Por Humberto Alencar, com informações do Granma Internacional e da Agência Ria-Novosti

Depois de transcorridos 60 anos do lançamento pelos EUA de duas bombas atômicas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, é cada vez maior o repúdio à justificativa oficial americana de que “era preciso dar um fim rápido à Segunda Guerra Mundial no Pacífico”. Historiadores consideram que esse genocídio não era necessário para obter a rendição japonesa, supondo que isso “salvaria a vida de milhares de soldados americanos”. O doutor Peter Kuznick, chefe de Estudos Nucleares da American University de Washington, vai ainda mais além, afirmando que esses ataques não foram só um crime de guerra, mas sim um crime contra a humanidade.

A bomba “Little Boy” (Garotinho), lançada pelo bombardeiro B-29 Enola Gay, explodiu às 8h15 da manhã de 6 de agosto a 600 metros de altura de Hiroshima, matando instantaneamente cem mil pessoas. Hiroshima era um centro médio, de 350 mil habitantes, com um porto de importância militar insignificante. Em um raio de 2,5 km do centro da explosão, tudo foi literalmente pulverizado. Hoje, no parque da Paz, próximo desse local, o ministro Iunichiro Koizumi participará da cerimônia, simples, que recordará esse terrível momento.

Atingir a população civil de duas cidades japonesas, sem importância estratégica militar considerável, com bombas nucleares foi um ato repudiado por cientistas em todo o planeta, inclusive Albert Einstein. O Japão estava virtualmente derrotado, sem acesso às matérias-primas necessárias para a continuidade da guerra, com suas fábricas militares destruídas por seguidos bombardeios americanos.

Obedecendo os acordos firmados com os aliados europeus, a União Soviética deveria declarar guerra ao Japão 3 meses após o fim da guerra na Europa, que aconteceu em 9 de maio de 1945. Esperava-se a entrada da URSS na guerra do Pacífico no fim da primeira semana de agosto. Dois dias depois do lançamento da bomba em Hiroshima, os soviéticos declaram guerra ao Japão, cumprindo estritamente o acordo de Ialta.

Sem saída

O rápido avanço das tropas do Exército Vermelho liberta do domínio japonês grandes áreas da China. Diante de pelo menos 1 milhão de soldados soviéticos, os japoneses se dão conta da impossibilidade de continuar a luta na Manchúria. Ao intervir na reunião urgente do Conselho Supremo do Comando da Guerra, o primeiro-ministro japonês Suzuki declarou, em 9 de agosto: “O fato de que, na manhã de ontem, a União Soviética tenha declarado a guerra contra o Japão, nos coloca definitivamente em uma situação sem saída e nos torna impossível continuar a guerra”. A explosão de duas bombas atômicas foi minimizada pelo Alto Comando japonês, que não revelou ao país o que acontecera nas duas cidades e pretendia continuar a guerra, preparando a resistência contra a invasão, mas a abertura de uma segunda frente foi o aspecto mais significativo para a rendição.

Também são bem conhecidas as palavras do comandante-em-chefe do Japão ? o imperador Hiroíto ? que, na sua mensagem “Aos Soldados e Marinheiros”, dizia: “Agora, que a União Soviética entrou na guerra contra nosso país, seguir opondo resistência significaria colocar em perigo as bases da existência do nosso povo e do nosso império”.

Civis como alvos

É óbvio que os bombardeios atômicos a cidades japonesas não visaram nenhum objetivo militar importante. O general MacArthur, que durante a Guerra tinha em seu comando as tropas aliadas do Pacífico, reconheceria em 1960: “Não havia nenhuma necessidade militar de empregar a bomba atômica em 1945”. Com a intenção de encobrir os objetivos autênticos do bombardeio atômico, Truman afirmou no dia 9 de agosto de 1945 que o golpe nuclear foi desferido “contra a base militar de Hiroshima” (sic) com a finalidade de “evitar vítimas entre a população civil”.

Admitir que as bombas serviram somente como advertência contra os soviéticos é desejar apagar da memória coletiva da humanidade esses trágicos acontecimentos. Com o passar do tempo, diminui-se o número daqueles que vivenciaram os bombardeios das duas cidades. Ainda que em suas mentes esse trauma segue vivo, grande parte da população mundial não conhece suas histórias. A mensagem dos sobreviventes foi simples, clara e concisa: “Nunca mais”.

Os EUA descrevem o bombardeio como um triunfo da tecnologia e uma vitória na guerra. Entre os que se opunham ao uso de bombas atômicas estava o general Dwight Eisenhower, que ao saber do que aconteceu a Hiroshima, por meio do secretário de Guerra Henry Stimson, reagiu dizendo que “durante seu relato dos fatos, expressei meu mais profundo repúdio, pois o Japão já havia sido derrotado e soltar as bombas foi completamente desnecessário”.

Barbárie

Em uma entrevista após a guerra, Eisenhower disse a um jornalista: “Os japoneses estavam prontos para render-se e não era necessário atacá-los com essa coisa horrível”. O general Henry Arnold considerou que “com bomba atômica ou sem ela, os japoneses estavam à beira do colapso”. O almirante William D. Leahy comparou esse ato com o comportamento dos chamados “bárbaros” da Idade Média.

Os bombardeios de Hiroshima e Nagasaki entraram para a história como um horroroso ataque terrorista, pelo menos 50 vezes mais letal que o cometido contra Nova York em 11 de setembro de 2001. Visitar o Museu da Paz de Hiroshima ou o de Nagasaki fez com que muitas pessoas acabassem confirmando o que pensavam sobre as conseqüências e riscos do uso de armas nucleares. Uma visita a algum destes museus deveria ser obrigatória a todos os líderes de nações, antes de assumirem seus cargos. Entretanto, nenhum chefe de Estado ou de governo de países possuidores de arsenal atômico visitou esses museus. Antes ou depois do mandatos.