Reportagem divulgada pela Imprensa do MST
Ele diz que ficou impressionado com a execução de Valmir Mota de Oliveira, o Keno, militante da Via Campesina e do MST, na área de experimentos ilegais da Syngenta, que contratou milícia armada para enfrentar os trabalhdores rurais. “Não é muito comum que as multinacionais utilizem desse tipo de violência. Elas procuram meios político–legislativo para terem o controle dos territórios e dos modelos produtivos. Esses meios são sempre violentos por que atingem milhares de pessoas. Todavia, na região de Cascavel uniram-se atrasado e moderno e acabaram utilizando a violência física”, afirma.
Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Presidente Prudente, onde preside o conselho editorial da coleção Geografia em Movimento, publicado pela Editora Expressão Popular. Publicou “A formação do MST no Brasil” e “Brava Gente” (co-autoria com João Pedro Stedile), além de diversos verbetes na Enciclopédia Contemporânea da América Latino e do Caribe.
A região de Cascavel é berço do MST e, ao que parece, até o momento a questão agrária no local ainda parece não ter sido foi resolvida. Há um cansaço tanto de sem-terra e proprietários para negociar e tentar resolver a questão?
Em primeiro lugar é fundamental compreender que não existe solução para a questão agrária. É possível minimizá-la, mas é impossível resolvê-la. Ela é uma questão estrutural do capitalismo, criada pelas desigualdades geradas pelo desenvolvimento econômico. A negociação é condição essencial para a minimização da questão agrária. Para tanto é preciso diminuir as desigualdades sociais. Os índices de concentração fundiária na região de Cascavel permanece o mesmo desde que o MST nasceu, em 1984.
As mortes ocorridas no conflito, domingo, mostra que milícias armadas continuam agindo nesses locais impunemente? Isso se tornou mais comum com o tempo?
Sim, o que impressiona é que isso acorra com a Syngenta Seeds. Não é muito comum que as multinacionais utilizem desse tipo de violência. Elas procuram meios político–legislativo para terem o controle dos territórios e dos modelos produtivos. Esses meios são sempre violentos por que atingem milhares de pessoas. Todavia, na região de Cascavel uniram-se atrasado e moderno e acabaram utilizando a violência física.
Os proprietários estão mais preparados para conter possíveis invasões? O sr. acredita que haja uma descrença, por parte deles, de que as autoridades possam intermediar e resolver esses conflitos? De que maneira os fazendeiros poderiam agir nesses casos? O governo poderia, de alguma forma, intermediar esses conflitos? Houve omissão? De que lado?
Há diferentes tipos de organizações de ruralistas. Algumas são mais fascistas outras mais democráticas. Sabem que o governo tem atuado no sentido de minimizar a questão agrária. Mas não é isso que eles querem. Eles querem extirpar os sem-terra, o que é impossível, pois são eles mesmos que criam os sem-terra. Quanto mais concentram a terra, mais produzem sem-terra.
Os ruralistas dizem que os sem-terra se aproveitam do apoio que têm de parte da opinião pública e do governo para promover as invasões. Dizem também que o modelo de reforma agrária, como é conduzido hoje pelo governo, está esgotado. Como o sr. vê essas análises?
Na verdade, eles querem esconder que o modelo que está esgotado é o modelo da monocultura em grande escala, que tem gerado concentração de riqueza e destruição socioambiental. Por onde eles passam, há diferentes formas de devastação. A reforma agrária tem minimizado as desigualdades, gerando trabalho e produzindo alimentos para o desenvolvimento local.
Por que exatamente aquela região no Paraná é considerada ainda uma área conflituosa (a situação descrita pelo repórter enviado é que há no local verdadeiros coronéis “vacinados”, por assim dizer, contra movimentos sociais)? Quais outros locais do país o sr. colocaria na lista de regiões mais conflituosas em relação à questão agrária, onde ruralista se propõem a fazer o papel de Estado e da lei?
De acordo com o Banco de Dados da Luta pela Terra, que coordeno na UNESP, Cascavel, Pontal do Paranapanema, sudeste do Pará, Médio Vale do Rio São Francisco e entorno de Brasília são regiões onde existem os ruralistas mais violentos, que querem fazer a lei com as próprias mãos.
Bernardo Mançano Fernandes possui graduação em Geografia (1988), mestrado em Geografia Humana (1994) e doutorado em Geografia Humana (1999) pela Universidade de São Paulo. Experiente na área de Geografia, com ênfase em Geografia Agrária, estuda teorias dos territórios, reforma agrária, desenvolvimento socioterritorial e violência no campo.