Por Patrícia Rangel – Cientista Política, consultora do CFEMEA
As mulheres se tornaram maioria do eleitorado, segundo dados preliminares do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgados pela Agência Brasil em 15/07/2008. Somos 51,7% dos 130 milhões de eleitores aptos a votar nas próximas eleições municipais, em outubro próximo. Isso sem somar inúmeras mulheres não computadas (o TSE contou 67,5 milhões de mulheres, 62 milhões de homens e 160 mil eleitores de sexo não-informado). Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, possuem eleitorados femininos expressivos, com mais de 52% de eleitores do sexo feminino. Somente nas UFs Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, os colégios eleitorais continuam com maioria masculina.
Tal tendência vinha se consolidando desde pelo menos 2000, quando o eleitorado feminino totalizou 50,4%, superando o masculino naquelas eleições. Infelizmente, a tendência não se refletiu no número de candidaturas femininas. Mesmo sendo maioria do eleitorado, as mulheres permanecem bem atrás dos homens quando se trata de concorrer a um cargo político. Segundo balanço parcial de registro de candidat@s para eleições municipais, dos 371 mil candidat@s que concorrerão cargos de prefeit@, vice-prefeit@ ou vereador em 5.565 municípios do país, as mulheres são apenas 77 mil, ou 20,8% do total. Entre os 15 mil que concluíram os processos de registro de candidaturas a prefeito, estão 13,5 mil homens (90%) e somente 1,5 mil mulheres (10%). Em relação a candidaturas ao cargo de vereador, dos 340.831 candidat@s, foram 267.439 homens (78,5%) e 73.392 mulheres (21,5%).
Nas últimas eleições municipais, em 2004, segundo dados também preliminares do TSE, dos 15,7 mil candidat@s à prefeitura, 1,4 mil eram mulheres (9,5%) e, dos 345.855 candidat@s a vereador, somente 76.551 candidaturas eram femininas (22,1%). Somando-se candidat@s à prefeitura e à câmara de vereadores, havia 361.571 registros, dos quais 78.049, ou 21,5% eram mulheres. Ainda sendo baixo, o número preliminar de candidaturas femininas de 2004 foi maior do que o da atual eleição, 20,8%. Além disso, ainda segundo dados do TSE, as mulheres eram 51,1% dos 119.8 milhões de eleitores naquele ano. Em 2008, elas são quase 52%. Ou seja, cresceu a proporção de eleitoras e diminuiu a porcentagem de candidatas.
Esse quadro ilustra bem a situação de retrocesso de representação feminina e déficit democrático que enfrentam os municípios brasileiros. Falamos em déficit democrático pois uma assembléia legislativa só é considerada representativa se sua composição for uma reprodução reduzida da sociedade. Uma vez que há aproximadamente 50% de cidadãos de cada sexo, se não existe paridade entre homens e mulheres nas casas legislativas, é porque existe um déficit de representação nesses municípios. É exatamente por esse motivo que a proporção de mulheres em cargos legislativos tem sido cada vez mais apontada como indicador da qualidade da representação política e critério relevante para se mensurar a democracia e a igualdade de oportunidades.
Também não se trata de um problema exclusivamente brasileiro, apesar de no país a situação ser especialmente dramática: um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) apontou que no atual ritmo, a igualdade de participação entre os gêneros em casas legislativas só será concretizada em cem anos. Os motivos para dados tão desanimadores são inúmeros, que vão desde fatores sócio-econômicos e culturais até o tipo de sistema eleitoral. Seja como for, as dificuldades encontradas pelas mulheres não são decorrentes de sua situação individual ou de deficiências particulares, as razões para a baixa representação feminina são de natureza estrutural, ancoradas nos valores de nossa sociedade que ainda enfrenta sistemas ideológicos excludentes e perversos como o machismo, o racismo e o elitismo.
Nota: Neste artigo, usamos o símbolo @ para o masculino e o feminino, quando falamos dos dois sexos. Exemplo: candidat@s significa candidatos e candidatas.