Por Giannino Piana
Longe de constituir uma renúncia que mortifica as possibilidades de expressão da pessoa, o decrescimento, que implica a rejeição do consumismo e na abolição do supérfluo, é considerada por aqueles que a defendem como uma oportunidade – por isso, fala-se de crescimento “sereno” ou “feliz”.
A análise é do economista italiano Giannino Piana, professor de ética cristã da Libera Università de Urbino e de ética e economia da Faculdade de Ciências Políticas da Universidade de Turim. O artigo foi publicado na revista italiana Jesus, 10-10- 2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto
Apesar da crise econômica mundial, a convicção de que é possível um crescimento ilimitado ainda é muito difundida hoje, a tal ponto que se tornou a ideologia dominante da nossa sociedade. A medida de todas as escolhas pessoais e sociais segundo critérios mercantis e quantitativos, a afirmação de uma competitividade radical, a tendência de buscar o lucro imediato e o ganho fácil são axiomas que também estão na base dessa orientação e que adquiriram uma consistente credibilidade após o colapso dos sistemas de economia planejada dos países do socialismo real e da consequente revanche de uma forma de capitalismo selvagem favorecido pelo processo de globalização em curso.
A lógica que subjaz a essa ideologia da expansão contínua é a lógica do “ter” e do “consumir”, que se apoia na criação de necessidades sempre novas, induzidas externamente mediante a pressão social – os meios de comunicação exercem uma função determinante a esse respeito – e em larga medida alienantes.
As consequências desse processo, que alguém definiu justamente como uma das piores e mais desastrosas utopias, são hoje visíveis aos olhos de todos. O acúmulo da riqueza privada com cada vez maiores espoliações coletivas e, por isso, com o incremente da marginalização social, o crescente endividamento dos Estados – o nosso [italiano] tem, a propósito, um primado pouco lisonjeiro –, a redução do trabalho a mercadoria com uma tendência ao redimensionamento dos salários e dos direitos e, por último (mas não último em ordem de importância), a amplitude da crise ecológica, por causa tanto da degradação ambiental, quanto da progressiva redução dos recursos disponíveis, denunciando a verificação de uma situação de implicações dramáticas.
Depois, se ampliarmos o olhar – como hoje é necessário fazer, dada a estreita interdependência existente entre os vários povos da Terra – para o contexto global, ficam evidentes os sinais do estado de grave desequilíbrio em curso e das profundas injustiças que são a sua causa. A economia dos países ricos, que cria formas de desigualdade intoleráveis na distribuição da riqueza, tanto entre as nações, quanto entre as classes sociais, descarrega o seu impacto global sobre os ecossistemas dos países mais pobres, acentuando as condições de desconforto em que vivem.
A consideração de que o crescimento não pode ser infinito, que tem limites que devem acabar por se impor, não é, por outro lado, nova em si mesma. Ainda no início dos anos 1970, o MIT (Massachusetts Institute of Technology), com o relatório sobre os Limites do Crescimento (Milão, 1972) – a tradução correta do texto original inglês seria, ao contrário, “Limites ao Crescimento” –, evidenciava claramente como o crescimento econômico não poderia continuar indefinidamente por causa da limitada disponibilidade de recursos naturais e da limitada capacidade de absorção das substâncias poluentes por parte do planeta.
A consciência desse fato cresceu nas últimas décadas, a tal ponto que há alguns que começaram a teorizar sobre o “decrescimento” – o primeiro a introduzir tal hipótese foi Serge Latouche [que estará no IHU em novembro], renomado economista e ecologista parisiense – como um caminho a ser seguido para restabelecer os equilíbrios quebrados e dar início a um processo de verdadeira humanização.
Longe de constituir uma renúncia que mortifica as possibilidades de expressão da pessoa, o decrescimento, que implica a rejeição do consumismo e na abolição do supérfluo, é considerada por aqueles que a defendem como uma oportunidade – por isso, fala-se de crescimento “sereno” ou “feliz” (essa última expressão é assumida particularmente pelo movimento fundado na Itália por Maurizio Pallante) –, isto é, como um meio para dar sempre mais espaço para os valores imateriais, aos valores relacionais em particular, e para melhorar a qualidade de vida.
Ela implica sobretudo a adoção de algumas escolhas prioritárias no campo socioeconômico e político, tais como a atenção privilegiada para assegurar a todos alimentos e medicamentos, a preocupação com a preservação da biodiversidade, a regulação do clima, a purificação das águas e do ar, a proteção contra as inundações, a prevenção a doenças etc. Mas também implica a adoção de escolhas pessoais específicas, tais como a prática da reciclagem dos resíduos, a preferência dada às energias alternativas, a abolição dos desperdícios alimentares e do abuso dos recursos naturais; e a lista poderia continuar.
O que está em jogo é, em última instância, cultural e ético. Trata-se de decidir se queremos atribuir o primado à busca do bem-estar econômico a todo o custo ou se queremos privilegiar a busca da felicidade, que implica também a limitação das necessidades materiais – especialmente se supérfluas ou alienantes – e a aquisição de estilos de vida capazes de abrir espaço para instâncias de valor que restituam à vida o seu verdadeiro sentido e favoreçam uma distribuição mais equitativa dos bens entre os homens.
Nessas condições, de fato, o decrescimento adquire um significado altamente positivo, pois se torna uma ocasião para um autêntico crescimento humano.