Fonte: Oona Castro, enviado por Vicente Aguiar (vicenteaguiar@gmail.com)
Eles podem estar a um palmo do seu nariz sem que você tenha se dado conta: há cada vez mais casos de negócios abertos pelo País e muito pra se aprender com eles. Se você acha que nunca ouviu falar disso, provavelmente foi por falta de dar nome aos bois. Se matutar um pouco, descobrirá que, a despeito da terminologia, você conhece modelos de negócios abertos – ou “open business models”.
Definições
Esses modelos baseiam-se em algum tipo de commons. Open business é um modelo de negócio sustentável, sem geração de receita pelos direitos de propriedade intelectual, ou, por direitos autorais. A liberação do uso de uma obra pode se dar pela utilização de um instrumento legal como a licença Creative Commons ou por uma situação social, em que a ausência de estruturas de propriedade intelectual gera, na prática, o compartilhamento de conteúdo.
Em geral, as principais características de modelos de negócios abertos são a sustentabilidade econômica; flexibilização dos direitos de propriedade intelectual; horizontalização da cadeia de valor; ampliação do acesso à cultura; e contribuição da tecnologia para ampliação desse acesso.
Em Belém do Pará, por exemplo, o modelo de negócios da indústria local do tecnobrega não é aquecido pelo pagamento de direitos autorais advindo da venda de CDs. Movimentam o mercado da música paraense as casas de festa, shows, vendas nas ruas e as aparelhagens, maquinários tecnológicos enormes que protagonizam as festas do tecnobrega. Imagine o seguinte ciclo: 1) artistas gravam nos estúdios; 2) há quem selecione as melhores novidades e leve aos camelôs; 3) estes vendem por preços compatíveis com a realidade local e divulgam; 4) DJs tocam nas festas; 5) artistas fazem shows; 6) CDs e DVDs das apresentações são gravados e vendidos; 7) bandas, músicas e aparelhagens estouram na opinião pública e tudo volta ao início. Com isso vem o crescimento da produção musical, o aquecimento do mercado de trabalho e uma distribuição mais horizontal dos ganhos nas diversas etapas da cadeia produtiva.
O Projeto na América Latina
O tecnobrega é uma das experiências observadas e estudadas pelo projeto Open Business (www.openbusiness.cc) na América Latina. Nesta região, o projeto é liderado pelo Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV DIREITO RIO em parceria com o Overmundo, e envolve pesquisas no Brasil, Argentina, Colômbia e México, com olhar focado sobre iniciativas na área de cultura. Os outros dois países que coordenam o mapeamento de experiências de negócios abertos são Reino Unido e África do Sul, com atenção voltada para modelos de negócios abertos na Internet e na educação, respectivamente.
Mas a indústria local da música paraense não é a única expressão de modelos abertos no Brasil, tampouco na América Latina. Pode parecer que não têm nada em comum, mas características de open business unem o funk, no Rio de Janeiro; o Espaço Cubo, no Mato Grosso; a Eletrocooperativa, na Bahia; o filme Cafuné, de Bruno Vianna; a Tortilleria, no México; o mercado cultural em torno do Merlín Estudios, em Medellin, ou a comercialização de champeta na Colômbia e Caribe; exemplos de jornalismo colaborativo ou social, como o Repórter Brasil, Carta Maior e o próprio Overmundo, isso para citar apenas alguns que pretendemos registrar.
No caso mexicano da Tortilleria Editorial, por exemplo, autores compartilham suas publicações na rede. Por meio de um software que gera o original para a impressão, eles podem copiar e vender suas próprias obras e a de outros autores que participam do projeto, sem pagar pelos direitos de propriedade. Paralelamente, suas obras podem ser igualmente distribuídas e comercializadas, sem o recebimento de qualquer valor referente à propriedade intelectual.
A idéia do projeto é assim compreender quais são os elementos que compõem mercados abertos, como e por que eles funcionam. Entre muitas questões que envolvem as iniciativas nessa direção, interessa a nós entender em que medida as novas tecnologias contribuíram para o aprofundamento e a disseminação desses modelos de negócios, como eles se organizam em relação aos direitos de propriedade, suas regras, os sistemas de incentivos, quem são os principais atores desses mercados e as características de seu público.
Por isso, estamos identificando, investigando e sistematizando alternativas que conjugam conteúdos abertos e acessíveis para o público com sustentabilidade econômica. Essas experiências permitem não só maior acesso ao conhecimento, como também modelos mais horizontais e inclusivos. O desenvolvimento tecnológico e o comportamento social criado em torno dele colocam em xeque os tradicionais modelos de negócios na área de cultura. Novos modelos têm criado oportunidades de inserção de agentes no mercado, bem como o desenvolvimento de indústrias culturais locais e globais.
Para criar referências de negócios mais inclusivos e compatíveis com a realidade contemporânea, o projeto Open Business desenvolve pesquisa sobre a indústria local da música no Brasil, Argentina e Colômbia, além de compilar casos exemplares de negócios abertos nos três países e no também no México. O projeto investiga também a indústria cinematográfica nigeriana, que produz, copia e distribui filmes sem arrecadação de pagamento pelos direitos autorais e representa nada menos que o segundo maior setor econômico do país, ficando atrás apenas da indústria petrolífera, e a terceira maior indústria cinematográfica do mundo em geração de receitas. Os primeiros resultados das pesquisas poderão ser conferidos em março de 2007.
Você pode contribuir
Há diversas iniciativas surgindo e crescendo na América Latina. As periferias, globais e nacionais, estão se apropriando da tecnologia e criando indústrias culturais informais, por meio de redes de produção, distribuição e consumo próprios. Não se baseiam em incentivos tradicionais de propriedade intelectual. Ao contrário, apostam na livre difusão das obras para o sucesso do negócio.
O que motiva o artista a criar? A remuneração é o principal incentivo para criação – que outros existem e que peso eles têm? Quais são os principais meios de remuneração dos artistas? As respostas a essas perguntas podem nos levar a mais produção e mais acesso à cultura.
Contribuições às pesquisas e ao mapeamento em curso são muito bem-vindas. Você pode colaborar para que o projeto se torne mais rico, registrando ou indicando novos casos de negócios abertos aqui no Overmundo – a sugestão é usar sempre a tag “openbusiness” como forma de ir costurando as colaborações que surjam sobre o assunto.
Outra possibilidade é a proposição de questões, idéias ou reflexões sobre o tema, por meio de comentários aqui embaixo. A razão deste texto não é mesmo outra senão a de despertar reações, novas colaborações, casos e perspectivas: negócios abertos, debate idem!
Para saber mais sobre negócios abertos e cultura livre no Brasil, visite também:
www.culturalivre.org.br
www.direitodeacesso.org.br