visão quanto a centralidade e desempenho das cooperativas. Suponho que, assim como existem variações do capitalismo, assim também existem variações quanto a Economia Social e Solidária, cada um com suas próprias forças, fraquezas e desafios. Aprender sobre Economia Social e Solidária precisa ir além de um foco em melhores práticas. A melhor compreensão das múltiplas tensões que podem surgir com a expansão da economia solidária é crucial para que ela possa realizar o seu potencial significativo como um caminho mais inclusivo e sustentável para o desenvolvimento. Com os governos mais interessados na economia solidária, a análise crítica das relações com o estado se torna essencial para garantir que a agenda da Economia Social e Solidária não seja entendida superficialmente como um simples instrumento para a redução da pobreza e proteção social. O potencial da Economia Social e Solidária se relaciona com os imperativos da justiça social e ambiental. Na verdade, uma releitura da sigla RIPESS pode indicar seis elementos fundamentais de uma agenda tão transformadora : Resiliência, Desenvolvimento Integrado, Empoderamento Político, Empoderamento Econômico, Redistribuição de Excedentes e Solidariedade.

Original: http://www.unrisd.org/80256B3C005BE6B5/search/681633A22D65C366C1257C0C0034B2FD?OpenDocument